(RV) O Papa Francisco concedeu uma entrevista
sobre sua viagem apostólica à Suécia, que se realizará de 31 deste mês a
1° de novembro, ao sacerdote jesuíta Pe. Ulf Jonsson, diretor da
revista jesuíta sueca “Signum”, junto com o diretor da revista jesuíta
italiana “La Civiltà Cattolica”, Pe. Antonio Spadaro.
"Não se pode ser católico e sectários" disse o Pontífice na
entrevista concedida na véspera da visita à Suécia para a comemoração
ecumênica dos 500 anos da Reforma Luterana.
“Na entrevista o Papa falou, entre vários assuntos, sobre sua amizade
com os luteranos desde quando era garoto e depois nos tempos de seu
ministério episcopal. Além de explicar as modalidades da visita e seu
significado, Francisco falou sobre o desafio espiritual para as Igrejas
“envelhecidas” e sobre a importância da inquietude na sociedade marcada
pelo bem-estar. A propósito do diálogo ecumênico sublinhou a importância
de “caminhar juntos” para não permanecer fechados em perspectivas
rígidas, porque nelas não há possibilidade de reforma.
Introdução do Pe. Jonsson
“Durante um encontro dos diretores das revistas culturais europeias
da Companhia de Jesus, na metade de junho, manifestei ao Pe. Antonio
Spadaro, diretor de La Civiltà Cattolica, um desejo que eu tinha no
coração há muito tempo: entrevistar o Papa Francisco na véspera de sua
viagem apostólica à Suécia, 31 de outubro de 2016, para participar da
comemoração ecumênica dos 500 anos da Reforma Luterana. Pensei que uma
entrevista fosse a melhor maneira de preparar o país para a mensagem que
o Pontífice teria endereçado às pessoas durante sua visita. Como
diretor da revista cultural dos jesuítas suecos Signum, pensei que este
objetivo entrasse plenamente em nossa missão.
O ecumenismo, assim como o diálogo entre as religiões e também com os
não fiéis, está muito no coração do Papa. Ele fez entender isso de
muitas maneiras. Ele é um homem de reconciliação. Francisco está
profundamente convencido de que os homens devem superar barreiras e
cercas de qualquer tipo. Acredita no que define “cultura do encontro”.
Isso para que todos possam colaborar para o bem comum da humanidade.
Queria que esta visão de Francisco pudesse tocar a mente e o coração de
muitos antes de sua chegada à Suécia: a entrevista teria sido o meio
melhor para alcançar tal objetivo. Disse isso ao Pe. Spadaro com o qual
prossegui a reflexão até agosto, quando juntos chegamos à conclusão de
que era realmente oportuno apresentar ao Pontífice este pedido a fim de
que pudesse decidir se realizá-la ou não. O Papa tomou tempo pra
refletir sua oportunidade. No final, a resposta foi positiva e nos deum
um encontro na Santa Marta na tarde do sábado, 24 de setembro passado.
Foi um dia realmente agradável por causa da temperatura e
luminosidade do céu. Atravessando o trânsito de Roma de carro com Pe.
Spadaro, estava ansioso, mas feliz. Chegamos a Santa Marta 15 minutos
antes do previsto. Pensei que devíamos esperar e ao invés fomos logo
convidados a subir ao andar onde o Papa tem o seus aposentos. Quando o
elevador se abriu, vi um guarda-suíço que nos saudou com cortesia. Ouvi a
voz do Papa falar cordialmente com outras pessoas em espanhol, mas não o
vi. A um certo ponto ele apareceu com duas pessoas, conversando
amigavelmente. Nos saudou com um sorriso indicando-nos de entrar em seus
aposentos: ele voltaria logo.
Fiquei surpreso com esta simples e calorosa familiaridade o
acolhimento. Foi-nos dito na portaria que o Papa teve um dia intenso, e
eu pensei que estivesse cansado no final do dia. Ao invés disso, fiquei
surpreso em vê-lo tão cheio de energia e relaxado.
O Papa entrou na sala e nos convidou a sentar onde preferíamos.
Sentei-me numa poltrona e Pe. Spadaro diante de mim. O Papa se sentou no
sofá no meio das duas poltronas. Apresentei-me no meu italiano pobre,
mas suficiente para entender e dialogar com simplicidade. Depois de
algumas brincadeiras do Papa acendemos os gravadores e iniciamos a
conversa.
Pe. Spadaro traduziu do inglês algumas perguntas que eu queria fazer
ao Papa e que eu tinha preparado, mas depois da conversa entre nós três
fluiu naturalmente, numa atmosfera amigável e sem distâncias
artificiais. Sobretudo porque foi claro e direto, sem rodeios e sem que a
atmosfera típica dos encontros com os grandes líderes ou pessoas a
respeito. Não tenho nenhuma dúvida de que o Papa Francisco ama
conversar, comunicar com os outros. Às vezes toma tempo para refletir
antes de responder, e suas respostas sempre transmitem uma sensação de
envolvimento sério, mas não pesada ou triste. Na verdade, durante a
nossa visita, ele deu várias vezes sinais de seu humorismo.
Entrevista
Santo Padre, em 31 de outubro o senhor visitará Lund e Malmö para
participar da Comemoração Ecumênica dos 500 anos da Reforma, organizada
pela Federação Luterana Mundial e pelo Pontifício Conselho para a
Promoção da Unidade dos Cristãos. Quais são as suas esperanças e suas
expectativas para este evento histórico?
“Digo somente uma palavra: aproximar-se. A minha esperança e
expectativa são as de me aproximar mais de meus irmãos e irmãs. A
proximidade faz bem a todos. A distância ao invés nos faz adoecer.
Quando nos distanciamos, nos fechamos dentro de nós mesmos e nos
tornamos nômades, incapazes de nos encontrar. Nos deixamos levar pelo
medo. É preciso aprender a se transcender para encontrar os outros. Se
não o fazemos nós cristãos nos adoecemos de divisão. A minha expectativa
é a de conseguir fazer um passo de proximidade, de estar próximo aos
meus irmãos e irmãs que vivem na Suécia.”
A sua visita à Suécia tocará um dos países mais secularizados no
mundo. Boa parte de sua população não acredita em Deus, e a religião tem
um papel um pouco modesto na vida pública e na sociedade. Segundo o
Senhor, o que perde uma pessoa que não acredita em Deus?
“Não se trata de perder alguma coisa. Trata-se de não desenvolver
adequadamente uma capacidade de transcendência. O caminho da
transcendência dá lugar a Deus, e nisto são importantes também os
pequenos passos, até mesmo o do ateu a ser agnóstico. O problema para
mim é quando se fecha e se considera a própria vida perfeita em si
mesma, portanto, fechada em si mesma, sem necessidade de uma
transcendência radical. Mas para abrir aos outros a transcendência não é
necessário fazer muitos discursos e palavras. Quem vive a
transcendência é visível: é um testemunho vivo. No almoço que tive em
Cracóvia com alguns jovens, um deles me perguntou: “O que deve dizer a
um mio amigo que não acredita em Deus? Como faço para convertê-lo? Eu
lhe respondi: “A última coisa que deve fazer é dizer alguma coisa. Aja!
Vivi! Depois, vendo a sua vida, o seu testemunho, talvez o outro irá
perguntar porque você vive assim. Estou convencido de que quem não crer
ou não procura Deus talvez não sentiu a inquietude de um testemunho.
Isso está muito ligado ao bem-estar. A inquietude se encontra
dificilmente no bem-estar. Por isso, acredito que contra o ateísmo, ou
seja, contra o fechamento à transcendência, valem realmente, somente a
oração e o testemunho.”
Os católicos na Suécia são uma pequena minoria, e na maior parte
composta por imigrantes de várias nações do mundo. O senhor se
encontrará com alguns deles celebrando a Missa em Malmö em 1° de
Novembro. Como vê o papel dos católicos numa cultura como a sueca?
“Vejo uma convivência saudável, onde cada um pode viver sua fé e
expressar o seu testemunho, vivendo num espírito aberto e ecumênico. Não
se pode ser católicos e sectários. Devemos nos esforçar para estar com
os outros. "Católico" e "sectário" são duas palavras que se contradizem.
É por isso que no início eu não previa celebrar uma missa para os
católicos nesta viagem: Eu queria insistir num testemunho ecumênico.
Depois eu refleti bem sobre o meu papel de pastor de um rebanho católico
que chegará também dos países vizinhos, como a Noruega e a Dinamarca.
Então, respondendo ao pedido fervoroso da comunidade católica, decidi
celebrar uma missa, aumentando a viagem de um dia. Na verdade eu queria
que a missa não fosse celebrada no mesmo dia e não no mesmo lugar do
encontro ecumênico para evitar confundir os planos. O encontro ecumênico
deve ser preservado em seu profundo significado, segundo um espírito de
unidade, que é o meu. Isto criou problemas de organização, eu sei,
porque eu vou estarei na Suécia também no Dia de Todos os Santos, que
aqui em Roma é importante. Mas, a fim de evitar mal-entendidos, eu quis
que fosse assim.”
(MJ)
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