29 fevereiro, 2020

O Papa: as pessoas com doenças raras devem ter as mesmas oportunidades

 
Dia Mundial das Doenças Raras 
 
No dia em que se celebra o Dia Mundial das Doenças Raras, o Papa Francisco exorta ao cuidado das pessoas que sofrem por causa destas doenças. Na ocasião, uma mensagem do Cardeal Peter Turkson.
 
Amedeo Lomonaco, Silvonei José - Cidade do Vaticano
 
"O #DiaMunidaldasDoençasRaras oferece-nos a oportunidade de cuidarmos, todos juntos, dos nossos irmãos e irmãs que afetados, integrando pesquisa, cuidados médicos e assistência social, para que tenham igualdade de oportunidades e possam ter uma vida plena”. Foi o que o Papa Francisco escreveu num tuíter por ocasião do Dia de hoje, centralizado este ano no tema da equidade, do acesso à igualdade de oportunidades para valorizar o potencial dos pacientes. Há mais de 300 milhões de pessoas no mundo com uma doença rara. Este é um "número considerável - escreve o cardeal Peter Kodwo Appiah Turkson numa mensagem -, que não pode ser ignorado e merece atenção". 

Entre estigma e solidão

"As doenças raras – lê-se na mensagem do prefeito do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral - são frequentemente difíceis de diagnosticar e, na maioria das vezes, os doentes afetados por estas patologias e as suas famílias vivem no estigma, na solidão e com um sentimento de impotência, muitas vezes exasperado pelas dificuldades de ter um tratamento específico para a doença rara e uma assistência adequada. Infelizmente, esta situação é ainda mais grave em todos aqueles países onde o sistema de saúde é mais vulnerável". 

O papel da pesquisa

Nas doenças raras, salienta o cardeal Turkson, a pesquisa científica desempenha um papel substancial, que "precisa da participação dos doentes para obter resultados significativos orientados para as suas necessidades". "O conhecimento científico e a pesquisa das indústrias farmacêuticas, mesmo que adiram às suas próprias leis, tais como a proteção da propriedade intelectual e um lucro justo como apoio à inovação, devem encontrar adequadas composições com direito ao diagnóstico e ao acesso a terapias essenciais, especialmente no caso de doenças raras". 

Diagnóstico, cuidado e amor

Os princípios de subsidiariedade e de solidariedade devem inspirar a comunidade internacional, bem como as políticas de saúde "para garantir a todos, em particular às populações mais vulneráveis, sistemas de saúde eficientes, acesso equitativo ao diagnóstico e ao tratamento e o apoio e a assistência específica para os doentes e as suas famílias". "É importante - conclui o cardeal - estudar atividades, em sinergia com os vários atores da área, que possam valorizar o potencial dos doentes raros, porque às vezes o doente pode sentir falta de humanidade". O cardeal Turkson recorda em particular o que o Papa Francisco escreveu na sua mensagem para o Dia Mundial do Doente 2020: "Na doença a pessoa sente comprometida não só a sua integridade física, mas também as dimensões relacionais, intelectual, afetiva e espiritual; e por isso, além da terapia, espera apoio, solicitude, atenção... em suma, amor".

VN

Também hoje o Papa adia algumas audiências, mas prosseguem os encontros na Casa de Santa Marta


 Missa em Santa Marta  (@Vatican Media)

O diretor da Sala de Imprensa vaticana: desde quinta-feira que o Papa prefere permanecer nos ambientes da Domus Sanctae Marthae, devido a uma ligeira indisposição. 

Vatican News 

"Esta manhã, o Santo Padre, depois de celebrar a Missa, prosseguiu na Casa Santa Marta, com os encontros na agenda, com exceção das audiências aos membros do Grupo Internacional de Bioética e aos participantes do Capítulo Geral dos Legionários de Cristo e das Assembleias Gerais das Consagradas e dos Leigos de Regnum Christi". Foi o que disse o diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Matteo Bruni, em resposta às perguntas dos jornalistas. Há dois dias atrás, Bruni informou que o Papa tinha uma "ligeira indisposição" e preferia "permanecer nos ambientes de Santa Marta".

Também ontem o Papa celebrou a Missa e preferiu adiar as audiências oficiais marcadas para o dia, como a com os participantes da plenária da Pontifícia Academia para a Vida: o seu discurso foi lido por dom Vincenzo Paglia, presidente da Academia. Os encontros na Casa de Santa Marta, realizaram-se regularmente. Na última quinta-feira, o Papa não participou na Liturgia Penitencial na Basílica de São João de Latrão com o clero da diocese de Roma, deixando que o seu discurso fosse lido pelo cardeal vigário Angelo De Donatis.

VN

28 fevereiro, 2020

Centenário da morte de Danta Jacinta marto: «Do lado de Deus para que ninguém se perca»



O Cardeal-Patriarca de Lisboa apresentou a vida de Santa Jacinta como modelo de santidade para os cristãos. Nas celebrações que assinalaram o centenário da morte da pastorinha de Fátima, e que passaram por locais significativos dos últimos momentos da sua vida em Lisboa, D. Manuel Clemente desafiou todos, em especial as crianças, a terem “o coração de Jacinta” para que “o Céu na terra” não tenha que esperar tanto
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O Hospital Dona Estefânia – o local onde Jacinta Marto “partiu para o Céu” –, foi o lugar central das celebrações que assinalaram, em Lisboa, no passado dia 20 de fevereiro, os 100 anos da morte da pastorinha de Fátima. No dia em que a Igreja assinalou a festa litúrgica dos Santos Francisco e Jacinta Marto, largas centenas de pessoas, de todas as idades e proveniências, marcaram presença na capela do hospital lisboeta para a Missa presidida pelo Cardeal-Patriarca de Lisboa, tendo sido desafiadas a “corresponder a Deus”, tal como fizeram Jacinta, Francisco e Lúcia. “Eram crianças como as outras crianças. Mas, depois, houve um dia em que este chamamento de Deus brilhou como uma luz que eles nunca tinham visto e foram tocados pela santidade de Deus. A seguir, foram atingidos pelo seu contrário, que foi a visão do inferno – de que eles falavam – e que é, exatamente, o contrário disto tudo. Deslumbrados pela santidade de Deus, obtiveram um vislumbre negativo do que pode ser o seu contrário. E, nessa altura, Jacinta e o seu irmão Francisco ficaram completamente do lado de Deus e daquela Senhora que lhes trazia a santidade de Deus”, referiu D. Manuel Clemente, na homilia. “Atingidos, não só, por aquele horror que a vida pode não ser, como, sobretudo, tocados pela vontade de que ninguém se perdesse, nos poucos, mas intensos, anos de vida”, os pastorinhos de Fátima optaram por estar “do lado de Deus, do lado de Jesus, para que ninguém se perca”. Esta “entrega” não acabou em 1920, mas “continua em 2020”, porque “a santidade de Deus não tem tempo, enche o tempo todo e ultrapassa-o ainda mais”, lembrou o Cardeal-Patriarca, na capela do hospital onde Jacinta Marto esteve nos últimos dias da sua vida.

Atender à vida infantil

O exemplo de santidade desta pastorinha de Fátima continua a chamar inúmeras pessoas que, através do seu trabalho, das suas vidas, são desafiados para estarem “do lado de Deus”, tal como acontece com todos os trabalhadores daquele hospital, “uma casa que atende tão particularmente à vida e, em particular, à vida infantil”. “Através dos cuidados que, no dia a dia, aqui são prestados, é Deus a chamar à vida através das mãos, da profissão e da devoção de tanta gente que aqui se entrega. É assim que Deus chama e a santidade acontece”, observou D. Manuel Clemente. “Quem, no dia-a-dia, se entrega aos cuidados dos nossos irmãos mais pequeninos e também das suas famílias e de todos aqueles que aqui colaboram, está do lado de Deus, está do lado da vida, está do lado da santidade de Deus. Está como Jacinta esteve: para que ninguém se perca, para que a vida aconteça”, prosseguiu o Cardeal-Patriarca de Lisboa, numa celebração onde estiveram vários colaboradores e membros do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Lisboa Central e do próprio Hospital Dona Estefânia.
Momentos antes da celebração, no auditório do hospital teve lugar uma conferência onde foram apresentados alguns factos sobre a presença de Jacinta Marto em Lisboa. O momento contou também com a presença do reitor de Santuário de Fátima, padre Carlos Cabecinhas, e da postuladora da causa de canonização de Francisco e Jacinta Marto, irmã Ângela Coelho. Esta iniciativa, em Lisboa, inseriu-se no programa mais alargado, preparado pelo Santuário de Fátima e que teve início no dia 16 de fevereiro. 

Lugar que inspira

Ao longo dos últimos anos, o local onde Jacinta Marto partiu para o Céu continua a ser procurado por milhares de “portugueses, estrangeiros, em família, individualmente, e até, em grupos organizados”, conta, ao Jornal VOZ DA VERDADE, o capelão, padre Carlos Azevedo. “Este é o lugar, por excelência, ao culto a Santa Jacinta. Há muitos, muitos anos que este espaço é procurado por peregrinos do mundo inteiro”, aponta este sacerdote, referindo que “todas as horas, todos os momentos e todas as informações disponíveis daquilo que foi a vida da Santa Jacinta neste hospital continua a inspirar muitas pessoas e muitos profissionais”. Por isso, “termos, hoje, valorizado o espaço que assinala a sua presença é um dom muito grande”. “É uma mensagem que procura transmitir sentido para a vida”, sublinha o padre Carlos, garantindo que “é a própria Jacinta que conduz todo este processo”. “Aquilo que a Jacinta aqui viveu é muito interpelante para aqueles que aqui procuram encontrar a sua saúde e sentido para o seu sofrimento”, garante.

  • Leia a entrevista reportagem na edição do dia 1 de março do Jornal VOZ DA VERDADE, disponível nas paróquias ou em sua casa.

Patriarcado de Lisboa

O Papa: um sacerdote não se isola, mas vive em comunhão com o seu povo

 
Liturgia penitencial com o clero romano na Basílica de S. João Latrão, nesta quinta feirara
 
Existem várias amarguras que marcam a vida de um sacerdote, cuja vocação é ser um homem de reconciliação. Este é um dos pensamentos do Papa contidos no discurso lido, esta manhã, pelo vigário do Papa para a Diocese de Roma, cardeal Angelo De Donatis, na liturgia penitencial com o clero romano, na Basílica de São João de Latrão. Francisco não participou no encontro tradicional por causa de uma “leve indisposição”.
 
Debora Donnini – Cidade do Vaticano

Pessoas de esperança, reconciliadas que reconhecem as suas amarguras e foram transformadas. É a exortação que o Papa Francisco dirige ao clero da Diocese de Roma, no discurso lido, na manhã desta quinta-feira (27/02), pelo cardeal vigário, Angelo De Donatis, na Basílica de São João de Latrão, durante a tradicional liturgia penitencial no início da Quaresma, na qual Francisco não participou por causa de uma “leve indisposição”, conforme a nota divulgada pela Sala de Imprensa da Santa Sé. Toda a reflexão fala sobre a amargura que pode infiltrar-se na vida de um sacerdote como um “inimigo subtil” que encontra uma maneira de se camuflar de parasita. Trata-se de amargura na relação de fé, com o bispo e entre confrades. 

Não omnipotentes, mas pecadores perdoados

O Papa enfatiza que o seu pensamento é fruto, por um lado, por ouvir alguns seminaristas e sacerdotes italianos, mas sem referência a nenhuma situação específica, enquanto que, por outro, observa que a maioria dos sacerdotes ainda está feliz com a sua vida e considera essas amarguras como normais. Portanto, encará-las, ajuda a entrar em contacto com a nossa humanidade e, afirma Francisco, “lembra-nos que, como sacerdotes, não somos chamados a sermnipotentes, mas homens pecadores perdoados”. 

“A espiritualidade do protesto”

Na raiz da amargura no relacionamento de fé, vemos uma esperança desiludida. Uma esperança provavelmente trocada por uma expectativa. “De facto, a esperança cristã não decepciona”, sublinha o Papa, porque “esperar não é convencer-se de que as coisas vão melhorar, mas que tudo o que acontece tem significado à luz da Páscoa”. Para alimentá-la, no entanto, é necessária uma intensa vida de oração, colocando-se “à luz da Palavra de Deus”. “O verdadeiro protesto”, explica ele, não é “contra Deus, mas diante dele”, nasce da confiança. 

Esperança cristã, não expectativa

Para entrar profundamente no sentido da esperança é preciso entender a diferença da expectativa que nasce quando”, observa Francisco, “lutamos”, buscando certezas, quando o ponto de referência somos nós mesmos. Em vez disso, a esperança brota quando se decide não se defender mais e, como o teatino Lorenzo Scupoli disse em sua ‘Luta espiritual’, é preciso “desconfiar-se de si e confiar em Deus”. Baseia-se numa aliança: que a vida plena prometida por Deus no dia da ordenação se realiza “se vivo a Páscoa e não se as coisas acontecem como eu digo”. 

Problemas com o bispo

“Sem cair no lugar comum que dá a culpa de tudo aos superiores, pois na realidade somos falhos, permanece o facto”, escreve o Papa, de que “muita amargura na vida do sacerdote acontece por causa das omissões dos pastores”. Não se trata de divergências inevitáveis sobre problemas administrativos ou estilos pastorais, mas de dois aspetos “desestabilizadores para os padres”. Primeiramente, o que Francisco chama de “uma certa origem autoritária suave”, quando, por uma “distinção”, a pessoa é inscrita entre os que remam contra. O segundo, é a adesão a iniciativas que corre o risco de se tornar “a medida da comunhão”, enquanto o “culto das iniciativas” vai substituindo pelo essencial. 

A competência suplantada por suposta lealdade

Para traçar a direção certa, o Papa Francisco refere-se a São Bento. Na Regra, ele recomenda que o abade consulte toda a comunidade quando tiver que enfrentar uma questão importante, mas também que a decisão final depende dele, com prudência e equidade.

A grande tentação do pastor é circundar-se dos “seus”, dos “vizinhos”; e, assim, infelizmente, a competência real é suplantada por uma certa lealdade presumida, sem distinguir entre quem agrada e quem aconselha desinteressadamente. Isto faz com que o rebanho sofra muito, aceitando frequentemente sem exteriorizar nada.

No entanto, os fiéis têm o direito, e algumas vezes o dever, de expressar os seus pensamentos sobre o bem da Igreja aos Pastores, conforme exigido pelo Código de Direito Canónico. Certamente, neste tempo de precariedade, a solução parece ser o autoritarismo, “na esfera política isto é evidente”, mas o verdadeiro zelo está na equidade, não na uniformidade, recorda o Papa. 

Amargura entre os sacerdotes

Uma terceira causa de amargura nos sacerdotes pode vir dos problemas “entre nós”, ressalta Francisco. O presbítero nos últimos tempos sofreu “os golpes de escândalos, financeiros e sexuais” e a suspeita tornou as relações mais frias e formais:

Diante de escândalos, o maligno nos tenta, impelindo-nos a uma visão “donatista” da Igreja: dentro dos impecáveis, fora os que erram! Temos falsas concepções da Igreja militante, numa espécie de puritanismo eclesiológico. A Noiva de Cristo é e continua a ser o campo em que o trigo e o joio crescem até à parusia. Quem não se apropriou desta visão evangélica da realidade, expõe-se à amarguras indizíveis e inúteis. No entanto, os pecados públicos e divulgados do clero tornaram todos mais cautelosos e menos dispostos a criar laços significativos, sobretudo em relação à  partilha da fé. 

O povo de Deus espera pessoas que reconciliam

Na conclusão, Francisco ressalta que o povo de Deus “os conhece melhor que ninguém”:
É muito respeitoso, sabe acompanhar e cuidar dos seus pastores. Conhece as nossas amarguras e pede ao Senhor por nós. Unamos as nossas orações às suas e peçamos ao Senhor para que transforme as nossas amarguras em água fresca para o seu povo. Peçamos ao Senhor para que nos dê a capacidade de reconhecer o que nos está a margurar e nos deixar-se transformar, sermos pessoas reconciliadas que reconciliam, pacíficas que pacificam, cheias de esperança que infundem esperança. O povo de Deus espera de nós, mestres de espírito, capazes de indicar os poços de água fresca no meio do deserto.

VN

27 fevereiro, 2020

DIAS DE PENITÊNCIA






Chegaram os dias de penitência!
Este é um tempo que me toca profundamente.
Longe de ficar triste ou acabrunhado, antes pelo contrário, alegro-me no amor de Deus que por todos e por mim se dá inteiramente.

Renasce em mim a vontade de me corrigir, de me entender, de me sentir amado por Deus, de querer ser santo em cada coisa que faço ou penso no meu dia-a-dia.
Penso que para um cristão as tais promessas que se costumam fazer em cada Ano Novo, deviam ser deixadas para a Quaresma, e serem promessas de mudança individuais, certamente, mas as quais terão que ter forçosamente uma dimensão comunitária, isto é, levar-nos aos outros para dar testemunho de Cristo com as nossas vidas.

Arrependei-vos e acreditai no Evangelho!
Deixai os lamentos, os queixumes, os protestos, as amarguras, os ressentimentos e rancores, e acreditai na Boa Nova, acreditai no Deus de amor que se entrega por nós e assim nos enche da confiança, da esperança, que brota do seu amor.
Que a minha penitência seja não me queixar, não permitir o desânimo, não me fechar em mim próprio e nos meus problemas, mas antes abrir-me aos outros e viver com eles as suas dificuldades sejam elas quais forem.

E rezar!
Rezar muito falando com Deus, olhos nos olhos, dizendo-Lhe de mim tudo o que Ele afinal já sabe, e depois fazer silêncio, muito silêncio para O poder escutar no coração.

Dizer-Lhe todos os dias: Aqui estou, Senhor, seja feita a tua vontade!

Chegaram os dias da penitência!
Arrependamo-nos e acreditemos no Evangelho!


Marinha Grande, 27 de Fevereiro de 2020
Joaquim Mexia Alves

26 fevereiro, 2020

«Uma Quaresma para a consciência»



Mensagem Quaresmal em Quarta-Feira de Cinzas
 
Caríssimos diocesanos

Interpelam-nos sempre as palavras de Jesus em Quarta-Feira de Cinzas: «Quando deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a direita, para que a tua esmola fique em segredo; e teu Pai, que vê o que está oculto, te dará a recompensa». E o mesmo no respeitante à oração e ao jejum… 

Gratuidade total da nossa parte, sem ponta de exibição ou orgulho, mesmo fazendo o bem. Conhecimento total, da parte de Deus, que nos conhece melhor do que nós próprios. Coincidirmos neste ponto, nós e Deus, é a conversão perfeita que cada Quaresma nos pede e só a graça divina proporciona. Aproveitemo-la de vez.

Coincidiremos afinal com Jesus, rejeitando as tentações do ter, do parecer e do poder, que são a substância negativa de todo o pecado, capital ou venial que seja. Realizaremos, pelo Espírito que expandiu na cruz, a filiação divina que é salvação completa: filhos de Deus e por isso irmãos. Só assim pode e deve ser, como realmente acontece em quem se converte, da Quaresma à Páscoa de cada um com Cristo.  


Na mensagem que nos dirige para esta Quaresma, o Papa Francisco diz-nos também que é a partir da Páscoa de Cristo, quando nos refazemos nela, que o diálogo com Deus se torna perfeito e criativo. A partir de Deus, acolheremos a vida como dom divino e não algo primeiramente nosso. É muito feliz e oportuno este seu trecho: «A alegria do cristão brota da escuta e receção da Boa Nova da morte e ressurreição de Jesus: o kerygma. Este resume o Mistério dum amor tão real, tão verdadeiro, tão concreto, que nos proporciona uma relação plena de diálogo sincero e fecundo. Quem crê neste anúncio rejeita a mentira de que a nossa vida teria origem em nós mesmos, quando na realidade nasce do amor de Deus Pai, da sua vontade de dar vida em abundância» (Mensagem do Santo Padre para a Quaresma de 2020, «Em nome de Cristo suplicamo-vos: reconciliai-vos com Deus» (2 Cor 5, 20).

Aqui se insere também a oração cristã, que, sendo filial, só poderá ser a que Cristo nos ensinou – mesmo que demore muito a aprender, mais no espírito do que na letra. Assim prossegue o Papa: «A oração poderá assumir formas diferentes, mas o que conta verdadeiramente aos olhos de Deus é que ela penetre profundamente em nós, chegando a romper a dureza do nosso coração, para o converter cada vez mais a Ele e à sua vontade».

Estas interpelações evangélicas e papais contrariam muito algumas opiniões correntes, quase a “cultura” que respiramos hoje – bem pouco “cultivada”, aliás. É fácil termos tudo como nosso, na posse ou no desejo, os outros como alheios e as coisas como consumos. Assim sendo, tudo se torna relativo a cada um, conforme esteja ou queira estar – e enquanto quiser estar. Enfraquece em nós a essência da vida, quando se rarefaz a convivência.


A passagem evangélica diz-nos que Deus «vê o que está oculto», ou seja, a quantidade e qualidade do real e do seu porquê. Este conhecimento integrado e completo é a etimologia duma palavra que usamos muitas vezes, mas nem sempre consequentemente e sobre várias questões. É a palavra “consciência”, provinda do latim cum-scire, que significa saber com, saber juntamente.

Em Deus a consciência é perfeita, pois tudo vê e conjuga, patente ou oculto. Por ser perfeito conhecimento e absoluta misericórdia, a consciência divina conhece-nos a todos, com um olhar que reanima e salva, como o manifestou em Cristo. Em Cristo, que bem conhecia o coração humano e tudo julgava a partir do Pai.

A consciência, religiosamente considerada, leva-nos a ver os outros como Deus os vê e a cuidar deles como Deus cuida de nós, em tantas mãos que aceitam prolongar as que nos estendeu em Cristo. Mãos que amparam a fragilidade dos outros e os envolvem em todas as fases da vida, sobretudo quando mais fragilizada. É este envolvimento cuidadoso que a palavra “paliativo” significa.

 Mesmo falando em termos positivos e aceitáveis por crentes e não crentes, trata-se de exercitar uma humanidade mais consciente e conjugada, para que todos vivam e ninguém desista de viver. Assim atingiremos a consciência plena, correspondendo à totalidade do real.  


Neste sentido, a Quaresma é tempo de exame de consciência, agradecendo o que Deus nos ensina e efetivando o que nos cumpre. Não a partir do que o sentimento prefira só por si, mas do que a realidade humana nos peça - e sempre convivida, como lhe é necessário e próprio. Porque a consciência, quando se apura, nada e ninguém ignora ou exclui. Bem pelo contrário, motiva-se a bem agir e ativa-se como responsabilidade e dever. Quando ficamos por sensações e reações imediatas e as sobrepomos ao que a consciência requer, damos razão à inveterada sentença: «Quem não vive como pensa, acaba por pensar como vive…»

Tudo se torna afinal uma “questão de consciência”, a qual, pela atenção à totalidade do real é precisamente o contrário das chamadas “questões fraturantes”, que tomam a parte pelo todo e contra o todo, reduzindo-o à disposição individual e ignorando as consequências negativas de tal atitude. 

A Quaresma que iniciamos alarga-nos à maneira divina de ver, julgar e agir, como em Cristo se revelou. À sua luz, formaremos plenamente a consciência, nunca perdendo de vista a finalidade das coisas, quando atendemos a cada uma em particular. 

Assim ganharemos a liberdade de consciência, pois a verdade liberta. Assim faremos a objeção de consciência, sempre que for o caso. Também assim começámos há dois mil anos. E não estivemos sós, mas acompanhados pelo melhor da consciência humana, como despontava já e continua agora, para que o progresso possa realmente acontecer.   
  
Assim caminharemos na Páscoa de Cristo - que a própria morte incluiu, para a transformar em vida - e até à realidade mais profunda e oculta que só o olhar divino atinge. Por isso São Paulo descobriu e proclamou, com plena e jubilosa consciência, que «a realidade está em Cristo» (Col 2, 17). Ganhemo-la nós também, tal consciência, neste tempo tão propício de graça e conversão!

Sé de Lisboa, 26 de fevereiro de 2020
+ Manuel, Cardeal-Patriarca   
    
A renúncia quaresmal diocesana de 2019 juntou 236.273,45€, destinados à Cáritas da Venezuela. A deste ano destina-se à Diocese de Palai (Índia), para financiar um hospital que atenderá especialmente a população mais pobre.

Patriarcado de Lisboa

Luta contra os abusos: chegam as forças-tarefa para apoiar os bispos

 
O combate ao abuso de menores cometido pelo clero dá um novo passo no Vaticano  (ANSA)
 
Na próxima sexta-feira (28/02), haverá na Sala de Imprensa da Santa Sé a apresentação de um novo projeto de apoio aos bispos para combater a violência contra menores perpetrada pelo clero.
 
Cidade do Vaticano

O combate ao abuso de menores cometido pelo clero dá um novo passo no Vaticano e em toda a Igreja. Conforme anunciado pela Sala de Imprensa da Santa Sé, na próxima sexta-feira (28/02), às 11h30, haverá um encontro com os jornalistas, onde serão apresentadas as forças-tarefa que ajudarão as Conferências episcopais na preparação e atualização das diretrizes sobre a proteção de menores e as iniciativas implementadas para reforçar a prevenção e o combate aos abusos.

Participarão no evento, o mons. Juan Ignacio Arrieta Ochoa de Chinchetru, secretário do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, e pe. Federico Lombardi, presidente da Fundação Vaticana Joseph Ratzinger-Bento XVI, moderador do encontro sobre “A proteção dos menores na Igreja”.

Um ano após o encontro sobre “A proteção dos menores na Igreja”, realizado no Vaticano de 21 a 24 de fevereiro de 2019, a Sala de Imprensa da Sé fez um elenco, num comunicado, dos passos realizados desde março daquele ano, nas reuniões mensais na Secretaria de Estado que envolveram os prefeitos dos dicastérios interessados e vários especialistas. 

Projetos

Os projetos realizados até agora são a Carta Apostólica em forma de Motu Próprio sobre a Proteção dos Menores e das pessoas vulneráveis (26 de março de 2019), a Lei 297 para o Estado da Cidade do Vaticano (26 de março de 2019), as Diretrizes para o Vicariato da Cidade do Vaticano (26 de março de 2019), o Motu Próprio Vos estis lux mundi (9 maio de 2019); uma mesa jurídica para acompanhar e ajudar os dicastérios na aplicação do Motu Proprio Vos estis lux mundi, presidida pelo mons. Filippo Iannone e composta por representantes da Secretaria de Estado e das Congregações para a Doutrina da Fé, para as Igrejas Orientais, para os Bispos, para a Evangelização dos Povos, para o Clero, para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica; o Rescriptum ex Audientia SS.mi, com o qual o Papa Francisco promulgou a Instrução sobre a confidencialidade dos casos (17 de dezembro de 2019); e o Rescriptum ex Audientia SS.mi, com o qual o Santo Padre introduz algumas modificações nas “Normae de gravioribus delictis” (17 de dezembro de 2019).

Francisco, recorda a nota da Sala de Imprensa da Santa Sé, que confiou em novembro de 2018 ao substituto para Assuntos Gerais da Secretaria de Estado, dom Edgar Peña Parra, a tarefa de auxiliar a Comissão organizadora do encontro “A proteção dos menores na Igreja”, composta pelos cardeais Blaise Cupich e Oswald Gracias, por dom Charles Jude Scicluna e pelo pe. Hans Zollner, na preparação do encontro. No final da reunião, o Papa Francisco aceitou o pedido de ajuda dos bispos para enfrentar os casos de abuso cometidos por clérigos, encarregando a Secretaria de Estado de encontrar, junto com os membros da Comissão organizadora do encontro, soluções concretas.

VN

Francisco: estamos no mundo para caminhar da cinza à vida

 
 
“A Quaresma não é o tempo para fazer cair sobre o povo inúteis moralismos, mas para reconhecer que as nossas míseras cinzas são amadas por Deus”. Palavras do Papa na homilia da Quarta-feira de Cinzas 
 
Jane Nogara - Cidade do Vaticano

O Papa Francisco presidiu a missa de imposição das Cinzas nesta quarta-feira (26/02) na Basílica de Santa Sabina, no bairro Aventino, em Roma.

Antes da missa, o Pontífice guiou a procissão penitencial que iniciou na Igreja de Santo Anselmo, no Aventino, até a Basílica de Santa Sabina.

“Lembra-te que és pó da terra e à terra hás-de voltar”. Com este versículo do Gênesis, Francisco iniciou a sua homilia, sublinhando que “o pó sobre a cabeça faz-nos ter os pés assentes na terra: recorda-nos que viemos da terra e, à terra voltaremos; isto é, somos débeis, frágeis, mortais”. Mas, recorda o Pontífice, “somos o pó amado por Deus. Amorosamente o Senhor recolheu nas suas mãos o nosso pó e, nele, insuflou o seu sopro de vida”. 

Do pó à vida

“Deste modo”, continua o Papa, “a cinza recorda-nos o percurso da nossa existência: do pó à vida. Somos pó, terra, barro; mas, se nos deixarmos plasmar pelas mãos de Deus, tornamo-nos uma maravilha”, porque “nascemos para ser amados, nascemos para ser filhos de Deus”.

Por isso, pondera o Pontífice:
“A Quaresma não é o tempo para fazer cair sobre o povo inúteis moralismos, mas para reconhecer que as nossas míseras cinzas são amadas por Deus. É tempo de graça, para acolher o olhar amoroso de Deus sobre nós e, assim contemplados, mudar de vida. Estamos no mundo para caminhar da cinza à vida”
Depois de recordar que a cinza que recebemos na testa abala os pensamentos que temos na cabeça e lembra-nos que somos filhos de Deus, Francisco recorda que:
“A cinza pousa nas nossas testas, para que, nos corações, se acenda o fogo do amor. Com efeito, somos cidadãos do céu. E o amor a Deus e ao próximo é o passaporte para o céu; é o nosso passaporte”
Da vida ao pó
 
Porém, adverte, devemos estar atentos para não cairmos no segundo percurso: o percurso contrário, da vida ao pó!

“Olhamos ao redor e vemos pó de morte, vidas reduzidas a cinzas: escombros, destruição, guerra […] Continuamos a destruir-nos, a fazer-nos voltar ao pó. E quanto pó existe nas nossas relações! Vejamos na nossa casa, nas famílias […] Há tanto pó que suja o amor e embrutece a vida. Mesmo na Igreja, a casa de Deus, deixamos depositar tanto pó, o pó do mundanismo”. 

Fazer o bem sem fingimento

Neste aspeto, o Papa recorda de olhar-mos também para dentro do coração:
“Quantas vezes sufocamos o fogo de Deus com a cinza da hipocrisia! A hipocrisia: é a imundície que hoje, no Evangelho, Jesus pede para remover. De facto, o Senhor não diz apenas para fazer obras de caridade, rezar e jejuar, mas que tudo isto seja feito sem fingimento, sem falsidade nem hipocrisia”
Limpar o pó do coração
 
E como fazer para limpar o pó que se deposita no coração?
“Ajuda-nos o veemente apelo de São Paulo na segunda Leitura: ‘Deixai-vos reconciliar com Deus!’ São Paulo usa o passivo: deixai-vos reconciliar. Porque a santidade não é obra nossa; é graça. Sozinhos, não somos capazes de tirar o pó que suja o coração […] E a Quaresma é tempo de cura”
Caminhos rumo à Páscoa
 
O Santo Padre sugere caminhos rumo à Páscoa, “podemos efetuar duas passagens: a primeira, do pó à vida, da nossa humanidade frágil à humanidade de Jesus, que nos cura”, ou a segunda passagem, para não voltar a cair da vida ao pó: “vai-se receber o perdão de Deus, na Confissão, porque lá o fogo do amor de Deus consome a cinza do nosso pecado” .
Concluindo, Francisco pede: “Para amar, deixem-mo-nos amar; deixem-mo-nos erguer, para caminhar rumo à meta – à Páscoa”.

VN

Papa: Quaresma, tempo de nos desligarmos do telemóvel e conecta-mo-nos com o Evangelho




Francisco disse ainda que a Quaresma "é o tempo de renunciar a palavras inúteis, conversinhas, maledicência, mexericos e aproximar-mo-nos do Senhor. É o tempo de nos dedicarmos a uma ecologia saudável do coração, fazer-lhe uma limpeza". 

Mariangela Jaguraba - Cidade do Vaticano 

“Quaresma, entrar no deserto.” Este foi o tema da catequese do Papa Francisco na Audiência Geral desta Quarta-feira de Cinzas (26/02), na Praça São Pedro.

“Hoje, iniciamos o caminho quaresmal, caminho de quarenta dias em direção à Páscoa, rumo ao coração do ano litúrgico e da fé”, sublinhou Francisco. “É um caminho que segue o de Jesus, que no início de seu ministério retirou-se por quarenta dias para rezar e jejuar, tentado pelo diabo, no deserto.” 

O deserto é o lugar da Palavra de Deus

A seguir, o Papa deteve-se no “significado espiritual do deserto, o que significa espiritualmente o deserto para todos nós, também para nós que vivemos na cidade” e convidou os fiéis a imaginarem estar num deserto. “A primeira sensação seria a de estarem envolvidos num grande silêncio: sem barulho, a não ser o do vento e da nossa respiração”, disse ele.

O deserto é o lugar em que se toma distância do barulho que nos circunda. É ausência de palavras para dar espaço a outra Palavra, a Palavra de Deus, que acaricia o nosso coração como a brisa suave. O deserto é o lugar da Palavra, com letra maiúscula. Na Bíblia, o Senhor gosta de conversar connosco no deserto. No deserto, ele entrega a Moisés as “dez palavras", os dez mandamentos. E quando o povo se afasta Dele, tornando-se como uma noiva infiel, Deus diz: «Vou levá-la ao deserto e conquistar o seu coração. Lá me responderá, como nos dias da sua juventude». No deserto, ouve-se a Palavra de Deus, que é como um som suave. 

Quaresma, tempo se desligar do telemóvel e abrir a Bíblia

“No deserto, encontra-se a intimidade com Deus, o amor do Senhor. Jesus gostava de se retirar todos os dias para lugares desertos para rezar. Ele ensinou-nos a procurar o Pai, que nos fala no silêncio”, disse ainda Francisco, acrescentando:
“A Quaresma é o tempo propício para abrir espaço à Palavra de Deus. É o tempo para desligar a televisão e abrir a Bíblia. É o tempo para nos desligarmos do telemóvel e conectar-mo-nos com o Evangelho. É o tempo de renunciar a palavras inúteis, conversinhas, maledicência, mexericos e aproximar-mo-nos do Senhor. É o tempo de nos dedicarmos a uma ecologia saudável do coração, fazendo-lhe uma limpeza. Vivemos num ambiente poluído por muita violência verbal, por muitas palavras ofensivas e nocivas, que a rede amplifica.”
"Hoje, insulta-se como se dissesse “Bom dia”. Somos submergidos de palavras vazias, publicidades e anúncios falsos. Acostuma-mo-nos a ouvir tudo sobre todos e corremos o risco de cair num mundanismo que atrofia os nossos corações. Custa-nos distinguir a voz do Senhor que nos fala, a voz da consciência, do bem. Jesus, chamando-nos no deserto, convid-nos a prestar atenção ao que interessa, ao que é importante, ao essencial." 

O deserto é o lugar essencial

Ao diabo que o tentou, Jesus respondeu: “O homem não viverá somente de pão, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus”. “Mais que o pão, precisamos da Palavra de Deus, precisamos de falar com Deus: rezar”, disse ainda o Papa.

“O deserto é o lugar do essencial. Olhemos para as nossas vidas: quantas coisas inúteis nos circundam. Seguimos mil coisas que parecem necessárias, mas na realidade não são. Faz-nos bem libertar-mo-nos de muitas realidades supérfluas a fim de redescobrir o que interessa e reencontrar o rosto de quem está ao nosso lado.” E sobre isto, Jesus dá o exemplo, jejuando. “Jejuar é saber renunciar às coisas vãs, supérfluas, para ir ao essencial. Jejuar não é apenas para emagrecer, jejuar é ir ao essencial, é procurar a beleza de uma vida mais simples”, sublinhou Francisco. 

O deserto é o lugar da solidão

Por fim, o Papa disse que o deserto “é o lugar da solidão”. "Ainda hoje, perto de nós, existem muitos desertos, muitas pessoas sozinhas. São pessoas sós e abandonadas".
“Quantos pobres e idosos estão ao nosso lado e vivem em silêncio, sem fazer barulho, marginalizados e descartados!”
"Falar sobre eles não faz audiência. Mas o deserto leva-nos a eles, àqueles que, em silêncio, pedem a nossa ajuda. Há muitos olhares silenciosos que pedem a nossa ajuda. O caminho no deserto quaresmal é um caminho de caridade para com os vulneráveis. Oração, jejum e obras de caridade: eis o caminho no deserto quaresmal”, concluiu o Papa.

VN

25 fevereiro, 2020

Papa: na Igreja, o maior é quem serve, não quem tem mais títulos

 
 
Na missa celebrada na Casa de Santa Marta, o Papa comentou a briga dos apóstolos para saber que é o mais importante. Francisco recordou que a mundanidade é inimiga de Deus porque o Senhor exorta à humildade.
 
Debora Donnini – Cidade do Vaticano

Não se pode viver o Evangelho fazendo conchavos; ao contrário, acaba-se com o espírito do mundo, que visa o domínio dos outros e é “inimigo de Deus”.

A reflexão do Papa na homilia desta manhã na Casa de Santa Marta (25/02) partiu do trecho do Evangelho do dia (Mc 9,30-37), no qual Jesus diz aos Doze que se alguém quiser ser o primeiro, deve ser o último e servidor de todos. Jesus sabia que, ao atravessar a Galiléia, os discípulos tinham discutido entre si sobre quem seria o maior “por ambição”. Esta briga dizendo “eu tenho que caminhar à frente, eu tenho que avançar”, explicou o Papa, é o espírito do mundo. Mas também a Primeira Leitura de hoje (Tg 4, 1-10) ressalta este aspeto, quando o apóstolo Tiago recorda que o amor pelo mundo é inimigo de Deus.

Esta ânsia de mundanidade, esta ânsia de ser mais importante do que os outros e dizer: “Não! Eu mereço isto, não aquela pessoa”.isto é mundanidade, este é o espírito do mundo e quem respira este espírito, respira a inimizade de Deus. Jesus, noutro trecho, diz aos discípulos: “Ou estão comigo ou contra mim”. Não há conchavos no Evangelho. E quando alguém quer viver o Evangelho fazendo conchavos, no final encontra-se com o espírito mundano, que procura sempre pactos para galgar mais, para dominar, para ser maior. 

A inveja é um caruncho que leva à destruição
 

Tantas guerras e tantas brigas acontecem, originadas por desejos mundanos, por paixões, afirma o Papa, referindo-se ainda às palavras de São Tiago. É verdade, “hoje todo o mundo é semeado por guerras. Mas, e as guerras entre nós? Como aquela que existia entre os apóstolos: quem é o mais importante?”, questionou Francisco:

Olhem a carreira que eu fiz: agora não posso ir para trás!”. Este é o espírito do mundo e isto não é cristão. “Não! É a minha vez! Eu tenho que ganhar mais para ter mais dinheiro e mais poder”. Este é o espírito do mundo. E depois a malvadeza das intrigas: a fofoca. De onde vem? Da inveja. O maior invejoso é o diabo, a gente sabe, a Bíblia o diz. Da inveja. Por inveja do diabo o mal entra no mundo. A inveja é um caruncho que leva a destruir, a falar mal, a aniquilar o outro. 

Na Igreja, o maior é quem serve
 

No diálogo dos discípulos, existiam todas etas paixões e, por isso, Jesus os repreende e os exorta a fazerem-se servidores de todos e a tomar o último lugar:

Quem é o mais importante na Igreja? O Papa, os bispos, os monsenhores, os cardeais, os párocos das paróquias mais belas, os presidentes das associações de leigos? Não! O maior na Igreja é quem se faz servidor de todos, quem serve a todos, não quem tem mais títulos. E para explicar isto, pegou numa criança, a colocou no meio deles e, abraçando-a com ternura – porque Jesus falava assim, tinha tanta ternura – disse-lhes: “Quem acolher em meu nome uma destas crianças, é a mim que estará a acolher”, isto é, quem acolhe o mais humilde, o mais servidor. Este é o caminho. O caminho contra o espírito do mundo é um só: a humildade. Servir os outros, escolher o último lugar, não galgar.
 
Portanto, não se deve “negociar com o espírito do mundo”, não é preciso dizer: “Tenho direito àquele lugar, porque olhem a carreira que eu fiz”. A mundanidade, com efeito, “é inimigo de Deus”. Ao contrário, é preciso ouvir esta palavra “tão sábia” e encorajadora que Jesus diz no Evangelho: “Se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos!'”.

VN

24 fevereiro, 2020

QUARESMA 2020 - "Em nome de Cristo, suplicamo-vos: reconciliai-vos com Deus"


Imagem de arquivo da Quarta-feira de Cinzas de 2017

Leia o texto integral do Papa Francisco para a Quaresma de 2020.

MENSAGEM DO SANTO PADRE
para a Quaresma de 2020

«Em nome de Cristo, suplicamo-vos: reconciliai-vos com Deus» (2 Cor 5, 20)

Queridos irmãos e irmãs!

O Senhor concede, também neste ano, um tempo propício para nos prepararmos para celebrar, de coração renovado, o grande Mistério da morte e ressurreição de Jesus, perne da vida cristã pessoal e comunitária. Com a mente e o coração, devemos voltar continuamente a este Mistério. Com efeito, o mesmo não cessa de crescer em nós na medida em que nos deixarmos envolver pelo seu dinamismo espiritual e aderirmos a ele com uma resposta livre e generosa.

1.      O Mistério pascal, fundamento da conversão

A alegria do cristão brota da escuta e receção da Boa Nova da morte e ressurreição de Jesus: o kerygma. Este compendia o Mistério dum amor «tão real, tão verdadeiro, tão concreto, que nos proporciona uma relação cheia de diálogo sincero e fecundo» (Francisco, Exort. ap. Christus vivit, 117). Quem crê neste anúncio rejeita a mentira de que a nossa vida teria origem em nós mesmos, quando na realidade nasce do amor de Deus Pai, da sua vontade de dar vida em abundância (cf. Jo 10, 10). Se, pelo contrário, se presta ouvidos à voz persuasora do «pai da mentira» (Jo 8, 44), corre-se o risco de precipitar no abismo do absurdo, experimentando o inferno já aqui na terra, como infelizmente dão testemunho muitos acontecimentos dramáticos da experiência humana pessoal e coletiva.

Por isso, nesta Quaresma de 2020, quero estender a todos os cristãos o mesmo que escrevi aos jovens na Exortação apostólica Christus vivit: «Fixa os braços abertos de Cristo crucificado, deixa-te salvar sempre de novo. E quando te aproximares para confessar os teus pecados, crê firmemente na sua misericórdia que te liberta de toda a culpa. Contempla o seu sangue derramado pelo grande amor que te tem e deixa-te purificar por ele. Assim, poderás sempre, renascer de novo» (n. 123). A Páscoa de Jesus não é um acontecimento do passado: pela força do Espírito Santo é sempre atual e permite-nos contemplar e tocar com fé a carne de Cristo em tantas passoas que sofrem.

2.       Urgência da conversão

É salutar uma contemplação mais profunda do Mistério pascal, em virtude do qual nos foi concedida a misericórdia de Deus. Com efeito, a experiência da misericórdia só é possível «face a face» com o Senhor crucificado e ressuscitado, «que me amou e a Si mesmo Se entregou por mim» (Gl 2, 20). Um diálogo coração a coração, de amigo a amigo. Por isto mesmo, é tão importante a oração no tempo quaresmal. Antes de ser um dever, está expressa a necessidade de corresponder ao amor de Deus, que sempre nos precede e sustenta. De facto, o cristão reza ciente da sua indignidade de ser amado. A oração poderá assumir formas diferentes, mas o que conta verdadeiramente aos olhos de Deus é que ela escave dentro de nós,  até romper a dureza do nosso coração, para o converter cada vez mais a Ele e à sua vontade.

Por isso, neste tempo favorável, deixemo-nos conduzir como Israel ao deserto (cf. Os 2, 16), para podermos finalmente ouvir a voz do nosso Esposo, deixando-a ressoar em nós com maior profundidade e disponibilidade. Quanto mais nos deixarmos envolver pela sua Palavra, tanto mais conseguiremos experimentar a sua misericórdia gratuita por nós. Portanto não deixemos passar em vão este tempo de graça, na presunçosa ilusão de sermos nós o dono dos tempos e modos da nossa conversão a Ele.

3.      A vontade apaixonada de que Deus tem de dialogar com os seus filhos

O facto de o Senhor nos proporcionar uma vez mais um tempo favorável para a nossa conversão, jamais devemos dá-lo como garantido. Esta nova oportunidade deveria suscitar em nós um sentido de gratidão e sacudir-nos do nosso torpor. Não obstante a presença do mal, por vezes até dramática, tanto na nossa existência como na vida da Igreja e do mundo, este período que nos é oferecido para uma mudança de rumo manifesta a vontade tenaz de Deus de não interromper o diálogo de salvação connosco. Em Jesus crucificado, que Deus «fez pecado por nós» (2 Cor 5, 21), esta vontade chegou ao ponto de fazer recair sobre o seu Filho todos os nossos pecados, como se houvesse – segundo o Papa Bento XVI – um «virar-se de Deus contra Si próprio» (Enc. Deus caritas est, 12). De facto, Deus ama também os seus inimigos (cf. Mt 5, 43-48).

O diálogo que Deus quer estabelecer com cada homem, por meio do Mistério pascal do seu Filho, não é como o diálogo atribuído aos habitantes de Atenas, que «não passavam o tempo noutra coisa senão a dizer ou a escutar as últimas novidades» (At 17, 21). Este tipo de conversa, ditado por uma curiosidade vazia e superficial, caracteriza a mundanidade de todos os tempos e, hoje em dia, pode insinuar-se também num uso pervertido dos meios de comunicação.

4.       Uma riqueza que deve ser partilhada, e não acumulada só para si mesmo

Colocar o Mistério pascal no centro da vida significa sentir compaixão pelas chagas de Cristo crucificado presentes nas inúmeras vítimas inocentes das guerras, das prepotências contra a vida desde a do nascituro até à do idoso, das variadas formas de violência, dos desastres ambientais, da iníqua distribuição dos bens da terra, do tráfico de seres humanos em todas as suas formas e da sede desenfreada de lucro, que é uma forma de idolatria.

Também hoje é importante chamar os homens e mulheres de boa vontade à partilha dos seus bens com os mais necessitados através da esmola, como forma de participação pessoal na edificação de um mundo mais justo. A partilha, na caridade, torna o homem mais humano; com a acumulação, corre o risco de embrutecer, fechando-se no seu egoísmo. Podemos e devemos ir mais além, considerando as dimensões estruturais da economia. Por este motivo, na Quaresma de 2020 – mais concretamente, de 26 a 28 de março –, convoquei para Assis jovens economistas, empreendedores e transformativos, com o objetivo de contribuir para delinear uma economia mais justa e inclusiva do que a atual. Como várias vezes se referiu no magistério da Igreja, a política é uma forma eminente de caridade (cf. Pio XI, Discurso à FUCI, 18/XII/1927). E sê-lo-á igualmente ocuparem-se da economia com o mesmo espírito evangélico, que é o espírito das Bem-aventuranças.

Invoco a intercessão de Maria Santíssima sobre a próxima Quaresma, para que acolhamos o apelo a deixar-mo-nos reconciliar com Deus, fixemos o olhar do coração no Mistério pascal e nos convertamos a um diálogo aberto e sincero com Deus. Assim, poderemos tornar-nos aquilo que Cristo diz dos seus discípulos: sal da terra e luz do mundo (cf. Mt 5, 13.14).

Franciscus


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Quaresma é graça, não deixar passar este tempo em vão

Papa propõe diálogo "coração a coração" com o Senhor

Na sua mensagem (integralmente apresentada acima), o Papa Francisco recordou também a convocação para esta Quaresmade de jovens economistas, a realizar-se em Assis de 26 a 28 de março, como um passo no processo da "conversão" da economia. 

Bianca Fraccalvieri – Cidade do Vaticano 

Um diálogo coração a coração, de amigo a amigo com Jesus: é o que propõe o Papa Francisco na sua mensagem para a Quaresma 2020.

O título escolhido foi inspirado na 2ª carta de São Paulo aos Coríntios: “Em nome de Cristo, suplicamo-vos: reconciliai-vos com Deus” (2 Cor 5, 20).

Neste tempo quaresmal, o Pontífice estende a todos os cristãos o que escreveu aos jovens na Exortação apostólica Christus vivit: fixar os braços abertos de Cristo crucificado e deixarmo-nos salvar sempre de novo. “A Páscoa de Jesus não é um acontecimento do passado: pela força do Espírito Santo é sempre atual e permite-nos contemplar e tocar com fé a carne de Cristo em tantas pessoas que sofrem.” 

Face a face com o Senhor

Francisco insiste numa contemplação mais profunda do Mistério pascal, recordando que a experiência da misericórdia só é possível “face a face” com o Senhor crucificado e ressuscitado.
“Um diálogo coração a coração, de amigo a amigo. Por isso mesmo, é tão importante a oração no tempo quaresmal. Antes de ser um dever, está expressa a necessidade de corresponder ao amor de Deus, que nos precede sempre e sustenta.”
De facto, prossegue o Papa, o cristão reza ciente da sua indignidade de ser amado. A oração poderá assumir formas diferentes, mas o que conta verdadeiramente aos olhos de Deus é que ela escave dentro de cada um de nós, até romper a dureza do nosso coração, para o converter cada vez mais a Ele e à sua vontade.

Quanto mais nos deixarmos envolver pela sua Palavra, tanto mais conseguiremos experimentar a sua misericórdia gratuita por nós. O convite do Pontífice, portanto, é não deixar passar em vão este tempo de graça, na presunçosa ilusão de sermos nós o dono dos tempos e modos da nossa conversão a Ele. 

Não interromper o diálogo com o Senhor

Esta nova oportunidade, prossegue Francisco, deve suscitar em nós um sentido de gratidão e sacudir-nos do torpor em que nos encontramos, às vezes estimulados por um “uso pervertido” dos meios de comunicação
“Não obstante a presença do mal, por vezes até dramática, tanto na nossa existência como na vida da Igreja e do mundo, este período que nos é oferecido para uma mudança de rumo manifesta a vontade tenaz de Deus de não interromper o diálogo de salvação connsco.”
Colocar o Mistério pascal no centro da vida, acrescenta o Papa, significa sentir compaixão pelas chagas de Cristo crucificado presentes nas inúmeras “vítimas inocentes das guerras, das prepotências contra a vida desde a do nascituro até à do idoso, das variadas formas de violência, dos desastres ambientais, da iníqua distribuição dos bens da terra, do tráfico de seres humanos em todas as suas formas e da sede desenfreada do lucro, que é uma forma de idolatria”. 

Encontro de Assis

Para reverter este cenário, Francisco chama à sua causa a partilha na caridade e uma nova maneira de gerir a economia, mais justa e inclusiva, recordando a convocação para esta Quaresma de jovens economistas em Assis, de 26 a 28 de março. O magistério da Igreja lembra-nos que a política é uma forma eminente de caridade.

O Papa então concluiu:

“Invoco a intercessão de Maria Santíssima sobre a próxima Quaresma, para que acolhamos o apelo a deixar-mo-nos reconciliar com Deus, fixemos o olhar do coração no Mistério pascal e convertamo-nos a um diálogo aberto e sincero com Deus. Assim, poderemos tornar-mo-nos aquilo que Cristo diz dos seus discípulos: sal da terra e luz do mundo.”

VN