09 julho, 2015

"Não somos mercenários. Somos servidores" - Papa no Santuário de "El Quinche"

(RV) A última etapa da visita do Papa ao Equador, foi o encontro com o clero, religiosas, religiosos e seminaristas no Santuário “El Quiche” a cerca de 50 km de Quito.

O Actual edifício do Santuário remonta a 1928 e foi elevado a título de Santuário Nacional em 1985. Mas a história do Santuário remonta a finais de 1500, quando na Província de Napo os habitantes de Oyacachi foram profundamente perturbados por uma manada de ursos que devoravam animais domésticos e pessoas. Os rituais tradicionais para pôr termo a esse flagelo não deram resultados. Foi então que uma senhora visitou o povoado e disse que podia interceder para afastar os ursos, desde que lhe construíssem uma capela e se convertessem à  religião cristã. Os chefes indígenas aceitam. E é neste contexto que um homem de negócios, Diego Robles, chega a Oyacachi e mostra aos chefes uma imagem de Nossa Senhora. Admirados, dizem que é a senhora que os tinha visitado. Acolheram-na, então, com respeito e admiração e construíram-lhe a desejada capela, pondo a sua imagem no lugar onde tinham antes o seu ídolo, uma pedra com cara de urso. Ali permaneceu por 13 anos, de 1591 a 1604, ano em que o arcebispo de Quito, a transferiu para a aldeia de “El Quinche”.

A imagem de Nossa Senhora de “El Quinche” é uma silhueta de madeira de cedro com 64 cm de altura, roupagem requintada, rosto moreno e apaziguador. Traz na mão direita o ceptro e na esquerda uma criança.

A ela são dedicados numerosos cantos em diversas línguas locais e em castelhano, alguns de há séculos atrás. A imagem foi coroada em 1943 e a sua festa é a 21 de Novembro.

O edifício actual do Santuário é o terceiro, tendo sido o primeiro (de 1604) demolido para construir, em 1902, o segundo, muito mais amplo e que foi, por sua vez,  destruído pela natureza. Finalmente a terceira, cuja construção levou 25 anos, tendo ficado pronto em 1927/28. Tem uma superfície de 2.049m2 e uma área externa de 8 mil m2, com capacidade para acolher 15 mil peregrinos. É portanto, neste amplo “Campo Mariano” que o Papa foi acolhido em festa e com uma chuva de flores  por milhares peregrinos, esobretudo de  sacerdotes, religiosos, religiosas e seminaristas. Basta dizer que o país tem 5.300 consagrados e dois mil e cem padres, 16 arquidiocese e dioceses e 14 seminários. Hoje, as vocações não são tão abundantes como outrora, lançando, portanto, o desafio de acompanhar melhor os jovens com atitude vocacional.

O Papa elevou logo uma oração à Virgem Maria, Mãe de “El Quinche”, pedindo-lhe para lhe ensinar a entregar-se, a ser para os outros, as mãos de Deus…

A Ela, e aos destinatários do encontro no Campo Mariano, apresentou também tudo o que tem vivido nestes dias no Equador: idosos, doentes, alegrias e tristezas do povo daquele país latino-americano.

O discurso que o Papa tinha preparado para o clero, religiosas, religiosos e seminaristas, acabou por entregá-lo, improvisando uma conversa com eles.

Esse discurso desenrolava-se em volta do convite a aceitarem a missão sem pôr condições, tal como fez Maria, que se prontificou a servir. E recordou que é Deus quem nos elege, escolhe e destina. Por isso, nada de auto-referencialidade, egoísmos, busca do lucro material ou compensação afectiva.

“Não somos mercenários, mas sim servidores; viemos, não para ser servidos, mas para servir, fazendo-o com despreendimento total, sem bastão nem bolsa”.

No esteio da história do Santuário de El Quinche, Francisco recordou que Diego de Robles não fez a imagem de Nossa Senhora por vocação, mas para proveito económico e negou-se a fazer um altar para a imagem até que caindo do cavalo, viu-se em perigo e sentiu a protecção da Virgem. Voltou à aldeia e fez o pedestal da imagem. Quantas vezes, na nossa realidade de caídos, sentimos Deus à nossa frente – exclamou o Papa, continuando:

“Que a vanglória e o mundanismo não nos façam esquecer onde Deus nos resgatou! Que a Virgem Maria de Quinche nos faça descer dos postos de ambição, interesses egoístas, cuidados excessivos de nós mesmos!”

Mais ainda: A esses apóstolos de hoje, o Papa recorda que Jesus deu a autoridade não para o próprio benefício, mas para renovar e construir a Igreja. E recomendou-lhes:

“Não vos negueis a partilhar, não resistais a dar, não vos fecheis na comodidade; sede mananciais que transbordam e refrescam, especialmente a bem dos oprimidos pelo pecado, a desilusão, o rancor.”

Francisco recomendou ainda perseverança, o que “implica não mudar de casa em casa, buscando onde nos tratem melhor, onde haja mais recursos e comodidades. Perseverança supõe unir a nossa sorte à de Jesus até ao fim”. Perseverar no caminho, não obstante as confusões e perigos, sabendo que “não estamos sozinhos, que é o Povo Santo de Deus que caminha”. “A Igreja acompanha o discípulo missionário”.

E mais uma vez, como vem fazendo ao longo do seu pontificado, o Papa lembrou que “os pastores têm a responsabilidade de acolher com ternura e ajudar a discernir  cada espírito e cada chamada” . Há que dar as mãos nisso. E na linha do Santuário de El Quinche que desde os tempos dos Incas vem sendo um lugar multiétnico e multicultural, o Papa encorajou a Igreja a ser “casa e escola de comunhão”, a ser aquilo a que ele gosta de chamar a “cultura do encontro”. Cruzar o limiar do templo requer tornarmo-nos como Maria, Templo do Senhor, e levar a Palavra de Deus aos irmãos, acolher o irmão. E isto fez o arcebispo de Quito ao transferir o santuário de Oyacachi a El Quinche, onde, interpretou o Papa – podia acolher a todos, pois que “uma Igreja em saída, é uma Igreja que se aproxima, que desce para não ficar distante, que sai da sua comodidade e ousa chegar a todas as periferias que precisam da luz do Evangelho”.

O Papa concluiu convidando a retomar as tarefas de cuidar, animar e educar o Povo confiado aos pastores. E não faltou um toque de “Laudato Si”, nesse lugar que fala de ursos, cedros, aves, fenda na rocha… das flores que hoje enfeitam os arredores… o Papa rematou dizendo que “as origens dessa devoção levam-nos para tempos onde era mais simples “a harmonia serena com a criação”. E convidou a contemplar o Criador que vive entre nós e naquilo que nos rodeia.… Finalmente, confiou a Nossa Senhor de “El Quinche” a “nossa vocação”.

(DA)

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