Cidade do Vaticano (RV)
– O tradicional encontro do Papa com os jornalistas durante o voo,
neste caso o de retorno de Assunção a Roma, durou cerca de uma hora.
Muitos foram os questionamentos, desde a situação grega e a economia
mundial, a falta de mensagens direcionadas à classe média, até o
crucifixo sobre a foice e o martelo presenteado pelo presidente da
Bolívia.
A
primeira pergunta questionava o porquê do Paraguai ainda não ter um
cardeal. O Papa mesmo disse que o país mereceria ter até dois, mas não
por questão de méritos, mas porque “é uma Igreja viva, uma Igreja
alegre, uma Igreja lutadora e com uma história gloriosa”.
Sobre a visita no Equador, o Santo
Padre foi questionado se simpatizava com o projeto político do
presidente Correa, visto que a Sua presença e inclusive uma frase do
Pontífice poderia ter sido usada politicamente. A frase é: “O povo do
Equador se colocou de pé, com dignidade”. Francisco agradeceu pelo povo
ter respeitado a Sua visita em meio a problemas políticos do país.
"Equador não é um país de descarte,
ou seja, que se refere a todo o povo e a toda a dignidade desse povo,
que depois da guerra de fronteiras, se colocou de pé e tomou cada vez
mais consciência da sua dignidade e da riqueza da unidade na variedade
que tem. Ou seja, que não pode se atribuir a uma situação concreta.
Porque a mesma frase – comentaram comigo, eu não a vi – foi
instrumentalizada para explicar ambas situações: que o governo colocou
de pé o Equador ou que teriam colocado de pé os opositores ao governo.
Uma frase se pode instrumentalizar e, nisso, acredito que se precisa ser
muito cuidadoso. [...] É muito importante no trabalho de vocês a
hermenêutica de um texto. Um texto não pode ser interpretado com uma
frase. A hermenêutica tem que ser em todo o contexto."
Sobre o encontro na Bolívia com os
Movimentos Popolares, quando Francisco fez referência ao ‘novo
colonialismo’ e à ‘idolatria do dinheiro que submete a economia’, uma
pergunta ao Santo Padre foi direcionada à situação atual da Grécia que
pode inclusive comprometer a União Europeia.
"Eu tenho uma grande alergia à
economia, porque o papai era contador e, quando não terminava o trabalho
na fábrica, levava-o para casa. O sábado e o domingo, com aqueles
livros, daqueles tempos, com os títulos que se faziam em gótico... e
trabalhava, e eu via o papai... e tenho uma alergia. Eu não entendo bem
como é a coisa, mas certamente seria simples dizer: a culpa é somente
desta parte. Os governantes gregos que levaram adiante essa situação de
dívida internacional, têm também uma responsabilidade. Com o novo
governo grego se foi em direção a uma revisão um pouco justa. Eu espero,
e é a única coisa que posso dizer, porque não sei bem, que encontrem
uma estrada para resolver o problema grego e também uma estrada
vigilante para não recair em outros países o mesmo problema, e que isso
nos ajude a ir adiante, porque aquela estrada do empréstimo e das
dívidas no final, não termina nunca."
Sobre o presente recebido pelo
presidente da Bolívia, Evo Morales, o Santo padre reafirmou se tratar de
uma obra de Padre Espinal, “uma arte de protesto, mas que não conhecia e
não me ofende”. Mas, afinal, o que teria sentido o Papa ao receber
aquela foice e martelo com o Cristo em cima?
.
.
"Eu, é curioso, não conhecia isso e
nem sabia que Padre Espinal era escultor e também poeta. Eu soube nestes
dias. Eu o vi e, para mim, foi uma surpresa. […] Primeiro ponto, então,
não sabia; segundo, eu o qualifico como arte de protesto que, em alguns
casos, pode ser ofensiva, em alguns casos. Terceiro, neste caso
concreto: Padre Espinal foi morto em 1980. Era um tempo em que a
Teologia da Libertação tinha muitas linhas, uma dessas era com a análise
marxista da realidade, e Padre Espinal pertencia a essa. Isso sim, eu
sabia, porque naquele tempo, eu era reitor da Faculdade de Teologia e se
falava muito sobre isso, das diversas linhas e quais eram seus
representantes. […] Espinal é um entusiasta dessa análise da realidade
marxista, mas também da teologia, usando o marxismo. Disso surgiu esta
obra. Inclusive as poesias de Espinal são daquele gênero de protesto,
mas era a sua vida, era o seu pensamento, era um homem especial, com
tanta genialidade humana, e que lutava com boa fé. Fazendo uma
hermenêutica do gênero, eu entendo essa obra. Para mim não foi uma
ofensa. Mas precisei fazer essa hermenêutica e digo para vocês para que
não existam opiniões erradas. Este objeto agora eu levo comigo. Vem
comigo."
.
.
Questionado sobre a falta de
mensagens direcionadas para a classe média, já que a maioria dos
discursos do Papa são eloquentes para os pobres e também para os ricos e
poderosos, o Pontífice respondeu:
.
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"O senhor tem razão, é um erro da
parte minha. Devo pensar sobre isso. Farei algum comentário, mas não
para me justificar. O Senhor tem razão, devo pensar um pouco. O mundo
está polarizado. A classe média está menor. A polarização entre os ricos
e os pobres é grande, isso é verdade, e talvez isso me levou a não
perceber aquilo. Falo do mundo, alguns países não, vão muito bem; mas,
no mundo em geral, a polarização se vê e o número dos pobres é grande.
Então, por que falo dos pobres? Mas porque está no coração do Evangelho,
e sempre falo do Evangelho sobre a pobreza, ainda que seja sociológica.
Depois, sobre a classe média têm algumas palavras que eu disse, mas um
pouco ‘em passant’. Mas a gente simples, a gente comum, o operário...
aquilo é um grande valor."
Inclusive uma brincadeira foi
colocada ao Santo Padre sobre o uso insistente de fotos, como o selfie,
nesta era digital e em meio à missa, feitas por jovens, crianças e
colegas.
"O que eu penso? É uma outra cultura.
Eu me sinto bisavó. Hoje, ao me despedir, um policial, grande, com seus
40 anos, me disse: ‘faço um selfie’. E eu disse: ‘mas você é um
adolescente’. Sim, é uma outra cultura, mas eu a respeito."
E ainda, em gênero de curiosidade, um
jornalista pediu qual o segredo de tamanha vivacidade do Papa Francisco
– confirmada tanto na viagem à America Latina, como nesses últimos dois
anos e meio de pontificado:
"Qual é a sua ‘droga’, gostaria de
questionar ele... (risos). È, aquela era a pergunta! Ah… a ‘droga’. Mas,
o mate me ajuda. Mas não provei a coca. Isso é claro, não?"
(AC)
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