Comunicação
Carta aos Diocesanos de Lisboa
Caríssimos: Volto a escrever-vos nesta Quaresma, para também assim manifestar a minha presença e companhia em tempos tão especiais como os que vivemos, com os nossos concidadãos e em todo o mundo já.
No
modo de comunicar que os novos meios permitem, recebo muitas mensagens
que dão conta de como pessoas e famílias vão vivendo e do muito que se
vai fazendo, na vida pública e particular, para responder aos graves
problemas de saúde, equilíbrio humano e sustento básico que se põem e
continuarão a pôr. É muito o que se tem feito, das instâncias oficiais e
sanitárias à solidariedade interpessoal e de vizinhança. Chegam-me
notícias que confirmam a humanidade no seu melhor, como se demonstra no
concreto do quotidiano de muitos, por vezes no limite das suas
possibilidades.
No âmbito eclesial, são igualmente muitas as ações
em curso, de paróquias, institutos religiosos e seculares e
instituições socio-caritativas, para minorar e ultrapassar as
dificuldades que surgem e a falta de meios, pessoais e materiais, para
prosseguirem a sua ação. A nossa Cáritas Diocesana procura igualmente
uma resposta coordenada com outras instâncias, para não dispersar as
possibilidades que existam ou se reforcem.
Por tudo isto, sabemo-lo bem, passa algo muito maior do que nós e nos impulsiona, como a muitas outras pessoas de boa vontade.
Refiro-me à ação divina, que, contando connosco, nos precede e
ultrapassa em tudo o que seja bom e útil para todos. A fé bíblica
apresenta-se assim, como a certeza de um “Deus connosco” que abre sempre
caminho e neste nos apoia. Em Jesus Cristo, a confiança no Pai é toda a
sua força, fazendo das impossibilidades imediatas outras tantas
ocasiões de vida e vida em abundância.
Lembramos certamente a cura
daquele jovem doente, quando Jesus fez o que os discípulos não
conseguiam. O pai do jovem pediu-lhe a cura do filho e Jesus disse-lhe
que tudo é possível a quem crê. O pai respondeu, como nós havemos de
responder: “Eu creio! Ajuda a minha pouca fé!”». O jovem foi
efetivamente curado: «Tomando-o pela mão, Jesus levantou-o, e ele pôs-se
de pé.» Depois disse aos discípulos: «Esta casta de espíritos só pode
ser expulsa à custa de oração.» (cf Mc 9, 14-29).
A
linguagem é a da época, mas a lição é para agora e na atual emergência.
Para nós sacerdotes, tão limitados nos contactos habituais, mas não na
preocupação pelo bem de todos. Para os nossos colaboradores – diáconos,
consagrados e leigos – este trecho evangélico garante-nos que a oração
forte e permanente como que abre a Deus a possibilidade de atuar neste
mundo e reforça a ação de quem se dedica ao bem dos outros.
Em
Jesus, a coincidência orante com o Pai fez dele uma permanente fonte de
vida. Vão no mesmo sentido estas indicações que nos dá, entre muitas
outras: «Pedi, e ser-vos-á dado; procurai, e encontrareis; batei e hão
de abrir-vos. Pois, quem pede, recebe; e quem procura, encontra; e ao
que bate, hão de abrir» (Mt 7, 7-8). E também: «Se dois de
entre vós se unirem na terra, para pedir qualquer coisa, hão de obtê-la
de meu Pai que está no Céu» (Mt 18, 19).
Este último trecho tem muita aplicação no que vai crescendo nestes dias como oração em família. Reaviva a dimensão doméstica da Igreja de Cristo, tão salientada pelo Papa Francisco na exortação apostólica pós-sinodal Amoris Laetitia: «A Igreja é família de famílias, constantemente enriquecida pela vida de todas as igrejas domésticas» (AL, 87).
Isto
mesmo se realiza agora, apoiando pela oração, não só a vida familiar,
mas também a vida de todos, em circunstâncias tão difíceis: «A oração em
família é um meio privilegiado para exprimir e reforçar esta fé pascal.
Podem encontrar-se alguns momentos cada dia para estar unidos na
presença do Senhor vivo, dizer-Lhe as coisas que os preocupam, rezar
pelas necessidades familiares, orar por alguém que está a atravessar um
momento difícil, pedir-Lhe ajuda para amar, dar-Lhe graças pela vida e
as coisas boas, suplicar à Virgem que os proteja com o seu manto de Mãe»
(AL, 318).
Estas indicações papais ganham hoje uma
conveniência acrescida, nos diversos âmbitos eclesiais, da “família
doméstica” à “família de Deus”, que é a Igreja toda, acompanhada pelos
seus pastores. Assim acontecerá amanhã, dia 25, Solenidade da Anunciação
do Senhor, quando às 11 horas de Portugal (meio dia em Roma), rezarmos
ecumenicamente com o Papa um convicto Pai Nosso; e depois seguirmos a
partir de Fátima às 18.30, com o seu Bispo, unido aos Bispos de
Portugal, de Espanha e de outras dioceses estrangeiras, a recitação do
Rosário e a consagração aos Corações de Jesus e Maria.
Caríssimos
irmãos sacerdotes, diáconos, consagrados e fiéis leigos: Família a
família, comunidade a comunidade, persistamos em oração. Fisicamente
resguardados e no cumprimento estrito das indicações sanitárias,
alarguemos em Deus a solidariedade com todos. Muitos concidadãos nossos,
que estão na primeira linha dos cuidados de saúde e do serviço público,
social ou particular, contam com a nossa oração, que lhes garantirá a
força para o que vão fazendo, com tanta generosidade e mérito.
Convosco, com oração e muita estima,
Lisboa, 24 de março de 2020
+ Manuel, Cardeal-Patriarca
Patriarcado de Lisboa
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