01 outubro, 2019

Homilia integral do Papa nas vésperas de início do Mês Missionário

 
Papa Francisco durante as vésperas de início do Mês Missionário na Basílica de São Pedro (ANSA)
 
“Testemunha é a palavra-chave; uma palavra que tem a mesma raiz e significado de mártir. Os mártires são as primeiras testemunhas da fé: não por palavras, mas com a vida", disse Francisco na sua homilia.
 
Cidade do Vaticano

O Papa Francisco celebrou as vésperas do início do Mês Missionário, na Basílica de São Pedro, nesta terça-feira (1º/10).

Eis sua homilia integral.

Na parábola que ouvimos, o Senhor apresenta-Se como um homem que, antes de partir, chama os servos para lhes entregar os seus bens (cf. Mt 25, 14). Deus confiou-nos os seus bens maiores: a nossa vida, a vida dos outros, tantos dons diferentes a cada um. E estes bens, estes talentos não representam algo que se deve guardar no cofre, mas uma chamada: o Senhor chama-nos a fazer render os talentos com ousadia e criatividade. Deus não nos vai perguntar se guardamos zelosamente a vida e a fé, mas se entramos em jogo, arriscando e acabando talvez mal vistos. Este Mês Missionário extraordinário quer ser uma sacudidela que nos provoca a sermos ativos no bem. Não notários da fé e guardiões da graça, mas missionários.

Mas como fazer para nos tornarmos missionário? Vivendo como testemunhas: testemunhando com a vida que se conhece Jesus. Testemunhando é a palavra-chave; uma palavra que tem a mesma raiz e significado de mártir. E os mártires são as primeiras testemunhas da fé: não por palavras, mas com a vida. Sabem que a fé não é propaganda nem proselitismo, mas um respeitoso dom da vida. Vivem espalhando paz e alegria, amando a todos, incluindo os inimigos, por amor de Jesus. Deste modo nós, que descobrimos ser filhos do Pai celeste, como podemos ocultar a alegria de sermos amados, a certeza de sermos sempre preciosos aos olhos de Deus? É o anúncio que muitas pessoas aguardam. E é a nossa responsabilidade levá-lo. Neste mês, perguntemo-nos: Como é o meu testemunho?

No final da parábola, o Senhor chama «bom e fiel» a quem foi empreendedor; e, ao contrário, «mau e preguiçoso» ao servo que se colocou na defensiva (cf. 25, 21.23.26). Por que razão Deus é tão severo com este servo que teve medo? Que mal fez ele? O seu mal foi não ter feito bem, pecou por omissão. E isto pode ser o pecado duma vida inteira, porque recebemos a vida, não para enterrá-la, mas para a colocar em jogo; não para retê-la, mas para a dar. Quem está com Jesus sabe que tem aquilo que se dá, possui aquilo que se doa; e o segredo para possuir a vida é doá-la. Viver de omissões é renegar a nossa vocação: a omissão é o contrário da missão.

Pecamos por omissão, isto é, contra a missão, quando, em vez de espalharmos a alegria, fechamo-nos numa triste vitimização, pensando que ninguém nos ama nem compreende. Pecamos contra a missão, quando cedemos à resignação: «Não consigo fazer isto, não sou capaz». Mas como é possível? Deus deu-te talentos, e tu consideras-te assim tão pobre que não podes enriquecer ninguém? Pecamos contra a missão, quando, num lamento sem fim, continuamos a dizer que está tudo mal, no mundo e na Igreja. Pecamos contra a missão, quando caímos escravos dos medos que imobilizam, e nos deixamos paralisar pelo «sempre se fez assim». E pecamos contra a missão, quando vivemos a vida como um peso e não como um dom; quando, no centro, estamos nós com as nossas fadigas, não os irmãos e irmãs que esperam ser amados.

«Deus ama quem dá com alegria» (2 Cor 9, 7). Ama uma Igreja que vive em saída. Se não vive em saída, não é Igreja. Uma Igreja em saída, missionária é uma Igreja que não perde tempo a lamentar-se pelas coisas que não funcionam, pelos fiéis que diminuem, pelos valores de outrora que já não existem. Uma Igreja que não procura oásis protegidos para estar tranquila; deseja apenas ser sal da terra e fermento para o mundo. Sabe que esta é a sua força, a mesma de Jesus: não a relevância social ou institucional, mas o amor humilde e gratuito.

Hoje entramos no Outubro Missionário acompanhados por três «servos» que ostentaram muito fruto. Mostra-nos o caminho Santa Teresa do Menino Jesus, que fez da oração o combustível da ação missionária no mundo. Este é também o mês do Rosário: Quanto rezamos nós pela difusão do Evangelho, para nos convertermos da omissão à missão? Temos depois São Francisco Xavier, talvez o maior missionário da história depois de São Paulo. Também ele nos sacode: Saímos da nossa concha, somos capazes de deixar as nossas comodidades pelo Evangelho? E há a Venerável Paulina Jaricot, uma operária que apoia as missões com o seu trabalho diário: com as parcelas que deduzia do salário, deu início às Obras Missionárias Pontifícias. E nós, fazemos de cada dia um dom para superar a fratura entre Evangelho e vida? Por favor, não vivamos uma fé «de sacristia».

Acompanham-nos uma religiosa, um sacerdote e uma leiga. Dizem-nos que ninguém está excluído da missão da Igreja. Sim, neste mês, o Senhor chama-te também a ti. Chama a ti, pai e mãe de família; a ti, jovem que sonhas com grandes coisas; a ti, que trabalhas numa fábrica, numa loja, num banco, num restaurante; a ti, que estás sem trabalho; a ti, que estás numa cama de hospital... O Senhor pede que te faças dom no lugar onde estás, assim como estás, com quem está ao teu lado; que não te limites a sofrer a vida, mas a dês; que não te limites a chorar os teus infortúnios, mas deixa-te levar pelas lágrimas de quem sofre. Coragem! O Senhor espera muito de ti. Espera também que alguém tenha a coragem de partir, ir aonde há mais falta de esperança e dignidade, ad gentes, aonde tantas pessoas vivem ainda sem a alegria do Evangelho. Vai! O Senhor não te deixará sozinho; dando testemunho, descobrirás que o Espírito Santo chegou antes de ti para te preparar o caminho. Coragem, irmãos e irmãs! Coragem, Mãe Igreja: reencontra a tua fecundidade na alegria da missão!

VN

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