Da esquerda para a direita, o cientista Carlos Nobre e
o bispo emérito da Prelazia do Xingu - PA, dom Kräutler
Na Sala de
Imprensa da Santa Sé (09.10.2019), as intervenções do cientista brasileiro prémio
Nobel da Paz, Carlos Alfonso Nobre, do bispo emérito da Prelazia do
Xingu - PA, dom Erwin Kräutler, e da ecologista brasileira, Irmã Celia
Guimarães Vieira. Ainda, Paolo Ruffini, Pe. Giacomo Costa e Cristiane
Murray
Alessandro Di Bussolo - Cidade do Vaticano
O grito de alarme da ciência, que através do prémio Nobel da Paz 2007
Carlos Alfonso Nobre recorda que estamos muito próximos de um colapso
da Floresta amazónica, e o grito da Igreja, representada pelo bispo
emérito da Prelazia do Xingu – PA, dom Erwin Kräutler, que denuncia que a
central hidroelétrica de Belo Monte, a terceira maior do mundo, é uma
agressão a todo o ecossistema, ressoaram com força na Sala de Imprensa
da Santa Sé durante a 3ª coletiva do Sínodo dos Bispos para a Amazónia.
Pouco antes, sintetizando os trabalhos da 5ª Congregação Geral,
realizada na manhã desta quarta-feira (09/10), o prefeito do Dicastério
para a Comunicação, Paolo Ruffini, ressaltou que alguns padres sinodais
falaram de “ecocídio” e de pecados ecológicos contra a criação e sobre a
harmonia da Criação, que deveriam ser reconhecidos e confessados,
porque “pecados contra Deus, contra o próximo e as futuras gerações”.
Kräutler, a Eucaristia é uma obrigação
O octogenário bispo Erwin Kräutler, originário da Áustria, que vive
na Floresta amazónica desde quando tinha 26 anos, e há 30 anos vive com a
proteção de guarda-costas porque apoia os indígenas e defende a
floresta, recordou que o Papa, ao anunciar o Sínodo, “pediu uma atenção
especial para com os povos indígenas, que estão em risco”.
Perante pergunta sobre a proposta da ordenação de homens casados, dom
Kräutler ressaltou que milhares de comunidades, na Amazónia, recebem a
Eucaristia uma ou duas vezes por ano “e a Eucaristia é fundamental para o
cristão”.
“Queremos que estes irmãos não tenham somente a Palavra, mas também a
Eucaristia, prosseguiu o bispo. Há o risco de se colocar o celibato
acima da Eucaristia. Mas o Senhor, na Última Ceia, disse: ‘Fazei isto em
minha memória’. Portanto, a Eucaristia é uma obrigação para nós.”
É preciso presença estável nas comunidades isoladas
Recordemos, acrescentou, que “dois terços destas comunidades cristãs
sem sacerdotes são coordenadas por mulheres! Fala-se tanto na
valorização da mulher, mas precisamos de coisas concretas. Estamos a pensar no diaconato feminino, porque não? – e este é um tema do
Sínodo”.
A emigração rural provocou um inchaço nas cidades de modo
antinatural, comentou dom Kräutler respondendo a outra pergunta, “e hoje
para a Igreja, o desafio é conseguir alcançar todo este povo. As Igrejas
pentecostais chegaram antes de nós, e nós não estamos presentes devido à
falta de sacerdotes, ou de religiosos e religiosas. Não basta visitar
uma comunidade, a Igreja deve estar sempre presente, com a celebração da
Eucaristia e a administração dos sacramentos”.
Nobre: a floresta próxima do ponto de não-retorno
Antes dele, o brasileiro Carlos Alfonso Nobre, prémio Nobel da Paz
2007, climatologista, um dos maiores especialistas em aquecimento
global, que estuda a Amazónia há 40 anos, sintetizou os temas de um
documento realizado exclusivamente para o Sínodo.
Ele recordou que a Amazónia é o coração ecológico do planeta, com uma
sócio e biodiversidade imensa. Mas, denunciou, “estamos muito próximos
do colapso da Floresta amazónica, a ciência diz isto com rigor absoluto.
Como diz a Laudato si’, a Casa Comum está perto a desmoronar”.
Se se chegar a destruir 20-25% da floresta, foi o alarme de Nobre,
“pouco depois a savana cobrirá 60% da área. A floresta está hoje
destruída em 15%. Estamos próximos do ponto de não-retorno”.
A ajuda pode vir da tecnologia e da bioeconomia
O que fazer? Perguntou o cientista brasileiro. “As tecnologias
podem ajudar a encontrar soluções, se não forem utilizadas para a
exploração indiscriminada dos recursos naturais”, explicou.
A tecnologia pode dar mais poder às populações, “graças à
bioeconomia, a um novo modelo de economia sustentável, descentrada,
auxiliada por energia proveniente de fontes renováveis, que respeitem a
qualidade de vida das comunidades. Para que a Amazónia possa continuar a ser a floresta que é há 30 milhões de anos”.
Irmã Celia Vieira: respeitar povos que escolhem viver isolados
Também a Irmã Celia Guimarães Vieira, ecologista brasileira membro da
Comissão nacional para o Meio-ambiente – Conama –, no Sínodo na
qualidade de especialista, que há 30 anos estuda a biodiversidade da
Amazónia, falou na Sala de Imprensa da Santa Sé. Ela abordou a questão
dos povos isolados.
“É importante assegurar o território a estes povos e respeitar o tipo
de isolamento que escolheram. Há 114 povos isolados no Brasil já
reconhecidos e 28 confirmados”, ressaltou a religiosa. E agradeceu ao
Papa e aos padres sinodais por terem colocado no centro dos trabalhos o
tema da ecologia integral, “muito apreciado por nós brasileiros”, disse.
VN
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