(RV) O
Papa Francisco deslocou-se nesta quarta-feira de manhã da Cidade do
México à Cidade de Juárez, Estado de Chihuahua, no extremo norte do
México, na fronteira com os Estados Unidos, onde teve primeiro um
comovedor encontro com os presos, no Centro de Readaptação Social
estatal (CeReSo) que acolhe três mil detidos adultos, um pequena parte
dos quais mulheres; e depois no Colégio Bachilleres, o encontro com o
mundo do trabalho. Depois desse encontro que terminou por volta das 13
horas locais, 21 em Roma, o Papa dirigiu-se à Nunciatura, para o almoço
com o sequito da viagem e às 16 horas locais celebrará a Missa em na
área feiristica da Cidade, antes de se despedir do México e regressar a
Roma, onde a sua chegada está prevista para a tarde de quinta-feira, 18.
Na Missa participarão pessoas dum lado e doutro do Rio Grande, isto é
da Cidade de El Paso nos Estados Unidos e da Cidade de Juárez, separadas
apenas por uma rede metálica.
Cidade de Juárez
Com mais de um milhão e duzentos mil habitantes, a Cidade de Juárez
foi fundada em 1659 com o nome de “El Paso del Norte” por exploradores
espanhóis. Por mais de dois séculos a ponte sobre o Rio Grande foi a
única passagem para o Texas. Em 1848 um Tratado estabeleceu esse rio
como a fronteira entre o México e os Estados Unidos, separando os
territórios a norte do rio do resto da cidade. A parte da cidade que
ficou para os Estados Unidos passou a ser chamada “El Paso” e a outra do
lado do México, foi denominada, em 1888, Ciudade de Juárez, em
homenagem ao presidente Benito Juárez. O desenvolvimento dos caminhos de
ferro nessa área em 1882, fez com que se desenvolvessem com bancas,
correios, actividades comerciais.
As duas cidades separadas hoje pelo rio e por uma rede metálica, e
que do alto parecem ser uma única cidade, formam uma área metropolitana
de cerca de dois milhões e meio de habitantes, sendo assim a maior área
metropolitana binacional nos confins entre México e Estados Unidos.
Com o seu desenvolvimento e indústrias, a Cidade de Juárez atrai
muitos trabalhadores de várias partes do México, mas é considerada uma
das cidades mais violentas do mundo com 2500 homicídios só em 2009. A
espiral de violência é causada pelo narcotráfico e pela presença de uns
950 bandos armados com dezenas de filiações. Devido ao narcotráfico, nos
últimos quatro anos, 212 mil habitantes, cerca 18% da população
abandonou a cidade. A partir de 1993 Juárez tornou-se ulterior e
tristemente famosa pelas milhares de mulheres desaparecidas, pessoas
pobres que geralmente trabalhavam em fábricas ilegais que fabricam
produtos destinados ao chamado “primeiro mundo”.
Discurso do Papa ao mundo do trabalho
É neste contexto duma Cidade que tem uma “relação especial (…) com
mundo do trabalho” como ele próprio disse, que o Papa Francisco quis
encontrar-se com empresários e trabalhadores. Foi no Colégio de
Bachilleres, Instituto público de educação superior.
Depois de ouvir as ansiedades e esperanças desse mundo expressas por
uma família e um empresário, o Papa agradeceu por “essa oportunidade de
intercâmbio e reflexão dizendo:
“Tudo o que pudermos fazer para dialogar, para nos encontrar,
para procurar melhores alternativas e oportunidades já é uma conquista
que merece apreço e destaque”.
O Papa tem a consciência de que isto não é suficiente, mas, frisou,
“não podemos dar-nos ao luxo de cortar qualquer possibilidade de
encontro, discussão, confronto, pesquisa. Esta é a única maneira que
temos de poder construir o amanhã: ir tecendo relações duradouras”
capazes de reconstruir os vínculos sociais consumidos pela falta do
respeito requerido para uma sadia convivência.
Por isso exprimiu o desejo de que esse encontro seja uma oportunidade
para construir, ”para forjar o México que o seu povo e os seus filhos
merecem”.
E foi sobre o México que os seus filhos merecem que o Papa alicerçou o
seu discurso, dizendo que ali se encontravam várias organizações de
trabalhadores e representantes de câmaras e associações empresariais,
aparentemente antagonistas entre si, mas unidas por uma responsabilidade
comum:
“Procurar criar oportunidades de trabalho digno e
verdadeiramente útil para a sociedade e sobretudo para os jovens desta
terra”.
O que acontece, porém é que a falta de oportunidades de instrução e
trabalho sustentável e rentável para os jovens, gera pobreza e,
consequentemente, um terreno favorável para cair na espiral do
narcotráfico e da violência. Mas ninguém pode dar-se ao “luxo de deixar
só e abandonado o presente e o futuro do México.” – frisou.
Francisco fez notar depois como o paradigma do lucro e da utilidade
económica se tornou o princípio das relações económicas e como o lucro a
todo o custo e imediatamente leva tanto à perda da dimensão ética como
também a esquecer de investir no povo, nas pessoas, nas famílias. E
recordou que “o melhor investimento é criar oportunidades” e não o de
colocar o “fluxo de pessoas ao serviço de fluxo de capitais”, provocando
em muitos casos a exploração dos trabalhadores.
“Deus pedirá contas aos esclavagistas dos nossos dias e nós
devemos fazer todo o possível para que estas situações não ocorram mais.
O fluxo de capital não pode determinar o fluxo e a vida das pessoas”
O Papa disse ainda que não raro a Doutrina Social da Igreja é vista
pelas empresas como se pretendesse que se transformem em instituições
filantrópicas, mas recordou, “a única pretensão que tem a Doutrina
Social da Igreja é velar pela integridade das pessoas e das estruturas
sociais” e sempre que isto for ameaçada, a “Doutrina Social da Igreja
há-de ser uma voz profética que nos ajudará a todos a não nos perdermos
no mar sedutor da ambição”, pois que cada vez que a integridade duma
pessoa é violada, toda a sociedade se deteriora. E recordou que todos
têm o dever de proteger o bem comum:
“Todos devemos lutar para que o trabalho seja uma instância de humanização e de futuro”.
E o Papa prosseguiu:
“Que quer o México deixar aos seus filhos? Quer deixar-lhes
uma recordação de exploração, de salários insuficientes, de pressão
laboral? Ou deixar-lhes na memória a cultura de um trabalho digno, um
tecto decente e terra para trabalhar? Em qual cultura queremos ver
nascer aqueles que virão depois de nós? Que atmosfera vão respirar? Um
ar contaminado pela corrupção, a violência, a insegurança e desconfiança
ou, pelo contrário, um ar capaz de gerar alternativas, gerar renovação e
mudança?”
Consciente, todavia, de que o que propõe não é fácil, Francisco,
disse que “o pior é deixar o futuro nas mãos da corrupção, da
brutalidade, da falta de equidade”.
Embora não seja fácil negociar, e viver num mundo cada vez mais
competitivo, a “falta de negociação e avaliação provocam danos maiores e
é pior deixar que esse mundo competitivo determine o destino dos povos.
“O lucro e o capital não são um bem superior ao homem, mas
estão ao sérvio do bem comum. E, quando o bem comum é forçado a estar ao
serviço do lucro e o único a ganhar é o capital, a isto chama-se
exclusão”
E Rogando a Nossa Senhora de Guadalupe para que ajude a construir um novo México, o Papa conclui convidando todos a “sonhar
o México, a construir o México que os vossos filhos merecem, um México,
onde os pais tenham tempo para estar com os próprios filhos, onde não
haja pessoas de primeira, segunda ou quarta.., mas um México que saiba
reconhecer no outro a dignidade de filho de Deus…”.
(DA)
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