A aparição prolonga-se em missão
Homilia na conclusão da visita da imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima ao Patriarcado de Lisboa
Homilia na conclusão da visita da imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima ao Patriarcado de Lisboa
Arlindo Homem / Patriarcado de Lisboa |
Amados irmãos e irmãs, aqui reunidos em torno de Nossa Senhora, como os
pastorinhos a viram em Fátima, vestida de branco e de mãos postas. Já
isto mesmo é importante e conversor. Porque pureza e oração são
essenciais na mensagem que trouxe, ou melhor nos lembrou, com o
Evangelho de Cristo. Pureza, como a brancura da sua veste, significa sem
mistura de sentimentos e desejos, que não sejam unicamente adorar a
Deus e amá-Lo sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos - ou,
ainda mais, como o próprio Cristo nos amou. E oração, permanente e
fervorosa, traduz dependência total de Deus e da sua graça, para que tal
aconteça no nosso coração e nas nossas vidas, em nós e em todos, de nós
para todos.Impressiona verificar como assim sucedeu com os pastorinhos,
um século atrás. Crianças da serra de Aire, com a vida e a cultura que
podiam ter, naquele lugar e naquela altura, ouviram a Senhora a
lembrar-lhes palavras essenciais do Evangelho, precisamente de
penitência e oração, conversão e entrega a Deus e, por Deus, aos outros.
E eles próprios se transformaram na exemplificação mais clara da
mensagem recebida, de que nada nem ninguém os conseguiram demover. Foi
sobretudo por isso, pela autenticidade evangélica das suas vidas e
testemunhos que, como diria depois o Cardeal Cerejeira, não foi a Igreja
que impôs Fátima, mas Fátima que se impôs à Igreja.
Sinal dessa autenticidade foi a missão a que se dedicaram, de dizer o que urgia dizer, para que a conversão de muitos garantisse a paz para todos, e da terra ao Céu. Porque toda a aparição verdadeira se prolonga em missão necessária.
É feliz e providencial que as leituras bíblicas deste Domingo nos esclareçam e confirmem nesse mesmo sentido. Na primeira, quando Isaías vai ao templo e aí “vê” o Senhor, de modo tão total que primeiro o purifica e a seguir o envia, como seu profeta. E que importante é a ordem das referências: Primeiro vê, pois é despertado para aquela presença absoluta de Deus - e especialmente ali e daquela forma. Depois, sente o abismo da sua própria imperfeição, diante da santidade divina. A seguir, é purificado e assim mesmo preparado para o envio e a missão. Nunca mais deixará de ser profeta do que lhe acontecera, para que todos reconhecessem a Deus como deviam – e a Quem se deviam, como seu povo.
E o mesmo com São Paulo, como de si falou aos coríntios e agora a nós. De Jesus nada soubera ao certo, nem gostaria de ouvir falar. Até que um dia, de facto marcante, o Ressuscitado lhe “apareceu” também a ele. A partir daí, nunca mais deixou de “trabalhar” e mais que todos, para que ninguém ficasse de fora do que lhe fora revelado: Cristo vencera a morte; e vencemo-la, também nós, no corpo e na alma, unicamente como Cristo a venceu, com a medida inteira em que nos doamos a Deus e nos doamos aos outros, num único movimento que por fim nos salva.
Assim com o profeta, assim com o apóstolo, assim também com Pedro, quando Jesus lhe mandou relançar as redes. À sua ordem, voltou à faina e pescou como nunca. Daquele encontro, nasceu-lhe a missão: «Daqui em diante serás pescador de homens». Para que do perigoso mar do mundo fossemos retirados para a vida, na grande barca da Igreja.
Isaías, Paulo, Pedro e os outros, os Pastorinhos de Fátima, nós todos aqui, com as multidões que seguiram a Mãe de Jesus na sua imagem peregrina, ao longo destas três abençoadas semanas em que percorreu a nossa diocese. Tudo é aparição prolongada em missão e estímulo do Céu para o nosso caminho sinodal, no “sonho missionário de chegar a todos”.
Mas como aos que referimos, e ainda mais que a eles, a aparição absoluta foi de Deus a Maria, que escolheu por Mãe, para vir ao mundo. E missão decidida foi também a sua, visitando Isabel para visitar a todos, oferecendo-nos Jesus, que concebeu, deu à luz e acompanhou de Belém ao Gólgota.
Depois, o Espírito Santo, que ungiu Jesus para anunciar a Boa Nova aos pobres, foi O que no Pentecostes expandiu a Igreja, que com Maria se traduz em missão permanente. Por isso mesmo, não há aparição da Mãe de Cristo, como foi a de Fátima, que não ganhe autenticidade por estas duas notas essenciais: projeção missionária e envolvimento eclesial. Como repetidamente aconteceu e como nós todos o manifestamos aqui e agora.
Aqui mesmo, nesta magnífica igreja de Santa Maria de Belém. E no agora que vivemos, com «as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens do nosso tempo, sobretudo dos pobres e de todos os aflitos, [que] são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo», como há meio século o repetimos, com o Vaticano II (Gaudium et Spes, 1). E assim mesmo o quero concluir em oração, diante da imagem peregrina da branca Senhora das mãos postas, por mim e por todos nós:
Mãe de Deus e nossa Mãe, Nossa Senhora de Fátima, Rainha de Portugal e do mundo inteiro:
Fazei-nos seguir o vosso Filho, no apelo evangélico à decidida conversão a Deus e ao serviço do próximo, sobretudo dos que mais precisam de ser acolhidos, respeitados e amparados, ao longo do percurso completo da vida de cada um. Olhai por todas as mães, para que recebam o dom dos seus filhos, desde o momento da sua conceção, contando com o apoio dos seus familiares e duma sociedade que legal e praticamente reconheça o valor da vida como o primeiro dos valores, imprescindível base de todos os demais.
Olhai pelos pais, para que os filhos contem com a complementar referência feminina e masculina, indispensável no seu todo ao crescimento humano, que essencialmente a requer.
Assim foi convosco e com o Menino que concebestes e depois destes à luz; com o Menino que criastes do presépio de Belém ao exílio do Egito e a Nazaré da Galileia. E sempre contando com a paternal figura de José, que vos aceitou por esposa e adotou Jesus, assim mesmo acompanhando os dois o seu «crescimento em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e dos homens» (cf. Lc 2, 52), verdadeiro objetivo de toda a educação.
Sabemos que não deixais de olhar por nós, atenta como estivestes ao que faltava nas bodas de Caná e indicando-nos Jesus como resposta ao que carecemos de mais definitivo e importante. Consagramo-nos por isso ao vosso amor materno, que é também o amor que Vós própria consagrais a Deus e a todos nós, por amor de Deus.
Como mãe e mestra, ensinai-nos a estar igualmente próximos das necessidades dos outros e a acompanhá-los na vida e até à morte natural, não lhes faltando nunca com os cuidados e a convivência onde o amor realmente se comprova, em especial na doença e na agonia, como Vós mesma estivestes junto à cruz do vosso Filho.
Ensinai-nos sempre e avivai-nos agora a verdade de Cristo. Hoje como então, é pela maneira como nos amarmos que todos nos reconhecerão como seus discípulos. - Assim o fostes Vós, ó Mãe de Misericórdia! Assim o seremos convosco, os que aqui estamos com gratidão e compromisso, para que a Mensagem que deixastes em Fátima realize em nós e por nós o Evangelho de Cristo!
+ Manuel, Cardeal-Patriarca
Santa Maria de Belém, na conclusão da visita da imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima ao Patriarcado de Lisboa, 7 de fevereiro de 2016
Sinal dessa autenticidade foi a missão a que se dedicaram, de dizer o que urgia dizer, para que a conversão de muitos garantisse a paz para todos, e da terra ao Céu. Porque toda a aparição verdadeira se prolonga em missão necessária.
É feliz e providencial que as leituras bíblicas deste Domingo nos esclareçam e confirmem nesse mesmo sentido. Na primeira, quando Isaías vai ao templo e aí “vê” o Senhor, de modo tão total que primeiro o purifica e a seguir o envia, como seu profeta. E que importante é a ordem das referências: Primeiro vê, pois é despertado para aquela presença absoluta de Deus - e especialmente ali e daquela forma. Depois, sente o abismo da sua própria imperfeição, diante da santidade divina. A seguir, é purificado e assim mesmo preparado para o envio e a missão. Nunca mais deixará de ser profeta do que lhe acontecera, para que todos reconhecessem a Deus como deviam – e a Quem se deviam, como seu povo.
E o mesmo com São Paulo, como de si falou aos coríntios e agora a nós. De Jesus nada soubera ao certo, nem gostaria de ouvir falar. Até que um dia, de facto marcante, o Ressuscitado lhe “apareceu” também a ele. A partir daí, nunca mais deixou de “trabalhar” e mais que todos, para que ninguém ficasse de fora do que lhe fora revelado: Cristo vencera a morte; e vencemo-la, também nós, no corpo e na alma, unicamente como Cristo a venceu, com a medida inteira em que nos doamos a Deus e nos doamos aos outros, num único movimento que por fim nos salva.
Assim com o profeta, assim com o apóstolo, assim também com Pedro, quando Jesus lhe mandou relançar as redes. À sua ordem, voltou à faina e pescou como nunca. Daquele encontro, nasceu-lhe a missão: «Daqui em diante serás pescador de homens». Para que do perigoso mar do mundo fossemos retirados para a vida, na grande barca da Igreja.
Isaías, Paulo, Pedro e os outros, os Pastorinhos de Fátima, nós todos aqui, com as multidões que seguiram a Mãe de Jesus na sua imagem peregrina, ao longo destas três abençoadas semanas em que percorreu a nossa diocese. Tudo é aparição prolongada em missão e estímulo do Céu para o nosso caminho sinodal, no “sonho missionário de chegar a todos”.
Mas como aos que referimos, e ainda mais que a eles, a aparição absoluta foi de Deus a Maria, que escolheu por Mãe, para vir ao mundo. E missão decidida foi também a sua, visitando Isabel para visitar a todos, oferecendo-nos Jesus, que concebeu, deu à luz e acompanhou de Belém ao Gólgota.
Depois, o Espírito Santo, que ungiu Jesus para anunciar a Boa Nova aos pobres, foi O que no Pentecostes expandiu a Igreja, que com Maria se traduz em missão permanente. Por isso mesmo, não há aparição da Mãe de Cristo, como foi a de Fátima, que não ganhe autenticidade por estas duas notas essenciais: projeção missionária e envolvimento eclesial. Como repetidamente aconteceu e como nós todos o manifestamos aqui e agora.
Aqui mesmo, nesta magnífica igreja de Santa Maria de Belém. E no agora que vivemos, com «as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens do nosso tempo, sobretudo dos pobres e de todos os aflitos, [que] são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo», como há meio século o repetimos, com o Vaticano II (Gaudium et Spes, 1). E assim mesmo o quero concluir em oração, diante da imagem peregrina da branca Senhora das mãos postas, por mim e por todos nós:
Mãe de Deus e nossa Mãe, Nossa Senhora de Fátima, Rainha de Portugal e do mundo inteiro:
Fazei-nos seguir o vosso Filho, no apelo evangélico à decidida conversão a Deus e ao serviço do próximo, sobretudo dos que mais precisam de ser acolhidos, respeitados e amparados, ao longo do percurso completo da vida de cada um. Olhai por todas as mães, para que recebam o dom dos seus filhos, desde o momento da sua conceção, contando com o apoio dos seus familiares e duma sociedade que legal e praticamente reconheça o valor da vida como o primeiro dos valores, imprescindível base de todos os demais.
Olhai pelos pais, para que os filhos contem com a complementar referência feminina e masculina, indispensável no seu todo ao crescimento humano, que essencialmente a requer.
Assim foi convosco e com o Menino que concebestes e depois destes à luz; com o Menino que criastes do presépio de Belém ao exílio do Egito e a Nazaré da Galileia. E sempre contando com a paternal figura de José, que vos aceitou por esposa e adotou Jesus, assim mesmo acompanhando os dois o seu «crescimento em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e dos homens» (cf. Lc 2, 52), verdadeiro objetivo de toda a educação.
Sabemos que não deixais de olhar por nós, atenta como estivestes ao que faltava nas bodas de Caná e indicando-nos Jesus como resposta ao que carecemos de mais definitivo e importante. Consagramo-nos por isso ao vosso amor materno, que é também o amor que Vós própria consagrais a Deus e a todos nós, por amor de Deus.
Como mãe e mestra, ensinai-nos a estar igualmente próximos das necessidades dos outros e a acompanhá-los na vida e até à morte natural, não lhes faltando nunca com os cuidados e a convivência onde o amor realmente se comprova, em especial na doença e na agonia, como Vós mesma estivestes junto à cruz do vosso Filho.
Ensinai-nos sempre e avivai-nos agora a verdade de Cristo. Hoje como então, é pela maneira como nos amarmos que todos nos reconhecerão como seus discípulos. - Assim o fostes Vós, ó Mãe de Misericórdia! Assim o seremos convosco, os que aqui estamos com gratidão e compromisso, para que a Mensagem que deixastes em Fátima realize em nós e por nós o Evangelho de Cristo!
+ Manuel, Cardeal-Patriarca
Santa Maria de Belém, na conclusão da visita da imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima ao Patriarcado de Lisboa, 7 de fevereiro de 2016
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