Cruz no Coliseu
O ponto culminante
e central da vida cristã é a Páscoa, que será vivida dolorosamente neste
ano sem a presença dos fiéis em muitos países do mundo, mas que
continua a vir à procura do coração humano.
Debora Donnini, Silvonei José - Cidade do Vaticano
É na Missa da Epifania, no dia 6 de janeiro, que se anuncia a data do
Domingo de Páscoa, o ápice do Tríduo da Paixão, Morte e Ressurreição do
Senhor, e o centro de todo o ano litúrgico. É precisamente a partir da
Páscoa que surgem os dias santos. Nos ritmos e acontecimentos do tempo -
recorda este anúncio -, vivemos os mistérios da salvação. A Páscoa é,
portanto, a festa mais importante, como o próprio Papa Francisco
salientou na sua audiência geral em 2018 durante a Semana Santa,
exortando todos os cristãos a viverem estes dias como "a matriz" da sua
vida pessoal e comunitária. Uma festa que tem as suas raízes na Páscoa
judaica, que comemora a passagem da escravidão do Egito para a
liberdade, realizada por Deus com o povo de Israel.
O Tríduo Pascal, que começa com a Missa in Coena Domini na
tarde da Quinta-feira Santa, termina com as Vésperas do domingo e pode,
portanto, ser vivido como um único caminho que culmina na Noite das
Noites, a noite em que Cristo destruiu a morte e dos mortos ressuscita
vitorioso: a noite que, entre sábado e domingo, conheceu a hora em que o
Senhor ressuscitou, como recorda o Exultet, o precônio Pascal, cantado
precisamente na liturgia da Vigília Pascal.
O Tríduo deste ano será certamente diferente. Com tristeza em muitos
países, os fiéis não poderão participar nas liturgias, mas mesmo nas
provações e sofrimentos deste 2020, este Tríduo vem "procurar" a vida do
homem. A "liturgia doméstica" nos dias do Tríduo Pascal será composta
por dois gestos: olhar o Crucifixo e ler o Evangelho, recordou o Papa na
audiência geral da Quarta-feira Santa.
A Última Ceia
Na Missa in Coena Domini recordamos a Última Ceia de Jesus com
os apóstolos, "antecipando no banquete pascal o seu sacrifício no
Gólgota", e a instituição da Eucaristia, recordou o Papa Francisco na
sua catequese da quarta-feira da Semana Santa de 2016, no auge do
Jubileu da Misericórdia, sublinhando também que "para fazer compreender
aos discípulos o amor que o anima, lavar-lhes os pés, oferecendo uma vez
mais o exemplo em primeira pessoa de como eles devem agir". E isso com
um forte apelo ao serviço. Este ano, o gesto de lavar os pés, já
facultativo, é omitido, como estabelecido pelo decreto da Congregação
para o Culto Divino, que deu orientações para os países afetados pela
pandemia, onde bispos e sacerdotes celebrarão sem a participação do
povo.
A Cruz
A Sexta-feira Santa comemora a morte de Jesus. O amor, doado até ao
fim, se abandona ao Pai. Nas igrejas de todo o mundo não há celebração
eucarística, mas uma "ação litúrgica". Por isso, é central neste dia a
celebração da Paixão do Senhor com a adoração da Cruz, mesmo se este ano
o beijo se limite apenas ao celebrante. Também as demais liturgias do
Tríduo serão celebradas sem a presença dos fiéis. Precisamente para
responder às perguntas sobre a presença de Deus neste momento difícil, o
Papa quis recordar que Deus se revelou completamente na cruz, que é "a
cátedra de Deus". Na audiência de quarta-feira, 8 de abril, dedicada ao
Tríduo, exortou-nos a estarmos diante do Crucifixo em silêncio, para ver
que o nosso Senhor não aponta o dedo nem mesmo diante daqueles que o
crucificam, mas abre os braços a todos, dando a sua vida e tomando sobre
si os nossos pecados. Um dos momentos centrais da celebração da Paixão é
a oração universal e este ano foi pedida uma intenção especial por
aqueles que se encontram numa situação de desânimo, pelos doentes e
pelos defuntos. Também este ano, a Via Sacra, tradicionalmente presidida
pelo Papa no Coliseu, será realizada na Praça de São Pedro.
Tanto na Quinta-feira Santa como na Sexta-feira Santa, as liturgias
se concluem em silêncio porque a bênção final e a despedida serão na
Vigília. Foi Pio XII quem retomou a Vigília Pascal, dando vida a uma
reforma que prosseguiria até ser completada com o Concílio Vaticano II.
A Noite das Noites
O Sábado Santo é o dia do grande silêncio até à Vigília Pascal, a
hora da Mãe, que espera em silêncio, com o seu coração trespassado pela
dor de ter visto o seu Filho flagelado e pregado na cruz. Um silêncio
que será interrompido pela "Mãe de todas as vigílias", como Santo
Agostinho a chamava.
Com a liturgia do fogo, o acendimento do círio pascal marca o início
dessa noite das noites em que se celebra o Cristo Ressuscitado, o centro
e o fim do cosmos e da história, a noite em que o Aleluia rompe o
silêncio da morte e em que as leituras da Liturgia repercorrem a
história da salvação desde a criação, não numa concepção cíclica da
história, como memória de algo que aconteceu no passado, mas como um
evento que todos são chamados a viver entrando na dinâmica dessa
passagem da morte para a vida. Uma passagem, já, agora, da escravidão do
pecado, da dor e da frustração. Mas também se faz presente, nesta
noite, que a nossa vida não termina diante da pedra de um túmulo, porque
Cristo desse túmulo ressuscitou. Uma liturgia, a da Vigília Pascal,
composta por quatro partes, a liturgia do fogo, da Palavra, dos Batismos
e a Eucaristia. Este ano, devido à emergência do Coronavírus, na
liturgia batismal apenas se mantém a renovação das promessas batismais.
Com o Domingo de Páscoa tem início o tempo pascal que dura até
Pentecostes e que está profundamente unido ao Tríduo pascal. Os
primeiros oito dias são a Oitava de Páscoa. Estes 50 dias do período
pascal tornam visível esta alegria da Ressurreição, que se faz
testemunho. Estes são os dias da alegria, da alegria que só se sente
quando se tem a promessa e a certeza de que a última palavra não é a
morte e que aquela círio, mesmo na escuridão desta pandemia que envolve o
mundo, continua a iluminar.
VN
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