10 junho, 2016

Abertura do IV Congresso Eucarístico Nacional, em Fátima

Caríssimos participantes neste IV Congresso Eucarístico Nacional:

Saúdo-vos vivamente, como quem se integra “de alma e coração” numa grande assembleia de reflexão e prece, tão próximos já do centenário das Aparições.
Pois disso mesmo se trata, reflexão e prece, não podendo ser doutro modo quando o assunto é Fátima. Passaram-se aqui acontecimentos de tal densidade que, podendo e devendo ser pensados, têm muito mais de ser rezados, como quem respira no céu o que na terra não cabe.
E esta é a primeira lição, a de que as coisas mais altas se dão às mais humildes, como a própria Mãe de Cristo a três simplicíssimas crianças dum lugar tão recôndito. É a primeira marca evangélica de Fátima e já também da Mensagem que aqui foi entregue.
Mensagem que este Congresso enuncia como “Viver a Eucaristia, fonte de misericórdia”. E está muito bem, porque Fátima, Eucaristia e Misericórdia se requerem mutuamente, das aparições do Anjo ao que depois se cumpriu e continua a cumprir.Em 1983, Lúcia obedeceu de novo, como ela própria esclarece: «era preciso escrever pormenorizadamente tudo o que se refere à Mensagem e como a vejo agora, através do tempo que passou e dos acontecimentos» (Irmã Lúcia, Como vejo a Mensagem através dos tempos e dos acontecimentos, Carmelo de Coimbra, 2006, p. 10).
Considero este opúsculo de seis dezenas de páginas uma preciosa – para não dizer definitiva – contribuição para captarmos o que se passou, tanto aqui, como espaço e tempo, como na própria Irmã Lúcia, relendo e redizendo o que lhe acontecera tanto tempo atrás. Na verdade, só assim saberemos o significado das coisas. Das coisas humanas, quanto mais das divinas. Como se disséssemos que, somando as primeiras respostas dos Pastorinhos, o inquérito diocesano, as Memórias dos anos trinta a quarenta e o que mais se juntou da sua parte, o resultado último, essencial e significante, andará por aqui.
- E que resultado é esse, no que ao tema deste Congresso respeita? Tratando-se de breves palavras de saudação e abertura, fico-me por um só apontamento:
Referindo a terceira aparição do Anjo, Lúcia transcreve a conhecida oração: «Santíssima Trindade, Padre, Filho e Espírito Santo, adoro-Vos profundamente e ofereço-Vos o preciosíssimo Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Jesus Cristo…». E continua: «Em seguida o Anjo ergue-se e toma de novo a Hóstia e o Cálice – que trazia e havia deixado suspenso no ar – e dá a Comunhão aos três pastorinhos, dizendo ao mesmo tempo: “Tomai e bebei o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo horrivelmente ultrajado pelos homens ingratos. Reparai os seus crimes e consolai o vosso Deus”». Para concluir, numa meditação que já ia em sete décadas: «Que significado tem esta Comunhão? Para mim, significa o querer Deus avivar a nossa fé na presença real de Jesus Cristo presente na Divina Eucaristia, e na eficácia da Sua palavra quando disse: “Isto é o Meu Corpo, isto é o Meu Sangue.” E para que, identificados com Cristo pudéssemos oferecer à Santíssima Trindade uma reparação mais digna e agradável a Seus olhos. Assim aquelas pequeninas Hóstias [os próprios Pastorinhos], consagradas com Cristo, sobre o altar do sacrifício, terão sido oferecidas ao Pai, como oferta de eterno louvor» (ibidem, p. 23-24).
Como quem nos diz que em Fátima os Pastorinhos foram convidados a uma participação eucarística total, pois, recebendo a Cristo, compartilharam também a sua misericórdia, para reparar uma humanidade tão afastada de Deus como de si própria, no que deve ser. Reparar a Deus e reparando pelos outros, numa existência entregue e devolvida.
Isso mesmo lhes pediria depois a Senhora: «Quereis oferecer-vos a Deus para suportar todos os sofrimentos que Ele quiser enviar-vos em ato de reparação pelos pecados com que Ele é ofendido e de súplica pela conversão dos pecadores?» Ao que os Pastorinhos responderam: «Sim, queremos». E Lúcia conclui: «A Senhora acolheu esta resposta como a primícia da sua Mensagem, e com um gesto de maternal proteção envolvendo-nos na imensa luz de Deus, respondeu: “Ides, pois, ter muito que sofrer, mas a graça de Deus será o vosso conforto”» (Ibidem, p. 36-37). Dito doutro modo, falou-lhes de vida pascal e eucarística, que se ganha no dom de si, a Deus e pelos outros.
Creio que só compreenderemos bem a Mensagem de Fátima quando nos colocarmos inteiramente do lado da misericórdia divina, com Maria e os Pastorinhos. Dando a vida por quem a perde, como Cristo “por nós e por todos, para remissão dos pecados”. Octogenária já, Lúcia revivia: «Graça esta que, que nos introduziu no imenso mar da luz de Deus, e aí nos levou a adorá-Lo no mistério da Santíssima Trindade e a amá-Lo presente na Divina Eucaristia, dizendo interiormente no silêncio do nosso coração: Ó Santíssima Trindade, eu Vos adoro. Meu Deus, meu Deus, eu amo-Vos presente no Santíssimo Sacramento da Eucaristia. Esta Mensagem foi, para mim a revelação do mistério de Deus presente em mim, e eu sempre presente em Deus, onde devo adorá-Lo, amá-Lo e servi-Lo com fé, esperança e amor» (ibidem, p. 37).
Fátima, Eucaristia e Misericórdia: três palavras a resumir uma Mensagem tão urgente agora como o foi há um século. Ajudem-nos os Pastorinhos a compreendê-la e vivê-la como eles o fizeram e com tanto fruto, então e depois. Como estamos aqui e sempre aprenderemos.

+ Manuel Clemente

Patriarcado de Lisboa 

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