26 junho, 2016

O Papa e Kerekin II assinam Declaração Comum: unidade e paz


(RV) Na Declaração os dois chefes religiosos sublinham a necessidade de caminhar juntos com vista no melhoramento das relações entre as duas Igrejas. Alargam também o olhar a toda a humanidade, esperançosos de que a fé comum em Cristo os ajudará a contribuir para um mundo melhor.

São quatro páginas de agradável leitura e reflexão e em que Francisco e Kerekin II começam por dar graças a Deus pela “crescente proximidade na fé e no amor entre a Igreja Apostólica Arménia e a Igreja Católica no seu testemunho comum da mensagem do Evangelho da salvação do mundo dilacerado por conflitos e desejoso de conforto e esperança”.

Recordam, depois, os grandes momentos nesta senda: a visita de João Paulo II à Arménia em 2001 por ocasião dos 1700 anos da proclamação do cristianismo como religião do país, e a solene liturgia na Basílica de São Pedro em Roma no dia 12 de Abril de 2015, onde as duas Igrejas se empenharam a  continuar na linha expressa pela precedente Declaração conjunta de 2001 assinada pelo Papa João Paulo II e pelo Catholicos, ou seja: opor-se “a toda a forma de discriminação e violência” e comemorar as vítimas daquilo que essa Declaração assinalara como “o extermínio de um milhão e meio de cristãos arménios, naquele que geralmente é referido como o primeiro genocídio do século XX”.

Satisfeitos por a fé cristã ter voltado a vibrar na Arménia, Francisco e Kerekin II chamam, todavia, a atenção para a tragédia imensa dos nossos dias de contínuos conflitos de vária natureza no mundo inteiro, e de modo particular no Médio Oriente, com a consequência de minorias étnicas e religiosas voltarem a ser alvo de perseguição diária. Mártires pertencentes a todas as Igrejas e cujo sofrimento é um “ecumenismo de sague” que transcende as divisões históricas entre os cristãos, convidando, assim, a promover a unidade. 

Empenhando-se nesta linha, os dois líderes religiosos imploram também os líderes das nações “a ouvir o apelo de milhões de seres humanos que anseiam pela paz e a justiça no mundo, que pedem respeito pelos direitos dados por Deus, que têm necessidade de pão, não de armas”.

Denunciam igualmente o uso fundamentalista da religião e dos valores religiosos para “justificar a difusão do ódio, discriminação e violência”. Isto – frisam – “é inaceitável”, porque “Deus não um Deus de desordem, mas de paz”. E o respeito pelas diferenças religiosas é condição necessária para a convivência pacífica”.  Como cristãos somos chamados a procurar e a implementar caminhos para a reconciliação e a paz – sublinham, manifestando a esperança de uma “resolução pacífica das questões em torno do Nagorno-Karabakh”. 

No espírito cristão de acolhimento e ajuda, pedem aos fiéis de ambas as Igreja para abrirem os corações e as mãos às vítimas da guerra e do terrorismo, aos refugiados e suas famílias. Reconhecendo o que está a ser feito, sublinham, contudo, que é preciso que os líderes políticos e a comunidade internacional façam muito mais para garantir o direito de todos a viver em paz e na segurança.
Outro aspecto que preocupa tanto o Papa Francisco como o Catholicos Karekin II é a crise da família em muitos países. Declaram ter a mesma visão da família fundada no matrimónio entre um homem e uma mulher.

A Declaração conjunta hoje assinada pelo Papa e Kerekin II faz ainda notar, com prazer, que “apesar das divisões que subsistem entre os cristãos” há uma mais clara percepção de que o que os “une é muito mais” do que aquilo que os “divide”. 

Na linha das palavras evangélicas “que todos sejam um”, é enaltecida “a nova fase” que se tem vindo a criar entre a Igreja Apostólica Arménia e a Igreja Católica, graças às orações e aos esforços comuns no sentido de ultrapassar os desafios contemporâneos. E mostram-se convictos da “importância crucial de avançar nesta relação, promovendo uma colaboração mais profunda e decisiva, não só na área da teologia, mas também na oração e na cooperação activa a nível das comunicadas locais, com o objectivo de compartilhar a comunhão plena e expressões concretas de unidade”.

Com esta convicção e clarividência Francisco e Kerekin II exortam os seus “fiéis a trabalhar harmoniosamente pela promoção na sociedade dos valores cristãos que contribuam efectivamente  para construir uma civilização de justiça, paz e solidariedade humana”

(DA) 

A seguir a Declaração na íntegra 

VISITA APOSTÓLICA DO SANTO PADRE À ARMÉNIA

DECLARAÇÃO COMUM

DE SUA SANTIDADE FRANCISCO

E DE SUA SANTIDADE KAREKIN II

NA SANTA ETCHMIADZIN, REPÚBLICA DA ARMÉNIA


Hoje na Santa Etchmiadzin, centro espiritual de Todos os Arménios, nós, o Papa Francisco e o Catholicos de Todos os Arménios Karekin II, elevamos as nossas mentes e corações em ação de graças ao Todo-Poderoso pela progressiva e crescente proximidade na fé e no amor entre a Igreja Apostólica Arménia e a Igreja Católica no seu testemunho comum à mensagem do Evangelho da salvação num mundo dilacerado por conflitos e desejoso de conforto e esperança. Louvamos a Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, por ter permitido que nos reunamos na terra bíblica de Ararat, que permanece como uma memória de que Deus será para sempre a nossa proteção e salvação. Grande prazer espiritual nos dá lembrar que, em 2001, por ocasião dos 1700 anos da proclamação do cristianismo como religião da Arménia, São João Paulo II visitou a Arménia e foi testemunha duma nova página nas relações calorosas e fraternas entre a Igreja Arménia Apostólica e a Igreja Católica. Estamos gratos pela graça que tivemos de estar juntos numa solene liturgia na Basílica de São Pedro em Roma no dia 12 de abril de 2015, onde empenhamos a nossa vontade de nos opor a toda a forma de discriminação e violência, e comemoramos as vítimas daquele que a Declaração Comum de Sua Santidade João Paulo II e Sua Santidade Karekin II assinala como «o extermínio de um milhão e meio de cristãos arménios, naquele que geralmente é referido como o primeiro genocídio do século XX» (27 de Setembro de 2001).

Louvamos ao Senhor por a fé cristã ser, hoje, novamente uma realidade vibrante na Arménia e por a Igreja Arménia exercer a sua missão com espírito de colaboração fraterna entre as Igrejas, sustentando os fiéis na construção dum mundo de solidariedade, justiça e paz.

Infelizmente, porém, estamos a ser testemunhas duma tragédia imensa que se desenrola diante dos nossos olhos: inúmeras pessoas inocentes que são mortas, deslocadas ou forçadas a um exílio doloroso e incerto devido a contínuos conflitos por motivos étnicos, económicos, políticos e religiosos no Médio Oriente e noutras partes do mundo. Em consequência, minorias religiosas e étnicas tornaram-se alvo de perseguição e tratamento cruel, a ponto de o sofrimento por uma crença religiosa se tornar uma realidade diária. Os mártires pertencem a todas as Igrejas e o seu sofrimento é um «ecumenismo de sangue» que transcende as divisões históricas entre os cristãos, convidando-nos a todos a promover a unidade visível dos discípulos de Cristo. Juntos rezamos, por intercessão dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, Tadeu e Bartolomeu, por uma mudança de coração em todos aqueles que cometem tais crimes e naqueles que estão em posição de acabar com a violência. Imploramos aos líderes das nações que ouçam o apelo de milhões de seres humanos que anseiam pela paz e a justiça no mundo, que pedem respeito pelos seus direitos dados por Deus, que têm necessidade urgente de pão, não de armas. Infelizmente, estamos a ser testemunhas duma apresentação fundamentalista da religião e dos valores religiosos, usando tal forma para justificar a difusão de ódio, discriminação e violência. A justificação de tais crimes com base em conceções religiosas é inaceitável, porque «Deus não é um Deus de desordem, mas de paz» (I Coríntios 14, 33). Além disso, o respeito pelas diferenças religiosas é condição necessária para a convivência pacífica de diferentes comunidades étnicas e religiosas. Precisamente por sermos cristãos, somos chamados a buscar e implementar caminhos para a reconciliação e a paz. A propósito, expressamos também a nossa esperança duma resolução pacífica das questões em torno de Nagorno-Karabakh.

Conscientes do que Jesus ensinou aos seus discípulos, quando disse: «Tive fome e destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber, era peregrino e recolhestes-me, estava nu e destes-me que vestir, adoeci e visitastes-me, estive na prisão e fostes ter comigo» (Mateus 25, 35-36), pedimos aos fiéis das nossas Igrejas que abram os seus corações e mãos às vítimas da guerra e do terrorismo, aos refugiados e suas famílias. Em causa está o próprio sentido da nossa humanidade, da nossa solidariedade, compaixão e generosidade, que só pode ser devidamente expresso numa imediata partilha prática de recursos. Reconhecemos tudo o que já se está a fazer, mas insistimos que é necessário muito mais, por parte dos líderes políticos e da comunidade internacional, em ordem a garantir o direito de todos a viver em paz e segurança, para defender o estado de direito, proteger as minorias religiosas e étnicas, combater o tráfico de seres humanos e o contrabando.

A secularização de amplos setores da sociedade, a sua alienação das ligações espirituais e divinas leva inevitavelmente a uma visão dessacralizada e materialista do homem e da família humana. A este respeito, estamos preocupados com a crise da família em muitos países. A Igreja Apostólica Arménia e a Igreja Católica compartilham a mesma visão da família, fundada no matrimónio como ato de livre doação e de amor fiel entre um homem e uma mulher.

Temos o prazer de confirmar que, apesar das divisões que subsistem entre os cristãos, percebemos mais claramente que aquilo que nos une é muito mais do que aquilo que nos divide. Esta é a base sólida sobre a qual será manifestada a unidade da Igreja de Cristo, de acordo com as palavras do Senhor: «que todos sejam um só» (João 17, 21). Na últimas décadas, a relação entre a Igreja Apostólica Arménia e a Igreja Católica entrou com êxito numa nova fase, fortalecida pelas nossas orações comuns e mútuos esforços a fim de superar os desafios contemporâneos. Hoje estamos convencidos da importância crucial de avançar nesta relação, promovendo uma colaboração mais profunda e decisiva, não somente na área da teologia, mas também na oração e na cooperação activa no nível das comunidades locais, com o objetivo de compartilhar a comunhão plena e expressões concretas de unidade. Exortamos os nossos fiéis a trabalhar harmoniosamente pela promoção na sociedade dos valores cristãos que contribuam efetivamente para construir uma civilização de justiça, paz e solidariedade humana. Diante de nós está a senda da reconciliação e da fraternidade. Possa o Espírito Santo, que nos guia para a verdade completa (cf. João 16, 13), sustentar todo o esforço genuíno por construir pontes de amor e comunhão entre nós.

Da Santa Etchmiadzin, apelamos a todos os nossos fiéis para se juntarem a nós nesta oração feita com as palavras de São Nerses o Gracioso: «Glorioso Senhor, aceitai as súplicas dos vossos servos e, graciosamente, atendei os nossos pedidos, pela intercessão da Santa Mãe de Deus, João Batista, o primeiro mártir Santo Estêvão, São Gregório nosso Iluminador, os Santos Apóstolos, Profetas, Teólogos, Mártires, Patriarcas, Eremitas, Virgens e todos os vossos Santos no céu e na terra. E a Vós, Santa e Indivisível Trindade, seja glória e adoração por todo o sempre. Ámen».

Santa Etchmiadzin, 26 de junho de 2016.


Sua Santidade Francisco                                  Sua Santidade Karekin II

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