(RV) No
final da visita de cortesia do Papa Francisco ao Papa Copto-Ortodoxo,
Tawadros II, ambos assinaram uma Declaração conjunta que marca uma nova
etapa na aproximação entre a Igreja copto-ortodoxa e a Igreja católica.
Um dos pontos principais desta Declaração é o reconhecimento mútuo do
Baptismo. As duas Igrejas renunciam oficialmente à possibilidade de um
segundo baptismo em caso de um católico se tornar ortodoxo, ou
vice-versa.
Eis o texto integral da Declaração:
DECLARAÇÃO COMUM
DE SUA SANTIDADE FRANCISCO
E DE SUA SANTIDADE TAWADROS II
(Cairo: Patriarcado, 28 de abril de 2017)
(Cairo: Patriarcado, 28 de abril de 2017)
1. Nós, Francisco, Bispo de Roma e Papa da Igreja Católica, e
Tawadros II, Papa de Alexandria e Patriarca da Sé de São Marcos, no
Espírito Santo damos graças a Deus por nos ter concedido a feliz
oportunidade de nos encontrarmos mais uma vez, trocarmos o abraço
fraterno e juntarmo-nos novamente em oração comum. Damos glória ao
Todo-Poderoso pelos laços de fraternidade e amizade existentes entre a
Sé de São Pedro e a Sé de São Marcos. O privilégio de estar juntos aqui
no Egito é um sinal de que a solidez do nosso relacionamento tem
aumentado de ano para ano e de que estamos a crescer na proximidade, na
fé e no amor de Cristo nosso Senhor. Damos graças a Deus pelo amado
Egito, «terra natal que vive dentro de nós», como costumava dizer Sua
Santidade Papa Shenouda III, «povo abençoado pelo Senhor» (cf. Is 19,
25) com a sua antiga civilização dos Faraós, a herança grega e romana, a
tradição copta e a presença islâmica. O Egito é o lugar onde a Sagrada
Família encontrou refúgio, é terra de mártires e santos.
2. O nosso vínculo profundo de amizade e fraternidade tem a
sua origem na plena comunhão que existia entre as nossas Igrejas nos
primeiros séculos tendo-se expressado de várias maneiras nos primeiros
Concílios Ecuménicos, a começar pelo Concílio de Nicéia em 325 e a
contribuição de Santo Atanásio, corajoso Padre da Igreja que mereceu o
título de «Protetor da Fé». A nossa comunhão manifestava-se através da
oração e práticas litúrgicas semelhantes, da veneração dos mesmos
mártires e santos, e no fomento e difusão do monaquismo, seguindo o
exemplo do grande Santo Antão, conhecido como o pai de todos os monges.
Esta experiência comum de comunhão, anterior ao tempo de separação,
assume um significado especial na nossa busca atual do restabelecimento
da plena comunhão. A maior parte das relações que existiam nos primeiros
séculos continuaram, apesar das divisões, entre a Igreja Católica e a
Igreja Copta Ortodoxa até ao dia de hoje e recentemente foram mesmo
revitalizadas. Estas desafiam-nos a intensificar os nossos esforços
comuns, perseverando na busca duma unidade visível na diversidade, sob a
guia do Espírito Santo.
3. Recordamos, com gratidão, o encontro histórico de há
quarenta e quatro anos entre os nossos predecessores Papa Paulo VI e
Papa Shenouda III, aquele abraço de paz e fraternidade depois de muitos
séculos em que os nossos vínculos mútuos de amor não tiveram
possibilidade de se expressar devido à distância que se criara entre
nós. A Declaração Comum, que eles assinaram em 10 de maio de 1973,
representou um marco no caminho ecuménico e serviu como ponto de partida
para a instituição da Comissão de Diálogo Teológico entre as nossas
duas Igrejas, que produziu muito fruto e abriu o caminho para um diálogo
mais amplo entre a Igreja Católica e toda a família das Igrejas
Ortodoxas Orientais. Naquela Declaração, as nossas Igrejas reconheceram
que, no sulco da tradição apostólica, professam «uma só fé no Deus Uno e
Trino» e «a divindade do Unigénito Filho de Deus (...) perfeito Deus,
quanto à sua divindade, e perfeito homem quanto à sua humanidade».
Reconheceu-se também que «a vida divina é-nos dada e alimentada em nós
pelos sete sacramentos» e que «veneramos a Virgem Maria, Mãe da
verdadeira Luz», a «Theotókos».
4. Com profunda gratidão, recordamos o encontro fraterno que
nós próprios tivemos em Roma, a 10 de maio de 2013, e a instituição do
dia 10 de maio como jornada anual em que aprofundamos a amizade e a
fraternidade entre as nossas Igrejas. Este renovado espírito de
proximidade permitiu-nos discernir ainda melhor como o vínculo que nos
une foi recebido de nosso único Senhor no dia do Batismo. Com efeito, é
através do Batismo que nos tornamos membros do único Corpo de Cristo que
é a Igreja (cf. 1 Cor 12, 13). Esta herança comum é a base da
peregrinação que juntos realizamos rumo à plena comunhão, crescendo no
amor e na reconciliação.
5. Conscientes de que ainda há tanto caminho a fazer nesta
peregrinação, recordamos o muito que já foi alcançado. Em particular,
lembramos o encontro entre Papa Shenouda III e São João Paulo II, que
veio como peregrino ao Egito durante o Grande Jubileu do ano 2000.
Estamos determinados a seguir os seus passos, movidos pelo amor de
Cristo Bom Pastor, na convicção profunda de que, caminhando juntos,
crescemos em unidade. Para isso auferimos a força de Deus, fonte
perfeita de comunhão e de amor.
6. Este amor encontra a sua expressão mais alta na oração
comum. Quando os cristãos rezam juntos, chegam a compreender que aquilo
que os une é muito maior do que aquilo que os divide. O nosso desejo
ardente de unidade encontra inspiração na oração de Cristo «para que
todos sejam um só» (Jo 17, 21). Para isso aprofundemos as raízes que
compartilhamos na única fé apostólica, rezando juntos e procurando
traduções comuns do Pai Nosso e uma data comum para a celebração da
Páscoa.
7. Enquanto caminhamos para o dia abençoado em que finalmente
nos reuniremos à mesma Mesa Eucarística, podemos colaborar em muitas
áreas e tornar tangível a grande riqueza que já temos em comum. Podemos
testemunhar juntos certos valores fundamentais como a sacralidade e
dignidade da vida humana, a sacralidade do matrimónio e da família, e o
respeito por toda a criação, que Deus nos confiou. Não obstante a
multiplicidade de desafios contemporâneos, como a secularização e a
globalização da indiferença, somos chamados a oferecer uma resposta
compartilhada baseada nos valores do Evangelho e nos tesouros das nossas
respetivas tradições. Nesta linha, somos encorajados a aprofundar o
estudo dos Padres Orientais e Latinos e promover um frutuoso intercâmbio
na vida pastoral, especialmente na catequese e num mútuo enriquecimento
espiritual entre comunidades monásticas e religiosas.
8. O testemunho cristão que compartilhamos é um sinal
providencial de reconciliação e esperança para a sociedade egípcia e
suas instituições, uma semente semeada para frutificar na justiça e na
paz. Uma vez que acreditamos que todos os seres humanos são criados à
imagem de Deus, esforcemo-nos por promover a tranquilidade e a concórdia
através duma coexistência pacífica entre cristãos e muçulmanos,
testemunhando assim que Deus deseja a unidade e a harmonia de toda a
família humana e a igual dignidade de cada ser humano. Temos a peito a
prosperidade e o futuro do Egito. Todos os membros da sociedade têm o
direito e o dever de participar plenamente na vida do país, gozando de
plena e igual cidadania e colaborando para construir a sua nação. A
liberdade religiosa, que engloba a liberdade de consciência e está
enraizada na dignidade da pessoa, é a pedra angular de todas as outras
liberdades. É um direito sagrado e inalienável.
9. Intensifiquemos a nossa oração incessante por todos os
cristãos no Egito e em todo o mundo, especialmente no Médio Oriente.
Alguns acontecimentos trágicos e o sangue derramado pelos nossos fiéis,
perseguidos e mortos unicamente pelo motivo de ser cristãos,
recordam-nos ainda mais que o ecumenismo dos mártires nos une e encoraja
no caminho da paz e da reconciliação. Pois, como escreve São Paulo, «se
um membro sofre, com ele sofrem todos os membros» (1 Cor 12, 26).
10. O mistério de Jesus, que morreu e ressuscitou por amor,
situa-se no coração do nosso caminho para a plena unidade. Mais uma vez,
os mártires são os nossos guias. Na Igreja primitiva, o sangue dos
mártires foi semente de novos cristãos; assim também, em nossos dias, o
sangue de tantos mártires seja semente de unidade entre todos os
discípulos de Cristo, sinal e instrumento de comunhão e de paz para o
mundo.
11. Obedientes à ação do Espírito Santo, que santifica a
Igreja, a sustenta ao longo dos séculos e conduz àquela unidade plena
pela qual Cristo rezou,
hoje nós, Papa Francisco e Papa Tawadros II, para alegrar o coração
do Senhor Jesus bem como os corações dos nossos filhos e filhas na fé,
declaramos mutuamente que, com uma só mente e coração, procuraremos
sinceramente não repetir o Batismo administrado numa das nossas Igrejas a
alguém que deseje juntar-se à outra. Isto confessamos em obediência às
Sagradas Escrituras e à fé expressa nos três Concílios Ecuménicos
reunidos em Niceia, Constantinopla e Éfeso.
Pedimos a Deus nosso Pai que nos guie, nos tempos e modos que o
Espírito Santo dispuser, para a unidade plena no Corpo místico de
Cristo.
12. Concluindo, deixemo-nos guiar pelos ensinamentos e o
exemplo do apóstolo Paulo, que escreve: «[Esforçai-vos] por manter a
unidade do Espírito, mediante o vínculo da paz. Há um só corpo e um só
Espírito, assim como a vossa vocação vos chamou a uma só esperança; um
só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, que
reina sobre todos, age por todos e permanece em todos» (Ef 4, 3-6).
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