(RV) No âmbito da urgência do diálogo inter-religioso, em especial entre cristãos e muçulmanos, reproduzimos o artigo “O antídoto mais eficaz. No magistério papal, a urgência do diálogo entre cristãos e muçulmanos”, escrito pelo Presidente do Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso, Cardeal Jean Louis Tauran, e publicado no L’Osservatore Romano.
“Eu estava na França no dia em que o Padre Jacques Hamel foi
barbaramente assassinado durante a celebração eucarística na sua
paróquia na Normandia.
Durante dois dias a França afundou na consternação: os meios de
comunicação social informavam sem cessar, e os analistas recordavam a
necessidade do diálogo entre pessoas de crenças diferentes.
A celebração do funeral viu todo o país, inclusive as autoridades
políticas, reunido na partilha da dor da família, da paróquia e da
diocese.
Tive a impressão de que os franceses se recordassem de que a sua
cultura tem raízes na mensagem cristã. O comentário na boca de todos
era: On ne tue pas un curé!
Alguns não hesitaram em dizer que as religiões são agentes de paz.
Tudo isto é relevante para hoje e para o futuro. Obviamente, estes fatos
criminosos ameaçam a credibilidade do diálogo inter-religioso, mas
devemos continuar a encontrar-nos, a falar, a trabalhar juntos quando
for possível, para que o ódio não prevaleça.
Muitas vezes dou-me conta de que muitos problemas se devem à
ignorância de um lado e de outro. E a ignorância gera o medo. Para viver
juntos é necessário olhar para quem é diverso de nós com estima,
curiosidade benévola e desejo de caminhar lado a lado.
Dificuldades, desilusões, tragédias de ontem e de hoje devem ser
meditadas como lições providenciais, das quais cabe aos homens tirar a
sabedoria necessária para abrir novas vias mais racionais e corajosas.
Tornou-se urgente aprofundar o conteúdo das nossas religiões com uma
catequese minuciosa e nós, católicos, em relação a isso, somos
privilegiados porque podemos inspirar-nos no magistério do Papa Bento
XVI, o qual, mais do que os outros Pontífices, falou sobre a necessidade
do diálogo islâmico-cristão.
Com frequência dizemos que o diálogo religioso corre o risco de
acabar no sincretismo. Eu penso o contrário. Aliás, diria que o diálogo
inter-religioso é o antídoto mais eficaz para contrastar o relativismo.
De fato, a primeira coisa que se faz no diálogo é professar a própria fé. Não se pode basear o diálogo na ambiguidade.
Portanto, parece-me que um evento como o de 26 de julho de 2016 nos
estimula a aprofundar a nossa vida espiritual e a nutri-la com a oração e
o estudo.
Faz sempre bem recordar o que João Paulo II afirmou em Kaduna, na
Nigéria, no dia 14 de fevereiro de 1982: « Todos nós, cristãos e
muçulmanos, vivemos na terra sob o sol do único Deus misericordioso. […]
e defendemos a dignidade do homem. Adoramos a Deus e professamos-lhe
submissão. [...] Cristianismo e islamismo têm muitas coisas em comum: o
privilégio da oração, o dever de justiça acompanhado da compaixão e
caridade, e sobretudo um sagrado respeito pela dignidade do homem, que
está na base dos direitos fundamentais de cada ser humano, inclusive o
direito à vida da criança nascitura».
Por conseguinte, podemos aliás devemos trabalhar juntos e promover a
educação religiosa, dado que alguns elementos das sociedades procuram
fazer esquecer ou até destruir o aspeto espiritual da vida do homem.
Assassinando o Padre Jacques, quem concebeu este ato ignóbil tinha
uma finalidade bem precisa: demonstrar que não é possível a convivência
entre muçulmanos e cristãos. Nós demonstramos e acreditamos que, pelo
contrário, devemos unir as nossas forças em nome de Deus para agir
juntos pela harmonia e a unidade num espírito de sinceridade e de
confiança recíproca.
Por sua vez, o Papa Francisco oferece sinais contínuos de que a
coexistência fraterna não só é possível, mas conveniente e frutuosa. Por
ocasião da peregrinação à Terra Santa, por exemplo, o Papa não hesitou
em afirmar diante do Grão Mufti de Jerusalém, a 26 de maio de 2014:
«Nesta nossa peregrinação terrena, não estamos sozinhos: cruzamos o
caminho de outros fiéis, às vezes partilhamos com eles um pedaço de
estrada, outras vezes vivemos juntos uma pausa que nos revigora. [...]
Vivemos uma comunicação e um intercâmbio fraternos que podem
revigorar-nos e dar-nos novas forças para enfrentar os desafios comuns
que se nos apresentam pela frente»”.
Jean-Louis Tauran
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