(RV) O Papa Francisco recebeu hoje em audiência na
Sala Clementina, os novos bispos, recém-ordenados, que estavam a seguir
um curso organizado pela Congregação para os Bispos e pela Congregação
para as Igrejas Orientais. Um curso para melhor compreender o mistério
do Episcopado mediante uma das suas tarefas principais: oferecer ao
próprio rebanho aquele discernimento espiritual e pastoral necessário
para que chegue ao conhecimento e à realização da vontade de Deus, no
qual reside toda e qualquer plenitude.
O Papa reflectiu depois detalhadamente com os novos bispos sobre o
facto de estarmos a viver num tempo marcado pela auto-referencialidade,
segundo o qual o papel dos mestres já terminou quando, paradoxalmente,
na solidão, o homem concreto continua a gritar a necessidade de ser
ajudado a enfrentar questões dramáticas que o afligem.
E é precisamente mediante o autêntico discernimento que se pode
responder a esta necessidade humana – disse o Papa citando São Paulo e
São Tomás de Aquino.
Francisco recomendou-lhes depois, generosidade e obediência a Deus, e
recordou-lhes que “só quem é guiado por Deus tem título e autoridade
para ser proposto como guia dos outros.” O Espirito Santo que rege e
guia, é como que “uma bússola, dá os critérios para distinguir, para si
e para os outros, os tempos de Deus e da sua graça”.
O Bispo “não pode não ter em conta a posse de um dom tão alto e
transcendente”. “É necessário implorá-lo continuamente como condição
primária para iluminar toda a sabedoria humana, existencial,
psicológica, sociológica, moral de que nos podemos servir na tarefa de
discernir as vias de Deus para a salvação daqueles que nos são
confiados” – disse Francisco.
Por isso, é imperativo implorar de Deus não uma vida longa, riquezas,
a vida dos inimigos, mas apenas o “discernimento ao julgar no meio do
povo”. Sem esta graça “seremos incapazes de “avaliar o tempo de Deus” –
frisou Francisco, e continuou:
“O discernimento nasce, portanto, no coração e na mente do
Bispo através da oração, quando põe em contacto as pessoas e as
situações que lhe são confiadas com a Palavra divina pronunciada pelo
Espirito. É nessa intimidade que o Pastor amadurece a liberdade interior
que o torna firme nas suas escolhas e nos seus comportamentos, tanto
pessoais como eclesiais (…)".
E o Papa recomendou aos Bispos a oração como forma de se chegar à
verdade, à luz de Deus. Revestido de uma ineludível responsabilidade
pessoal, o Bispo é chamado a viver o próprio discernimento de Pastor
como membro do Povo de Deus, esse Povo que pelo Baptismo recebeu a graça
do Espírito. “O discernimento do Bispo - disse é sempre uma acção
comunitária” que não deve prescindir dos outros, sob pena de se
considerar superior aos outros e orgulhosos mesmo perante Deus.
O Papa encoraja, portanto, os bispos a um dialogo sereno, a não ter
medo de partilhar e mesmo a modificar o próprio discernimento no dialogo
com os irmãos no episcopado, com os próprios sacerdotes, com os fieis
leigos… Sem essa partilha – “a fé dos mais cultos pode degenerar na
indiferença e a dos mais humildes na superstição”.
Francisco convida, por isso a uma atitude de escuta, a crescer na
liberdade de renunciar ao próprio ponto de vista para assumir o de Deus.
Convidou-os igualmente a não se contentarem do olhar dos outros, mas a
procurarem conhecer pessoalmente os lugares e as pessoas, a “tradição”
espiritual e cultural da diocese que é confiada a cada um, lendo o
presente à luz do Evangelho. Nada, todavia, de protagonismos ou
narcisismos, mas sim dar o próprio testemunho em união com Deus,
servindo o Evangelho, porque discernir, afinal de contas, significa
humildade e obediência ao Evangelho. É um processo criativo, que evita
rigidez, que não se limita a aplicar esquemas, a dizer “sempre se fez
assim”, ou “deixemos passar o tempo”. Evitar ter uma única resposta para
todos os quesitos.
O Papa recomendou ainda aos novos Pastores da Igreja uma delicadeza
especial para com a cultura e a religiosidade do povo. Não são uma algo a
esconder, a tolerar, mas a ter em consideração e como sujeito de
dialogo, de evangelização, do qual o discernimento do bispo não pode
prescindir. E exortou:
“Recordai-vos que Deus estava já presente nas vossas dioceses
quando lá chegastes e estará ainda lá quando fordes embora. E que no
fim seremos todos julgados não com base na contabilidade das nossas
obras, mas sobre o crescimento da obra de Deus no coração do rebanho que
apascentais em nome do “Pastora e custódio das nossas almas”.
Os bispos devem esforçar-se por crescer no discernimento incarnado e
inclusivo que dialoga com a consciência dos fiéis, consciência que deve
ser formada e não substituída. Tudo num processo de acompanhamento
paciente e corajoso para que todos – fieis, famílias, presbíteros,
comunidade e sociedade – possam progredir na liberdade de escolher e
realizar o bem desejado por Deus. Com efeito, disse o Papa – a
actividade de discernimento não é reservada aos sábios, aos perspicazes e
aos perfeitos. Antes, pelo contrário, Deus muitas vezes resiste aos
soberbos e se mostra aos humildes.
O Pastor – Frisou ainda o Papa no seu amplo discurso – sabe que Deus é
a Via, a Verdade e a Vida. Por isso, o autentico discernimento, embora
definitivo em cada passo, é um processo sempre aberto e necessário, que
pode ser completado e enriquecido.
Uma condição essencial para progredir no discernimento é educar à
paciência de Deus e aos seus tempos, que não são nunca os nossos –
rematou o Papa, rogando os novos bispos a “terem escrupulosamente
perante os olhos Jesus e a sua missão, que não era sua
mas do Pai”, a darem aos fiéis a possibilidade de encontrar pessoalmente
a Deus e de escolher a sua Via e de progredir no seu amor.
(DA)
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