(RV) Um “povo nobre que não tem medo de expressar-se e de mostrar aquilo que sente.” Quatro dias completos são suficientes para falar com afeto sincero de um povo que lhe quis demonstrar que o ama realmente, quatro cidades e sempre a mesma alegria pelas ruas, nas missas, em todos os lugares.
Impressionado com a Colômbia
O Santo Padre abriu desse modo a coletiva no voo de retorno da
Colômbia. Sem uma pergunta, mas com uma consideração espontânea que
expressa muito do que trazia no coração. No meio da conversação teve
espaço o habitual leque de temas segundo os interesses geopolíticos dos
jornalistas a bordo.
A Venezuela e as intenções do Presidente Maduro, os imigrados nos EUA
e as intenções do Presidente Trump. O inferno vivido pelos migrantes
que partem da Líbia, com apreço pela Itália e Grécia de portas abertas, e
as responsabilidades dos governos mundiais em relação a um clima que
muitas vezes causa tragédias.
Se o povo quiser a paz
Como se dá habitualmente, as perguntas de início cabem aos
jornalistas do país visitado e os dois colegas que pegaram o microfone
pediram a Francisco que se expressasse sobre a Colômbia pós acordo de
paz e sobre a questão da corrupção.
A guerrilha, afirmou o Papa, foi “uma doença”, mas reconheceu a
existência de “passos que dão esperança”. “Agradeço muito” ao ELN,
disse, referindo-se ao Exército de libertação nacional que,
diferentemente das Farc (forças armadas revolucionárias da Colômbia),
não fala de paz, mas somente de trégua.
O Santo Padre acrescentou ter “percebido” que “a vontade de seguir
adiante neste processo vai além das negociações”, “é uma vontade
espontânea”, e aí, assegurou, “existe a força do povo”, que porém “deve
ser ajudado com a proximidade e a oração” e “com a compreensão”.
Os corruptos e o “modelo Colômbia”
A questão da corrupção é um dos temas fortes do Pontificado e
Francisco recordou o livro escrito sobre o tema e também as convicções
já expressas sobre o corrupto, pessoa – reiterou – que “se cansa de
pedir o perdão e se esquece de pedi-lo” a Deus que não lhe negaria e
que, em todo caso, é o único que pode salvar uma pessoa que se encontra
nessa situação.
O tema do povo protagonista de seu destino voltou na resposta aos
jornalistas de língua espanhola, que lhe perguntaram se era possível
“replicar o modelo Colômbia”, ou seja, de uma negociação com mais vozes
participantes.
Certamente, já aconteceu, confirmou o Papa, mas o fato é que mais do
que a Onu, mais do que políticos ou técnicos, “um processo de paz
seguirá adiante se o povo o assume”. Do contrário, serão “compromissos”
pouco resolutivos, acrescentou.
Desastres ambientais e responsabilidade
A primeira jornalista mulher a dirigir-se ao Papa foi também a
primeira a manifestar interesse por sua saúde após o incidente com a
sobrancelha esquerda a bordo do papamóvel. Francisco respondeu com uma
brincadeira atendo-se em seguida a um tema que tem a peito: a questão
ambiental.
Os sucessivos furacões em breve espaço de tempo que estão destruindo
amplas áreas da América Central são um drama que, reafirmou, chama cada
um a suas “responsabilidades morais”, inclusive os governantes. Basta
consultar os cientistas, eles “são muito claros”, indicou.
Imigrados, reconhecimento à Itália e Grécia
Os jornalistas italianos quiseram saber a posição do Papa em relação à
falta de prontidão dos governos no que diz respeito à imigração. Por
que, perguntaram, não são solícitos como se deveria, quando, ao invés, o
são – por exemplo – sobre a venda de armas?
Porque o homem “é estúpido”, rebateu o Papa citando a Bíblia e quando
decide não enxergar “não vê”. Sobre a gestão dos migrantes que partem
da Líbia, o Santo Padre disse não ter tratado do tema durante o encontro
com o premier italiano Gentiloni e, sobretudo, sentir um “dever de
gratidão” para com a Itália e a Grécia “porque abriram o coração aos
migrantes”.
Verdadeira questão em jogo é a integração ou seu oposto
Abertura, precisou, que não pode prescindir da capacidade de cada
país singularmente considerado. Todavia, insistiu o Pontífice, a
verdadeira questão em jogo é “a integração” ou o seu oposto.
“Coração sempre aberto, paciência, integração e proximidade
humanitária”, indicou, convidando a humanidade a tomar “consciência” dos
“lagers no deserto” onde se infringem os sonhos de tantos migrantes e
reconhecendo o fato de o governo italiano estar “fazendo de tudo para
resolver problemas humanitários, inclusive aqueles que não pode
resolver”.
Durante a coletiva o Papa fez um aceno também à África, sobre o qual
recai ainda uma convicção radicada, ou seja, que se trata de um
continente a ser explorado, ao invés de ser ajudado a reerguer-se.
Trump e Maduro
Ainda sobre a migração, Francisco foi interpelado também acerca da
abolição da lei estadunidense “Dreamers” (que elimina as proteções
queridas por Obama para 800 mil menores imigrantes ilegalmente).
Embora reconhecendo não conhecer profundamente os termos, o Pontífice
espera uma reconsideração do governo. “Sei que o presidente
estadunidense”, observou “se apresenta como homem pro-life. Se é um bom
pro-life, entende, a família é o berço da vida e sua unidade deve ser
defendida”, vez que se tiram as raízes dos jovens, observou, drogas,
dependências e suicídios tornam-se as terríveis saídas que eles
encontram.
Sobre a questão venezuelana, que tem muito a peito, Francisco
ressaltou que a Santa Sé falou forte e claramente” e que acerca das
declarações do Presidente Maduro cabe a ele explicá-las. O que é “mais
doloroso” para Francisco é o “problema humanitário” e sobre isso a Onu
“deve fazer ouvir a sua voz” para dar uma ajuda, frisou.
A Colômbia tem futuro
Após cerca de 40 minutos de coletiva, uma momentânea turbulência
induziu a interromper o diálogo com os jornalistas. A esse ponto,
Francisco escolheu despedir-se como havia iniciado o encontro, falando
sobre como a Colômbia o impressionou.
Impressionado em particular com os pais e mães que levantavam seus
filhos quando ele passava para que fossem vistos e abençoados. Esse “é
um símbolo de futuro, de esperança”, concluiu. Um povo “capaz de fazer
crianças e depois mostrá-las como se fossem tesouro, esse é um povo que
tem esperança e tem futuro”. (RL/ADC)
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