23 maio, 2019

Papa: a presença de Deus mora na pequenez dos pobres que encontramos

 
 Celebração da Santa Missa na Basílica de São Pedro, na abertura da
XXI Assembleia Geral da Caritas Internacional  (Vatican Media)
 
“É sempre importante ouvir a voz de todos, especialmente dos pequenos e dos últimos. No mundo quem dispõe de mais meios fala mais, mas entre nós não pode ser assim, porque Deus ama e revelar-se através dos pequenos e dos últimos. E a cada um pede que não olhe para ninguém de cima para baixo”, disse o Papa na missa de abertura da XXI Assembleia Geral da Caritas Internacional.
 
Cidade do Vaticano

“Peçamos ao Senhor que nos livre do eficientismo, do mundanismo, da tentação subtil de render culto a nós mesmos e à nossa bravura. Peçamos a graça de acolher o caminho indicado pela Palavra de Deus: humildade, comunhão, renúncia.”

Foi a exortação do Papa Francisco na missa celebrada na tarde desta quinta-feira (23/05) no Altar da Cátedra na Basílica de São Pedro, na abertura da XXI Assembleia Geral da Caritas Internacional.

Tendo presente a liturgia do dia, o Santo Padre desenvolveu a sua reflexão na homilia a partir do trecho dos Atos dos Apóstolos que traz a primeira grande reunião da história da Igreja, em que os apóstolos e os anciãos se reuniram para examinar questões surgidas após uma situação inesperada: os pagãos que se convertiam à fé. Devem adequar-se, como os outros, também a todas as normas da Lei antiga?

O Pontífice ressaltou tratar-se de uma decisão difícil de ser tomada e o Senhor não estava mais presente. Uma pergunta espontânea: porque razão Jesus não deixou uma sugestão para dirimir a discussão? Porque não tinha dado regras claras e rapidamente resolutivas?

Francisco apontou aí a tentação do eficientismo, do pensar que a Igreja caminha bem se mantém tudo sob controle, se vive sem turbulências, com a agenda sempre em ordem. Mas o Senhor não faz deste modo, observou.

“Não manda uma resposta do céu, manda o Espírito Santo. E o Espírito não vem trazer a agenda do dia, vem como fogo. Jesus não quer que a Igreja seja um modelo miniatura perfeito, que se compraz da própria organização e é capaz de defendero seu bom nome. Jesus não viveu assim, mas em caminho, sem temer as agitações da vida. O Evangelho é o nosso programa de vida.”

Após lembrar que o Evangelho nos ensina que as questões não devem ser enfrentadas com uma receita pronta e que a fé não é uma tabela de marcha, mas o ‘Caminho’ a ser percorrido juntos, sempre juntos, com espírito de confiança”, Francisco reiterou que da narração dos Atos dos Apóstolos aprendemos três elementos essenciais para a Igreja em caminho: a humildade da escuta, o carisma do permanecer juntos, e a coragem da renúncia.

Atenda-se à coragem da renúncia, o Papa frisou que para os primeiros cristãos a questão em discussão tratava de tradições e preceitos importantes, que o povo eleito tinha muito a peito. Estava em jogo a identidade religiosa.

Todavia, observou, escolheram que o anúncio do Senhor antecede e vale mais do que tudo. Para o bem da missão, para anunciar a todos, de modo transparente e crível, que Deus é amor, também aquelas convicções e tradições humanas que são mais obstáculo que ajuda, podem e devem ser deixadas.

“A fé verdadeira purifica dos apegos. Para seguir o  Senhor é preciso caminhar rapidamente e para caminhar veloz é preciso aliviar o peso, mesmo se custe. Como Igreja, não somos chamados a comprometimentos empresariais, mas a ardores evangélicos.”

E ao purificar-nos, ao reformar-nos, continuou, “devemos evitar a simulação, ou seja, o fingir mudar algo para que na realidade nada mude. Isto se dá, por exemplo, quando, para buscar estar passo a passo com os tempos, faz-se de certo modo uma maquilhagem na superfície das coisas, mas é somente maquilhagem para parecerem jovens. O Senhor não quer retoques cosméticos, quer a conversão do coração, que passa através da renúncia. Sair de si é a reforma fundamental.”

Os primeiros cristãos alcançaram a coragem da renúncia partindo da humildade da escuta. Exercitaram-se no desinteresse por si mesmos: “vemos que cada um deixa o outro falar e disponível a mudar as próprias convicções. Sabe escutar, deixa somente que a voz do outro entre realmente nele”, disse ainda.

Francisco ressaltou que quem quer percorrer os caminhos da caridade, a humildade e a escuta, significa ouvido disponível para os pequenos.

“É sempre importante ouvir a voz de todos, especialmente dos pequenos e dos últimos. No mundo quem dispõe de mais meios fala mais, mas entre nós não pode ser assim, porque Deus ama, revelar-se através dos pequenos e dos últimos. E a cada um pede que não olhe ninguém de cima para baixo.”

Por fim, a escuta da vida: A Igreja faz discernimento não diante do computador, mas diante da realidade das pessoas. “Pessoas, antes dos programas, com o olhar humilde de quem sabe procurar nos outros a presença de Deus, que não mora na grandeza do que fazemos, mas na pequenez dos pobres que encontramos.

Da humildade da escuta à coragem da renúncia, tudo passa pelo carisma do estarmos juntos. De facto, “na discussão da primeira Igreja a unidade prevalece sempre sobre as diferenças. Para cada um, em primeiro lugar não estão as próprias preferências e estratégias, mas o ser e sentir-se Igreja de Jesus, reunida em torno de Pedro, na caridade que não cria uniformidade, mas comunhão”.

É preciso estar próximo de Jesus, Pão partilhado. “Ajuda-nos estar diante do tabernáculo e diante de tantos tabernáculos vivos que são os pobres. A Eucaristia e os pobres, tabernáculo fixo e tabernáculos móveis: ali se permanece no amor e se absorve a mentalidade da fração do Pão”, concluiu.

VN

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