(RV) O
última actividade do Papa na tarde desta quinta-feira no Quénia, foi a
visita à sede das Nações Unidas em Nairobi. O Papa foi acolhido pela
Directora Geral, a senhora Saleh Work Zewede, e pelos responsáveis pelas
questões do Ambiente e do Habitat, os dois aspectos de que se ocupa
essencialmente essa sede da ONU.
Depois da assinatura do livro de ouro, o Papa foi levado num pequeno
carro eléctrico para o parque, onde foi convidado a plantar uma árvore,
gesto, cujo significado simbólico, serviu-lhe depois de ponta pé de
saída no seu discurso, em espanhol, aos cerca de três mil delegados,
diplomatas e pessoal da ONU, que o escutavam. Um discurso dirigido à
África, ao mundo, em que o Papa abarcou, sempre na esperança duma
melhoria, diversos temas: desde o ambiente, às injustiças sociais que
provocam tanta violência no mundo, à urbanização descontrolada com todas
as suas consequências, à Organização Mundial do Comércio.
Plantar uma árvore – disse – é um convite a perseverar na luta contra
a desflorestação e a desertificação, a proteger a biodiversidade de
pulmões do planeta como a bacia fluvial do Congo; é uma incitação a
continuar unidos e confiantes na capacidade humana de “inverter todas
as situações de injustiça e deterioração de que sofremos hoje”.
O tom estava, portanto, dado para abordar a questão ambiental, um
dilema perante o qual se encontra a humanidade – disse o Papa: “melhorar
ou destruir o meio ambiente”.
“O clima é um bem comum, um bem de todos” e por isso as mudanças
climáticas são um problema global que requerem o empenho responsável de
todos para o seu melhoramento – insistiu Francisco, exprimindo apreço
pelas iniciativas neste sentido. E considerou importante o encontro
internacional que vai ter lugar nos próximos dias em Paris, o chamado
COP21, sobre a questão das energias renováveis e não poluidoras. O Papa
convidou a evitar a “tentação de cair num nominalismo declamatório com
efeito tranquilizador sobre as consciências “ e a dar um sinal claro do
“grande compromisso político e económico de reconsiderar e corrigir as
falhas e distorções no modelo actual de desenvolvimento”
“Por isso espero que a COP21 leve à conclusão dum acordo global e
“transformador” baseado nos princípios de solidariedade, justiça,
equidade e participação, e vise a consecução de três objectivos
complexos e, ao mesmo tempo, interdependentes: a redução do impacto das
alterações climáticas, a luta contra a pobreza e o respeito pela
dignidade humana”.
Retomando várias vezes conceitos expressos na sua encíclica sobre o
ambiente, Laudato Si, como a ideia de planeta como casa comum, pátria de
toda a humanidade, o Papa disse que devemos aceitar humildemente a
nossa interdependência, mas não como “sinónimo de imposição ou submissão
de uns em função dos interesses de outros, do mais fraco em função do
mais forte”
“É necessário um diálogo sincero e franco, com a colaboração de todos”: políticos, cientistas, empresas, sociedade civil.
Confiante de que, não obstante os males do passado, o ser humano é
capaz de ultrapassar-se a si mesmo e “voltar a escolher o bem, a
regenerar-se”, e a “assumir com generosidade as suas graves
responsabilidades”, o Papa disse que isto requer, que se coloque “a
economia e a política ao serviço dos povos” e em harmonia com a
natureza.
O caminho indicado pelo Papa para essa mudança de rumo, tão
necessária é, ao lado das soluções políticas e económicas, a educação e a
formação, por forma a promover novos estilos de vida e fazer com que
crianças, jovens e adultos adoptem a cultura do cuidado (de si próprio,
do outro, do meio ambiente). Nada da cultura do descarte que tem levado a
sacrificar pessoas no altar no lucro e do consumo. É um desafio
cultural, espiritual e educativo, o que o Papa propõe à humanidade e
acredita “que estamos a tempo de o impulsionar”. Caso contrário será a
“globalização da indiferença” ou, pior ainda, a resignação a diversas
formas de tráfico, escravaturas, trabalho forçado, prostituição, tráfico
de órgãos, fluxos migratórios… insistiu Francisco, mencionando os
chamados migrantes económicos, que, “não sendo reconhecidos como
refugiados nas convenções internacionais, carregam o peso da sua vida
abandonada sem qualquer tutela normativa”
“São muitas vidas, muitas histórias, muitos sonhos que naufragam nos
nossos dias. Não podemos ficar indiferentes perante isto. Não temos o
direito”.
O Papa passou depois a falar do rápido processo de urbanização que
leva ao crescimento desmedido e descontrolado das cidades e que se
tornam pouco saudáveis, com preocupantes sintomas duma trágica ruptura
dos vínculos de integração e comunhão social que leva à violência, ao
narcotráfico, ao desenraizamento, ao anonimato social.
Bergoglio encorajou “quantos trabalham a nível local e internacional
por garantir que o processo de urbanização se torne num instrumento
eficaz para o desenvolvimento e a integração”. A este respeito
referiu-se à próxima Conferência Mundial Habitat-III a ter lugar em
Quito, no Equador em Outubro de 2016, esperando que seja um momento para
identificar formas de responder a estas problemáticas.
Por fim referiu-se à X Conferência Ministerial da Organização Mundial
do Comércio que vai ter lugar daqui a poucos dias, precisamente em
Nairobi. A este respeito Francisco disse que muito se tem trabalhado
neste sector no sentido de fazer com que as relações comerciais entre os
Estados contribuam para o desenvolvimento dos povos, mas que “ainda não
se chegou a um sistema de comercio internacional equitativo e
totalmente ao serviço da luta contra a pobreza e a exclusão.”
“Espero que as decisões da próxima Conferência de Nairobi não sejam
um mero equilíbrio de interesses contrapostos, mas um verdadeiro serviço
ao cuidado da casa comum e ao desenvolvimento integral das pessoas,
sobretudo das mais abandonadas”.
O Papa sugeriu uma adequação ordenada e não traumática das normas
comerciais de modo que a interdependência e a integração das economias
não se faça em prejuízo de sectores sociais importantes como a saúde,
recordando que a eliminação de doenças como a malária e a tuberculoses, a
cura das chamas doenças “órfãos” e sectores desfavorecidos da medicina
tropical reclamam uma atenção política primária, acima de qualquer outro
interesse comercial ou político.
O Papa concluiu chamando atenção para a beleza e a riqueza natural da
África, que levam a louvar o Criador; um património da humanidade, que
enfrenta, todavia, o constante risco de destruição devido ao egoísmo
humano. E reiterando um desejo já expresso na ONU em Nova Iorque, também
desta fez, o Papa manifestou a vontade de que as obras das Organização
das Nações Unidas e as relações multilaterais sejam “penhor dum futuro
seguro e feliz para gerações futuras”, pondo de lado interesses
sectoriais e ideologias e procurando o interesse comum. E concluiu com
estas palavras:
“Asseguro uma vez mais o apoio da Comunidade Católica e o meu de
continuar a rezar e colaborar para que os frutos da cooperação regional,
que se expressam hoje na União Africana e nos múltiplos acordos
africanos de comércio, cooperação e desenvolvimento, sejam vividos com
vigor e tendo sempre em conta o bem comum dos filhos desta terra. A
bênção do Altíssimo esteja com todos e cada um de vós e dos vossos
povos. Obrigado”.
(DA)
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