Mariangela Jaguraba - Cidade do Vaticano
O Papa Francisco encontrou-se com os Bispos da América Central, nesta quinta-feira (24/01), na Igreja de São Francisco de Assis, na Cidade do Panamá. O Pontífice exortou a Igreja a ser humilde e pobre, não arrogante nem cheia de orgulho, seguindo o exemplo de São Óscar Romero.
Foi para toda a Igreja e para o Povo de Deus, o discurso do Papa Francisco aos bispos centro-americanos do Secretariado Episcopal da América Central (SEDAC)
que há 75 anos reúne os bispos das Conferências Episcopais do Panamá,
El Salvador, Costa Rica, Guatemala, Honduras e Nicarágua. O Papa
encontrou os bispos e os abraçou: "Entre vocês há também amigos de
juventude", disse.
Após a saudação do presidente do organismo, dom José Luis Escobar
Alas, centralizado sobre o atual momento histórico "tristemente"
marcado - disse o prelado - pela violência, corrupção, desigualdade,
migração, exclusão social especialmente para os mais pobres, Francisco no seu discurso ressaltou: "este encontro com os bispos oferece-lnos a
oportunidade de poder abraçar e sentirmo-nos mais próximos dos povos
centro-americanos".
“Obrigado por deixarem-me aproximar desta fé provada mas simples do
rosto pobre do seu povo, que sabe que «Deus está presente, não dorme;
está ativo, observa e ajuda», disse o Papa citando um trecho da homilia
de São Óscar Romero de 16 de dezembro de 1979.
“Este encontro recorda-nos o acontecimento eclesial de grande
relevância. Os pastores desta região foram os primeiros a criar na
América um organismo de comunhão e participação que deu, e continua a dar, frutos abundantes. Refiro-me ao Secretariado Episcopal da América Central (SEDAC):
um espaço de comunhão, discernimento e empenho que nutre, revitaliza e
enriquece as suas Igrejas. Pastores que souberam progredir, dando um
sinal que, longe de ser um elemento apenas programático, indicou como o
futuro da América Central – e de qualquer outra região no mundo – passa
necessariamente pela lucidez e capacidade que se possui de ampliar a
visão, unir esforços num trabalho paciente e generoso de escuta,
compreensão, dedicação e empenho, e poder assim discernir os novos
horizontes para onde nos está a conduzir o Espírito”.
Segundo o Papa, “nestes setenta e cinco anos passados desde a sua
fundação, o SEDAC procurou partilhar as alegrias e tristezas, as lutas e
esperanças dos povos da América Central, cuja história se forjou
entrelaçando-se com a história do seu povo".
"Recordam-nos que «quem deseja verdadeiramente dar glória a Deus com a
sua vida, quem realmente quer santificar-se para que a sua existência
glorifique o Santo, é chamado a obstinar-se, doar-se e cansar-se
procurando viver as obras de misericórdia». E fazê-lo, não como esmola, mas como vocação.”
"O lema que escolheu para o brasão episcopal, e campeia na lápide da
sua sepultura, expressa claramente o seu princípio inspirador e a
realidade da sua vida de pastor: «Sentir com a Igreja». Uma bússola que
marcou a sua vida na fidelidade, mesmo nos momentos mais turbulentos.”
Francisco disse que São Óscar “gostava de colocar no centro do sentir com a Igreja, a percepção e a gratidão por tanto bem recebido, sem o merecer. Romero foi capaz de sintonizar e aprender a viver a Igreja, porque amava intimamente quem o gerara na fé. Romero sentiu com a Igreja, porque, antes de mais nada, amou a Igreja como mãe que o gerou na fé, considerando-se membro e parte dela”.
Francisco disse que São Óscar “gostava de colocar no centro do sentir com a Igreja, a percepção e a gratidão por tanto bem recebido, sem o merecer. Romero foi capaz de sintonizar e aprender a viver a Igreja, porque amava intimamente quem o gerara na fé. Romero sentiu com a Igreja, porque, antes de mais nada, amou a Igreja como mãe que o gerou na fé, considerando-se membro e parte dela”.
“Este amor, feito de adesão e gratidão, levou-o a abraçar, com paixão
mas também com dedicação e estudo, toda a contribuição e renovação
propostas pelo magistério do Concílio Vaticano II. Nele encontrava a mão
segura para seguir Cristo. Não foi ideólogo nem ideológico. Iluminado
por este horizonte eclesial, sentir com a Igreja significa para Romero
contemplá-la como Povo de Deus. O pastor, para procurar e encontrar o
Senhor, deve aprender e escutar as pulsações do coração do seu povo,
sentir «o cheiro» dos homens e mulheres de hoje até ficar impregnado das suas alegrias e esperanças, tristezas e angústias.”
A kenosis de Cristo
A kenosis de Cristo
A seguir, o Papa falou sobre a kenosis de Cristo, afirmando que “esta
não é apenas a glória da Igreja, mas também uma vocação, um convite a
fazermos dela a nossa glória pessoal e caminho de santidade. A kenosis
de Cristo não é algo do passado, mas garantia atual para sentir e
descobrir a sua presença operante na história; uma presença que não
podemos nem queremos silenciar, porque sabemos e experimentamos que só
Ele é «Caminho, Verdade e Vida».”
Para Francisco, “a kenosis de Cristo lembra-nos que Deus salva
na história, na vida de cada ser humano, já que a mesma é também a sua
história e, nela, vem ao nosso encontro".
Francisco disse ainda que “o pastor não pode estar longe do
sofrimento do seu povo. Podemos dizer que o coração do pastor mede-se
pela sua capacidade de se deixar comover à vista de tantas vidas feridas
e ameaçadas”.
A kenosis de Cristo é jovem
“A kenosis de Cristo é jovem”, disse ainda o Papa.
"Com eles, poderemos ver melhor como tornar o Evangelho mais
acessível e crível no mundo em que vivemos; são uma espécie de
termómetro para saber até que ponto estamos como comunidade e como
sociedade.”
“Os jovens trazem dentro de si uma inquietude que devemos apreciar,
respeitar, acompanhar e que faz muito bem a todos nós, porque
provoca-nos, lembrando-nos que o pastor nunca deixa de ser discípulo e está a
caminho. Exorto-vos a promover programas e centros educacionais que
saibam acompanhar, apoiar e responsabilizar os vossos jovens; «roubai-os» à
rua, antes que a cultura de morte, «vendendo-lhes fumo» e soluções
mágicas, se apodere e aproveite da sua imaginação. Façam isto não com
paternalismo como quem olha de cima para baixo, pois não é isso que o
Senhor nos pede, mas como pais, como de irmão para irmão.”
A seguir, Francisco recordou que “há muitos jovens que foram seduzidos por respostas imediatas que hipotecam a vida. Diziam-nos
os Padres Sinodais que aqueles, por constrição ou falta de
alternativas, encontram-se mergulhados em situações altamente
conflituosas e sem solução à vista: violência doméstica, feminicídio –
uma chaga, que aflige o nosso continente –, bandos armados e criminoss,
tráfico de droga, exploração sexual de menores e de tantos que já não o
são, etc”.
O Pontífice ressaltou que "na raiz de muitas destas situações, está
uma experiência de orfandade, fruto de uma cultura e uma sociedade
transviada. Lares desfeitos devido tantas vezes a um sistema
económico que deixou de ter como prioridade as pessoas e o bem comum,
fazendo da especulação o «seu paraíso» onde continuar «engordando», sem
se importarem, à custa de quem. Assim, os nossos jovens sem o calor
duma casa, nem família, nem comunidade, nem pertença, são deixados à
mercê do primeiro vigarista que lhes apareça.”
Francisco congratulou-se com os bispos pela “iniciativa de começar esta Jornada Mundial da Juventude com a Jornada da Juventude Indígena e com a Jornada da Juventude de origem africana”. “Este foi um bom passo para mostrar as muitas facetas do nosso povo”, disse o pontífice.
Impacto da migração
Impacto da migração
O Papa falou também sobre a questão da migração: “Na última carta
pastoral, vocês afirmaram: «Ultimamente a nossa região tem sofrido o impacto da migração realizada
de forma nova, por ser maciça e organizada, e que evidenciou os motivos
que levam a uma migração forçada e os perigos que cria para a dignidade
da pessoa humana».
Francisco recordou que “muitos dos migrantes têm rosto jovem;
procuram um bem maior para a própria família, não temendo arriscar e
deixar tudo para lhe oferecer o mínimo de condições que garantam um
futuro melhor. Aqui não basta a denúncia, mas devemos anunciar
concretamente uma «boa nova».
"«Acolher, proteger, promover e integrar» podem ser os quatro verbos
com que a Igreja, nesta situação migratória, conjugue a sua maternidade
no momento atual da história.”
A kenosis de Cristo é sacerdotal
A kenosis de Cristo é sacerdotal
A kenosis de Cristo é sacerdotal, frisou o Papa, convidando os bispos a não caírem no funcionalismo e no clericalismo
“infelizmente tão difundidos. Não é questão de mudar estilos, hábitos
ou linguagem. É questão sobretudo de impacto e capacidade de espaço, nos
nossos programas episcopais, para receber, acompanhar e sustentar os
nossos sacerdotes: um «espaço real» para nos ocuparmos deles. Isto faz
de nós pais fecundos”.
A kenosis de Cristo é pobre
A kenosis de Cristo é pobre
Por fim, “a kenosis de Cristo é pobre”, frisou o Papa. “Sentir com a Igreja é sentir com o povo fiel, o povo de Deus que sofre e espera. Uma
Igreja que não deseja que a sua força esteja – como dizia Dom Romero –
no apoio dos poderosos ou da política, mas que disso se desprende com
nobreza para caminhar sustentada, unicamente pelos braços do Crucificado,
que é a sua verdadeira força. E isto traduz-se em sinais concretos e
evidentes; isto interpela-nos e impele-nos a um exame de consciência a
propósito das nossas opções e prioridades no uso dos recursos,
influências e posições. A pobreza é mãe e muro, porque guarda o nosso
coração para que não escorregue em concessões e comprometimentos que
enfraquecem a liberdade e parresia a que nos chama o Senhor.”
Leia também o discurso integral do Papa aos Bispos da América Central,
VN
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