01 janeiro, 2019

Papa Francisco: Maria é remédio para a solidão e a desagregação

 
 
"Nossa Senhora introduz na Igreja a atmosfera de casa, duma casa habitada pelo Deus da novidade", disse o Papa na sua homilia.
 
Mariangela Jaguraba - Cidade do Vaticano

O Papa Francisco celebrou a missa, nesta terça-feira (1º/01), Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, na Basílica de São Pedro.

O Pontífice iniciou a sua homilia partindo do capítulo 2, versículo 18 do Evangelho de Lucas: «Todos os que ouviam os pastores, ficaram maravilhados com aquilo que contavam».

“Maravilhar-nos: a isto somos chamados hoje, na conclusão da Oitava de Natal, com o olhar ainda fixo no Menino que nasceu para nós, pobre de tudo e rico de amor. Maravilha: é a atitude que devemos ter no começo do ano, porque a vida é um dom que nos possibilita começar sempre de novo.”

Segundo o Papa, “hoje é também o dia para nos maravilharmos diante da Mãe de Deus: Deus é um bebé nos braços duma mulher, que alimenta o seu Criador. A imagem que temos à nossa frente mostra a Mãe e o Menino tão unidos que parecem um só”. 

Mãe que gera a maravilha da fé

“Tal é o mistério de hoje, que suscita uma maravilha infinita: Deus uniu-se à humanidade para sempre. Deus e o homem sempre juntos: eis a boa notícia no início do ano. Deus não é um senhor distante que habita solitário nos céus, mas o Amor encarnado, nascido como nós duma mãe para ser irmão de cada um. Está nos joelhos da sua mãe, que é também nossa mãe, e de lá derrama uma nova ternura sobre a humanidade. Nós compreendemos melhor o amor divino, que é paterno e materno, como o de uma mãe que não cessa de crer nos filhos e nunca os abandona. O Deus-connosco ama-nos independentemente dos nossos erros, dos nossos pecados, do modo como fazemos caminhar o mundo. Deus crê na humanidade, da qual sobressai, como primeira e incomparável, a sua Mãe.”

“No início do ano, pedimos-Lhe a graça de nos maravilharmos perante o Deus das surpresas”, disse ainda Francisco. “Renovamos a maravilha das origens, quando nasceu em nós a fé. A Mãe de Deus ajuda-nos: a Theotokos, que gerou o Senhor, gera-nos para o Senhor. É mãe e gera sempre de novo, nos filhos, a maravilha da fé. A vida, sem nos maravilharmos, torna-se cinzenta, rotineira; e de igual modo a fé. Também a Igreja precisa renovar a sua maravilha por ser casa do Deus vivo, Esposa do Senhor, Mãe que gera filhos; caso contrário, corre o risco de assemelhar-se a um lindo museu do passado. Mas, Nossa Senhora introduz na Igreja a atmosfera de casa, duma casa habitada pelo Deus da novidade. Acolhamos maravilhados o mistério da Mãe de Deus, como os habitantes de Éfeso no tempo do Concílio lá realizado! Como eles, aclamemos a «Santa Mãe de Deus»! Deixemo-nos olhar, deixemo-nos abraçar, deixemo-nos tomar pela mão… por Ela.” 

Deixemo-nos olhar

“Deixemo-nos olhar”, frisou ainda o Papa, “sobretudo nos momentos de necessidade, quando nos encontramos presos nos nós mais intrincados da vida, justamente olhamos para Nossa Senhora. Mas é lindo, primeiramente, deixar-mo-nos olhar por Nossa Senhora. Quando nos olha, Ela não vê pecadores, mas filhos. Diz-se que os olhos são o espelho da alma; os olhos da Cheia de Graça espelham a beleza de Deus, refletem sobre nós o paraíso. Jesus disse que os olhos são «a lâmpada do corpo» (Mt 6, 22): os olhos de Nossa Senhora sabem iluminar toda a escuridão, reacendem por todo o lado a nossa mãe».”

Segundo o Pontífice, “este olhar materno, que infunde confiança, ajuda a crescer na fé. A fé é um vínculo com Deus que envolve a pessoa inteira, mas, para ser guardado, precisa da Mãe de Deus. O seu olhar materno ajuda a vermo-nos como filhos amados no povo fiel de Deus e a amar-mo-nos entre nós, independentemente dos limites e opções de cada um.”

“Nossa Senhora enraíza-nos na Igreja, onde a unidade conta mais do ue a diversidade, e exorta-nos a cuidarmos uns dos outros. O olhar de Maria lembra que, para a fé, é essencial a ternura, que impede a apatia. Quando há lugar na fé para a Mãe de Deus, nunca se perde o centro: o Senhor. Com efeito, Maria nunca aponta para Si mesma, mas para Jesus e os irmãos, porque Maria é mãe.”

“Olhar da Mãe, olhar das mães. Um mundo que olha para o futuro, privado de olhar materno, é míope. Aumentará talvez os lucros, mas jamais será capaz de ver, nos homens, filhos. Haverá ganhos, mas não serão para todos. Habitaremos na mesma casa, mas não como irmãos. A família humana fundamenta-se nas mães. Um mundo, onde a ternura materna acaba desclassificada a mero sentimento, poderá ser rico de coisas, mas não rico de amanhã. A Mãe de Deus, ensina-nos o seu olhar sobre a vida e volta o seu olhar para nós, para as nossas misérias.” “Esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei”, disse o Papa, citando um trecho da oração da Salve Rainha. 

Deixemo-nos abraçar

“Deixem-mo-nos abraçar”, sublinhou ainda Francisco. “Depois do olhar, entra em cena o coração, no qual Maria, diz o Evangelho de hoje, «conservava todas estas coisas, meditando-as» (Lc 2, 19). Por outras palavras, Nossa Senhora tinha tudo no coração, abraçava tudo, eventos favoráveis e contrários. E em tudo meditava, isto é, levava a Deus. Eis o seu segredo. Da mesma forma, tem no coração a vida de cada um de nós: deseja abraçar todas as nossas situações e apresentá-las a Deus.”

“Na vida fragmentada de hoje, onde nos arriscamos a perder o fio à meada, é essencial o abraço da Mãe. Há tanta dispersão e solidão por aí! O mundo está todo conetado, mas parece cada vez mais desunido. Precisamos de nos confiar à Mãe. Na Sagrada Escritura, Ela abraça muitas situações concretas e está presente onde há necessidade: vai encontrar a prima Isabel, socorre os esposos de Caná, encoraja os discípulos no Cenáculo... Maria é remédio para a solidão e a desagregação. É a Mãe da consolação, a Mãe que “consola”: está com quem se sente só. Ela sabe que, para consolar, não bastam as palavras; é necessária a presença. E Maria está presente como mãe. Permitamos-lhe que abrace a nossa vida. Na Salve Rainha, chamamos Maria de «vida nossa»: parece exagerado, porque a vida é Cristo (cf. Jo 14, 6), mas Maria está tão unida a Ele e tão perto de nós que não há nada melhor do que colocar a vida nas suas mãos e reconhecê-la «vida, doçura e esperança nossa». 

Deixemo-nos tomar pela mão

Por fim, “deixemo-nos tomar pela mão”, disse o Papa. “As mães tomam pela mão os filhos e os introduz amorosamente na vida. Mas hoje, quantos filhos, seguindo por conta própria, perdem a direção, crêem-se fortes e extraviam-se, livres e tornam-se escravos! Quantos, esquecidos do carinho materno, vivem zangados e indiferentes a tudo! Quantos, infelizmente, reagem a tudo e a todos com veneno e maldade! Mostram-se maus, às vezes, até parece um sinal de força; mas é só fraqueza! Precisamos aprender com as mães que o heroísmo está em doar-se, a força para ter piedade, e a sabedoria na mansidão.”

“Deus não prescindiu da Mãe: por esta razão nós precisamos dela”. Ele doou-nos a sua Mãe “e não num momento qualquer, mas quando estava pregado na cruz: «Eis a tua mãe» (Jo 19, 27), disse Ele ao discípulo, a cada discípulo. Nossa Senhora não é opcional: deve ser acolhida na vida. É a Rainha da paz, que vence o mal e guia pelos caminhos do bem, que devolve a unidade entre os filhos, que educa para a compaixão.”

Francisco concluiu, pedindo a Maria para que nos tome pela mão, nos ajude a superar “as curvas mais fechadas da história”, a “descobrir os laços que nos unem”, a nos reunirmos “sob o seu manto,  na ternura do amor verdadeiro, onde se reconstitui a família humana”.


 VN

Sem comentários:

Enviar um comentário