"Nossa Senhora introduz na Igreja a atmosfera de casa, duma casa habitada pelo Deus da novidade", disse o Papa na sua homilia.
Mariangela Jaguraba - Cidade do Vaticano
O Papa Francisco celebrou a missa, nesta terça-feira (1º/01), Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, na Basílica de São Pedro.
O Pontífice iniciou a sua homilia partindo do capítulo 2, versículo 18
do Evangelho de Lucas: «Todos os que ouviam os pastores, ficaram
maravilhados com aquilo que contavam».
“Maravilhar-nos: a isto somos chamados hoje, na conclusão da Oitava
de Natal, com o olhar ainda fixo no Menino que nasceu para nós, pobre de
tudo e rico de amor. Maravilha: é a atitude que devemos ter no começo do ano, porque a vida é um dom que nos possibilita começar sempre de novo.”
Segundo o Papa, “hoje é também o dia para nos maravilharmos diante da
Mãe de Deus: Deus é um bebé nos braços duma mulher, que alimenta o seu
Criador. A imagem que temos à nossa frente mostra a Mãe e o Menino tão
unidos que parecem um só”.
Mãe que gera a maravilha da fé
“Tal é o mistério de hoje, que suscita uma maravilha infinita: Deus
uniu-se à humanidade para sempre. Deus e o homem sempre juntos: eis a
boa notícia no início do ano. Deus não é um senhor distante que habita
solitário nos céus, mas o Amor encarnado, nascido como nós duma mãe para
ser irmão de cada um. Está nos joelhos da sua mãe, que é também nossa
mãe, e de lá derrama uma nova ternura sobre a humanidade. Nós
compreendemos melhor o amor divino, que é paterno e materno, como o de uma
mãe que não cessa de crer nos filhos e nunca os abandona. O
Deus-connosco ama-nos independentemente dos nossos erros, dos nossos
pecados, do modo como fazemos caminhar o mundo. Deus crê na humanidade,
da qual sobressai, como primeira e incomparável, a sua Mãe.”
“No início do ano, pedimos-Lhe a graça de nos maravilharmos perante o
Deus das surpresas”, disse ainda Francisco. “Renovamos a maravilha das
origens, quando nasceu em nós a fé. A Mãe de Deus ajuda-nos: a
Theotokos, que gerou o Senhor, gera-nos para o Senhor. É mãe e gera
sempre de novo, nos filhos, a maravilha da fé. A vida, sem nos
maravilharmos, torna-se cinzenta, rotineira; e de igual modo a fé.
Também a Igreja precisa renovar a sua maravilha por ser casa do Deus
vivo, Esposa do Senhor, Mãe que gera filhos; caso contrário, corre o
risco de assemelhar-se a um lindo museu do passado. Mas, Nossa Senhora
introduz na Igreja a atmosfera de casa, duma casa habitada pelo Deus da
novidade. Acolhamos maravilhados o mistério da Mãe de Deus, como os
habitantes de Éfeso no tempo do Concílio lá realizado! Como eles,
aclamemos a «Santa Mãe de Deus»! Deixemo-nos olhar, deixemo-nos abraçar,
deixemo-nos tomar pela mão… por Ela.”
Deixemo-nos olhar
“Deixemo-nos olhar”, frisou ainda o Papa, “sobretudo nos momentos de
necessidade, quando nos encontramos presos nos nós mais intrincados da
vida, justamente olhamos para Nossa Senhora. Mas é lindo, primeiramente,
deixar-mo-nos olhar por Nossa Senhora. Quando nos olha, Ela não vê
pecadores, mas filhos. Diz-se que os olhos são o espelho da alma; os
olhos da Cheia de Graça espelham a beleza de Deus, refletem sobre nós o
paraíso. Jesus disse que os olhos são «a lâmpada do corpo» (Mt 6, 22):
os olhos de Nossa Senhora sabem iluminar toda a escuridão, reacendem por
todo o lado a nossa mãe».”
Segundo o Pontífice, “este olhar materno, que infunde confiança,
ajuda a crescer na fé. A fé é um vínculo com Deus que envolve a pessoa
inteira, mas, para ser guardado, precisa da Mãe de Deus. O seu olhar
materno ajuda a vermo-nos como filhos amados no povo fiel de Deus e a
amar-mo-nos entre nós, independentemente dos limites e opções de cada
um.”
“Nossa Senhora enraíza-nos na Igreja, onde a unidade conta mais do ue a
diversidade, e exorta-nos a cuidarmos uns dos outros. O olhar de Maria
lembra que, para a fé, é essencial a ternura, que impede a apatia.
Quando há lugar na fé para a Mãe de Deus, nunca se perde o centro: o
Senhor. Com efeito, Maria nunca aponta para Si mesma, mas para Jesus e
os irmãos, porque Maria é mãe.”
“Olhar da Mãe, olhar das mães. Um mundo que olha para o futuro,
privado de olhar materno, é míope. Aumentará talvez os lucros, mas
jamais será capaz de ver, nos homens, filhos. Haverá ganhos, mas não
serão para todos. Habitaremos na mesma casa, mas não como irmãos. A
família humana fundamenta-se nas mães. Um mundo, onde a ternura materna
acaba desclassificada a mero sentimento, poderá ser rico de coisas, mas
não rico de amanhã. A Mãe de Deus, ensina-nos o seu olhar sobre a vida e
volta o seu olhar para nós, para as nossas misérias.” “Esses vossos
olhos misericordiosos a nós volvei”, disse o Papa, citando um trecho da
oração da Salve Rainha.
Deixemo-nos abraçar
“Deixem-mo-nos abraçar”, sublinhou ainda Francisco. “Depois do olhar,
entra em cena o coração, no qual Maria, diz o Evangelho de hoje,
«conservava todas estas coisas, meditando-as» (Lc 2, 19). Por outras
palavras, Nossa Senhora tinha tudo no coração, abraçava tudo, eventos
favoráveis e contrários. E em tudo meditava, isto é, levava a Deus. Eis o
seu segredo. Da mesma forma, tem no coração a vida de cada um de nós:
deseja abraçar todas as nossas situações e apresentá-las a Deus.”
“Na vida fragmentada de hoje, onde nos arriscamos a perder o fio à
meada, é essencial o abraço da Mãe. Há tanta dispersão e solidão por aí!
O mundo está todo conetado, mas parece cada vez mais desunido.
Precisamos de nos confiar à Mãe. Na Sagrada Escritura, Ela abraça muitas
situações concretas e está presente onde há necessidade: vai encontrar a
prima Isabel, socorre os esposos de Caná, encoraja os discípulos no
Cenáculo... Maria é remédio para a solidão e a desagregação. É a Mãe da
consolação, a Mãe que “consola”: está com quem se sente só. Ela sabe
que, para consolar, não bastam as palavras; é necessária a presença. E
Maria está presente como mãe. Permitamos-lhe que abrace a nossa vida. Na
Salve Rainha, chamamos Maria de «vida nossa»: parece exagerado, porque a
vida é Cristo (cf. Jo 14, 6), mas Maria está tão unida a Ele e tão
perto de nós que não há nada melhor do que colocar a vida nas suas mãos e
reconhecê-la «vida, doçura e esperança nossa».
Deixemo-nos tomar pela mão
Por fim, “deixemo-nos tomar pela mão”, disse o Papa. “As mães tomam
pela mão os filhos e os introduz amorosamente na vida. Mas hoje, quantos
filhos, seguindo por conta própria, perdem a direção, crêem-se fortes e
extraviam-se, livres e tornam-se escravos! Quantos, esquecidos do
carinho materno, vivem zangados e indiferentes a tudo! Quantos,
infelizmente, reagem a tudo e a todos com veneno e maldade! Mostram-se
maus, às vezes, até parece um sinal de força; mas é só fraqueza!
Precisamos aprender com as mães que o heroísmo está em doar-se, a força para ter piedade, e a sabedoria na mansidão.”
“Deus não prescindiu da Mãe: por esta razão nós precisamos dela”. Ele doou-nos a sua Mãe “e não num momento qualquer, mas quando estava
pregado na cruz: «Eis a tua mãe» (Jo 19, 27), disse Ele ao discípulo, a
cada discípulo. Nossa Senhora não é opcional: deve ser acolhida na vida.
É a Rainha da paz, que vence o mal e guia pelos caminhos do bem, que
devolve a unidade entre os filhos, que educa para a compaixão.”
Francisco concluiu, pedindo a Maria para que nos tome pela mão, nos
ajude a superar “as curvas mais fechadas da história”, a “descobrir os
laços que nos unem”, a nos reunirmos “sob o seu manto, na ternura do amor
verdadeiro, onde se reconstitui a família humana”.
VN
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