O presidente da Comissão Episcopal do Laicado e Família, D. Joaquim
Mendes, faz o balanço da sua participação no Sínodo dos Bispos, sobre
‘Os jovens, a fé e o discernimento vocacional’, que decorreu, em
outubro, no Vaticano.
O
Sínodo dos Bispos decorreu, no Vaticano, durante mais de três semanas,
mas teve antes um longo processo de preparação, que foi acompanhando de
perto. O que é que mais o tocou, nesta assembleia?
A mim, o que mais me tocou foi a experiência eclesial, com representantes de todos os continentes, com Pedro e sob Pedro. Foi o que mais me tocou, profundamente.
É uma experiência de convivência, de diálogo, de partilha, de escuta, em que se aprende, de abertura ao Espírito, de discernir, que é o estilo próprio do Sínodo, da Igreja.
Houve algum testemunho em particular que lhe ficasse gravado?
Sim, o que mais me tocou foi o testemunho das Igrejas, sobretudo do Oriente, o testemunho de fé, do martírio. Quer do martírio branco, do ser cristão, professar a fé e ser fiel à identidade cristã, em contextos tão difíceis de perseguição e de violência; quer o martírio vermelho, do testemunho.
Nós vivemos num clima de paz, que pode ser um risco também, de adormecimento, acomodação. O contacto com estas experiências, com estas vivências, com estas partilhas, despertou em mim um olhar diferente, sair do meu mundo, da minha realidade… A gente queixa-se de coisas fúteis, enquanto ali as dificuldades são tão grandes e os cristãos enfrentam-nas com a fortaleza do Espírito e com uma fé viva. Impressionou-me.
Procurei também, perante algumas intervenções, aproximar-me do padre sinodal, para manifestar a minha solidariedade e a minha comunhão com ele e com o povo que ele representa, onde vive.
A assembleia teve uma configuração diferente, dada a grande presença de jovens no Sínodo, cerca de 10%. De que forma é que este contacto com realidades juvenis marcou os trabalhos?
Em primeiro lugar, para mim não é estranho: sou salesiano e o mundo juvenil, passe a expressão, é a minha praia. Estou à vontade com eles, ouvindo as suas preocupações, como o desejo de serem acompanhados, de haver disponibilidade de pessoas e recursos, na Igreja, para o acompanhamento dos jovens. É uma ideia muito forte, do acompanhamento, de haver recursos disponíveis para a formação de acompanhadores, para que as estruturas possam servir os jovens, a Pastoral Juvenil.
Outro tema de conversa foi a questão de uma pastoral orgânica, entre movimentos, paróquias e dioceses, num desejo de comunhão, de caminhar juntos, de um conhecimento recíproco, que enriquece e fortalece as várias dinâmicas.
Um outro aspeto que me tocou, também, é que estes jovens têm uma experiência do corpo eclesial, de Igreja. Uma experiência alargada, para além das suas paróquias, das suas vigararias, digamos assim, com participação nas Jornadas Mundiais da Juventude, encontros nacionais e internacionais dos seus próprios movimentos. São jovens profundamente inseridos no corpo eclesial e protagonistas, com este desejo de ajudar e acompanhar os outros jovens.
Este é um aspeto muito importante: hoje, a transmissão da fé e a evangelização já não se faz tanto, às vezes, pelos meios tradicionais, da família, etc., mas são os jovens que evangelizam outros jovens. Mesmo na minha experiência pastoral, dou-me conta de que os jovens que eu crismo, muitas vezes, chegaram ao percurso para o Crisma trazidos por outros jovens; a gente percebe isto quando eles os escolhem para padrinhos. É uma outra realidade, a que os jovens são muito sensíveis, para a qual a gente tem de estar despertos.
Eles pedem à Igreja que acompanhe, qualifique e amplie esta realidade, para que jovens possam acompanhar outros jovens. Para isso, é preciso que a Igreja lhes dê atenção e os acompanhe, os forme, caminhe com eles.
De que forma é que estes dias de trabalho, de contacto com outras realidades, vão marcar o pós-Sínodo, digamos assim, na vida de D. Joaquim Mendes?
Eu já tive oportunidade de participar em capítulos gerais da minha congregação, que exprimem esta universalidade de culturas, a diversidade de sensibilidades, de problemas. Mas o que mais vai marcar o meu percurso é este desejo da sinodalidade, que foi bastante acentuada neste Sínodo, que é o modo, o estilo de ser Igreja, de caminhar juntos, de discernir os caminhos que o Senhor nos aponta. Significa abertura, assumir o diálogo como método, como estilo da pastoral.
O facto de a assembleia sinodal ter tido no seu seio dezenas de jovens, era bom que isso fosse também possível nas nossas comunidades cristãs: que, quando fazemos uma visita pastoral, uma assembleia paroquial, que haja uma presença de jovens, para dialogarmos, olharmos juntos a realidade do território, os desafios, os problemas, como chegar aos últimos, aos pobres, às periferias.
No início do Sínodo foi muito celebrado o facto de o português ser uma língua oficial, pela primeira vez. De que forma é que esta novidade permitiu que a presença lusófona tivesse uma voz maior?
A língua permite uma maior comunicação, uma maior compreensão, a gente chega mais depressa ao pensamento, ao sentimento, à perceção do que a pessoa vive. Esse é um aspeto importante.
O nosso círculo [grupo de trabalho lusófono] foi uma experiência de muita fraternidade, de muita abertura, à vontade, com muita partilha. Parecia que nós conhecíamos desde sempre, apesar das realidades diferentes: os bispos do Brasil com umas preocupações, os da África com outras. Quando se fala dos problemas dos jovens, lá há questões como a migração ou a violação como arma de guerra…
Por outro lado, é uma língua falada por milhões de pessoas. O português faz todo o sentido que tenha lugar no Sínodo, na Igreja. Creio para alguns foi a primeira vez que ouviram falar o português de Portugal.
Eu tive a preocupação de falar devagar e falar aberto. Tive algumas manifestações de satisfação pelo facto de o Sínodo dos Bispos ter contemplado a língua portuguesa. Houve até um cardeal que me disse que ia aprender português. São também sinais de abertura.
Para nós também foi uma grande satisfação poder exprimir claramente o nosso sentir e o nosso pensar, as nossas ideias, as nossas propostas, na nossa língua.
Sentiu a falta de um jovem português?
Sim, por acaso, senti isso. Certamente, a organização teve critérios, mas muitos dos jovens que ali estavam participaram na reunião pré-sinodal, onde nós tivemos três portugueses, representantes da Conferência Episcopal e de movimentos. Estranhei, o quadro ficaria mais completo, mais enriquecido com a presença de qualquer um destes jovens.
Como foram as conversas com o Papa?
Eu, quando o saudava, dizia: "Bom dia!" Tive oportunidade de trocar com ele algumas ideias, em particular sobre a minha intervenção relativa ao ambiente familiar na Igreja. É também uma ideia que está no coração do Papa: Igreja-família, a Igreja família de famílias, a Igreja família para os que não têm família. Uma comunidade aberta. Foi muito gratificante, esta presença, ele está para nos acolher, isto é Igreja, isto é família.
Entrevista realizada em parceria para a Agência Ecclesia, Família Cristã, Flor de Lis, Rádio Renascença e Voz da Verdade, com o apoio da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre
A mim, o que mais me tocou foi a experiência eclesial, com representantes de todos os continentes, com Pedro e sob Pedro. Foi o que mais me tocou, profundamente.
É uma experiência de convivência, de diálogo, de partilha, de escuta, em que se aprende, de abertura ao Espírito, de discernir, que é o estilo próprio do Sínodo, da Igreja.
Houve algum testemunho em particular que lhe ficasse gravado?
Sim, o que mais me tocou foi o testemunho das Igrejas, sobretudo do Oriente, o testemunho de fé, do martírio. Quer do martírio branco, do ser cristão, professar a fé e ser fiel à identidade cristã, em contextos tão difíceis de perseguição e de violência; quer o martírio vermelho, do testemunho.
Nós vivemos num clima de paz, que pode ser um risco também, de adormecimento, acomodação. O contacto com estas experiências, com estas vivências, com estas partilhas, despertou em mim um olhar diferente, sair do meu mundo, da minha realidade… A gente queixa-se de coisas fúteis, enquanto ali as dificuldades são tão grandes e os cristãos enfrentam-nas com a fortaleza do Espírito e com uma fé viva. Impressionou-me.
Procurei também, perante algumas intervenções, aproximar-me do padre sinodal, para manifestar a minha solidariedade e a minha comunhão com ele e com o povo que ele representa, onde vive.
A assembleia teve uma configuração diferente, dada a grande presença de jovens no Sínodo, cerca de 10%. De que forma é que este contacto com realidades juvenis marcou os trabalhos?
Em primeiro lugar, para mim não é estranho: sou salesiano e o mundo juvenil, passe a expressão, é a minha praia. Estou à vontade com eles, ouvindo as suas preocupações, como o desejo de serem acompanhados, de haver disponibilidade de pessoas e recursos, na Igreja, para o acompanhamento dos jovens. É uma ideia muito forte, do acompanhamento, de haver recursos disponíveis para a formação de acompanhadores, para que as estruturas possam servir os jovens, a Pastoral Juvenil.
Outro tema de conversa foi a questão de uma pastoral orgânica, entre movimentos, paróquias e dioceses, num desejo de comunhão, de caminhar juntos, de um conhecimento recíproco, que enriquece e fortalece as várias dinâmicas.
Um outro aspeto que me tocou, também, é que estes jovens têm uma experiência do corpo eclesial, de Igreja. Uma experiência alargada, para além das suas paróquias, das suas vigararias, digamos assim, com participação nas Jornadas Mundiais da Juventude, encontros nacionais e internacionais dos seus próprios movimentos. São jovens profundamente inseridos no corpo eclesial e protagonistas, com este desejo de ajudar e acompanhar os outros jovens.
Este é um aspeto muito importante: hoje, a transmissão da fé e a evangelização já não se faz tanto, às vezes, pelos meios tradicionais, da família, etc., mas são os jovens que evangelizam outros jovens. Mesmo na minha experiência pastoral, dou-me conta de que os jovens que eu crismo, muitas vezes, chegaram ao percurso para o Crisma trazidos por outros jovens; a gente percebe isto quando eles os escolhem para padrinhos. É uma outra realidade, a que os jovens são muito sensíveis, para a qual a gente tem de estar despertos.
Eles pedem à Igreja que acompanhe, qualifique e amplie esta realidade, para que jovens possam acompanhar outros jovens. Para isso, é preciso que a Igreja lhes dê atenção e os acompanhe, os forme, caminhe com eles.
De que forma é que estes dias de trabalho, de contacto com outras realidades, vão marcar o pós-Sínodo, digamos assim, na vida de D. Joaquim Mendes?
Eu já tive oportunidade de participar em capítulos gerais da minha congregação, que exprimem esta universalidade de culturas, a diversidade de sensibilidades, de problemas. Mas o que mais vai marcar o meu percurso é este desejo da sinodalidade, que foi bastante acentuada neste Sínodo, que é o modo, o estilo de ser Igreja, de caminhar juntos, de discernir os caminhos que o Senhor nos aponta. Significa abertura, assumir o diálogo como método, como estilo da pastoral.
O facto de a assembleia sinodal ter tido no seu seio dezenas de jovens, era bom que isso fosse também possível nas nossas comunidades cristãs: que, quando fazemos uma visita pastoral, uma assembleia paroquial, que haja uma presença de jovens, para dialogarmos, olharmos juntos a realidade do território, os desafios, os problemas, como chegar aos últimos, aos pobres, às periferias.
No início do Sínodo foi muito celebrado o facto de o português ser uma língua oficial, pela primeira vez. De que forma é que esta novidade permitiu que a presença lusófona tivesse uma voz maior?
A língua permite uma maior comunicação, uma maior compreensão, a gente chega mais depressa ao pensamento, ao sentimento, à perceção do que a pessoa vive. Esse é um aspeto importante.
O nosso círculo [grupo de trabalho lusófono] foi uma experiência de muita fraternidade, de muita abertura, à vontade, com muita partilha. Parecia que nós conhecíamos desde sempre, apesar das realidades diferentes: os bispos do Brasil com umas preocupações, os da África com outras. Quando se fala dos problemas dos jovens, lá há questões como a migração ou a violação como arma de guerra…
Por outro lado, é uma língua falada por milhões de pessoas. O português faz todo o sentido que tenha lugar no Sínodo, na Igreja. Creio para alguns foi a primeira vez que ouviram falar o português de Portugal.
Eu tive a preocupação de falar devagar e falar aberto. Tive algumas manifestações de satisfação pelo facto de o Sínodo dos Bispos ter contemplado a língua portuguesa. Houve até um cardeal que me disse que ia aprender português. São também sinais de abertura.
Para nós também foi uma grande satisfação poder exprimir claramente o nosso sentir e o nosso pensar, as nossas ideias, as nossas propostas, na nossa língua.
Sentiu a falta de um jovem português?
Sim, por acaso, senti isso. Certamente, a organização teve critérios, mas muitos dos jovens que ali estavam participaram na reunião pré-sinodal, onde nós tivemos três portugueses, representantes da Conferência Episcopal e de movimentos. Estranhei, o quadro ficaria mais completo, mais enriquecido com a presença de qualquer um destes jovens.
Como foram as conversas com o Papa?
Eu, quando o saudava, dizia: "Bom dia!" Tive oportunidade de trocar com ele algumas ideias, em particular sobre a minha intervenção relativa ao ambiente familiar na Igreja. É também uma ideia que está no coração do Papa: Igreja-família, a Igreja família de famílias, a Igreja família para os que não têm família. Uma comunidade aberta. Foi muito gratificante, esta presença, ele está para nos acolher, isto é Igreja, isto é família.
Entrevista realizada em parceria para a Agência Ecclesia, Família Cristã, Flor de Lis, Rádio Renascença e Voz da Verdade, com o apoio da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre
Patriarcado de Lisboa
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