Na manhã de
segunda-feira o Papa Francisco teve uma conversa franca e aberta com um
grupo de jovens franceses da Diocese de Grenoble-Vienne, quando falou
de diversos temas, em respostas às perguntas a ele dirigidas: Igreja,
vocações, pobreza, sexualidade.
Cidade do Vaticano
Os males que afligem a Igreja, proximidade com os pobres, vocações,
sexualidade, compromisso dos cristãos na sociedade. A audiência de ontem
do Papa Francisco aos jovens da Diocese de Grenoble-Vienne -cujo
conteúdo foi divulgado nesta terça-feira pela Sala de Imprensa -
transforma-se num diálogo franco e aberto, mas acima de tudo paterno. O
Papa respondeu a perguntas desde adolescente de 14 anos até jovens de 27.
Selecionamos algumas perguntas:
Matthieu: Santo Padre, o meu nome é Mathieu, tenho 16 anos e
os meus amigos, no ensino médio, azem-me perguntas sobre eventos atuais em
que a Igreja é duramente criticada, como a homossexualidade ou a
pedofilia. Eu respondo-lhes o que os animadores me ensinaram, mas no
fundo eu não acredito realmente nisso ...
Rémy: Santo Padre, o meu nome é Rémy, tenho 14 anos e esta é
a minha pergunta: como atualizar, hoje, a mensagem da Igreja para que eu
possa compreendê-la e retransmiti-la para jovens que não necessariamente
acreditam?
Papa Francisco
Não é fácil para mim responder em francês a esta sua pergunta: Eu
direi uma palavra, uma palavra que é o segredo para transmitir a
mensagem da Igreja: proximidade, proximidade. O que significa isso?
Significa, antes de mais nada, fazer o que Deus fez com o seu povo. No
livro de Deuteronómio, Deus diz assim ao povo: "Qual o povo que tem os seus
deuses tão próximo deles, como vós?” Deus fez-se próximo de seu povo.
Mas isso não terminou aqui. Ele queria estar tão próximo que ele se fez um
de nós, homem. Essa proximidade cristã é o primeiro passo: na verdade, é
"o ambiente", o clima no qual a mensagem cristã deve ser transmitida. A
mensagem cristã é uma mensagem de proximidade.
Então, sobre effatà: antes de falar, ouvir. O apostolado da
"orelha": ouvir, ouvir. "E depois, padre, fala?" Não, pare. Antes de
falar, fazer. Certa vez, um jovem universitário fe-me essa pergunta:
"Eu tenho muitos amigos na universidade que são agnósticos, o que devo
dizer-lhes para que se tornem cristãos?". Eu disse: a última coisa que tem que fazer é dizer coisas. A última. Primeiro tens que
fazer, e eles verão como lidas com a vida. Eles irão perguntar-te: "Por que estáa a fazer isso?" E então ali podes falar. O
testemunho antes da palavra. Este é o contesto da mensagem cristã.
Ecouter, faire, e depois dizer, falar.
Além disso, a mensagem cristã não pode ser transmitida "em
poltrona": ela está sempre em caminho. Sempre. Se não te colocares em
caminho, não serás capaz de transmiti-la. Jesus esteve três anos em
caminho. Parecia que ele vivia na estrada. No caminho, sempre, a fazer
alguma coisa. No caminho. Ouvir, testemunhar, responder às perguntas,
mas em caminho. Um jovem que não se coloca em caminho é um jovem
aposentado aos vinte anos de idade. É mau aposentar-se aos vinte anos!
Eu não sei ... respondi à sua pergunta ou não? Sim? consegues repetir?
Em frente ...
Gabriel: Bom dia Santo Padre. Eu sou Gabriel, tenho 21 anos.
Com os jovens do departamento de Isère, somos animados pelo desejo de
nos colocar ao serviço dos pobres que nos cercam. Pessoalmente, acho
difícil viver a solidariedade na Igreja: preciso de estar acompanhado e
orientado a viver a caridade de maneira concreta.
Clara-Marie: Santo Padre, o meu nome é Clara-Marie e tenho 16
anos. A minha pergunta: o que se pode esperar de nós, jovens cristãos,
para viver concretamente essa caridade?
Papa Francisco
Os dois têm o mesmo tema. Os pobres estão no centro do Evangelho.
Quando eu era seminarista e jovem padre na América Latina, era o tempo
de 68; vocês também conheceram. O que era mais importava era a guerrilha, o
trabalho político ... E se um padre fazia um trabalho com os pobres,
esse era "comunista". Porque a situação política era assim ...
Parecia que o único grupo que se aproximava dos pobres e lutava por
justiça eram os comunistas. É ao contrário: o Evangelho, o Evangelho
coloca os pobres no centro. Antes ainda, coloca a pobreza no centro. Se
não tens uma pobreza de espírito, não serás um bem-aventurado,
um bom cristão. É a primeira das bem-aventuranças: os pobres, os pobres
de espírito. Depois, aproximares-te dos pobres, mas não de cima para
baixo. É lícito olhar para uma pessoa de cima para baixo apenas quando te inclinas para levantá-la. Noutras situações, não é permitido
olhar para uma pessoa de cima para baixo. Ir aos pobres no mesmo nível,
servir os pobres porque eles são a imagem de Cristo. E quando digo
pobre, digo pobres de tudo: também os pobres de saúde, os doentes; os
pobres de dinheiro; os pobres de cultura; os pobres que caíram nos
vícios, na dependência. Quantos dos seus companheiros estão nas drogas,
por exemplo: são pobres, pobres do Evangelho. "Mas não, o que está na
droga tem muito dinheiro e uma família rica, aquele não é um homem
pobre". Não, ele é um homem pobre, é um pobre. Aproxima-te do pobre para
servi-lo. Aproxima-te do pobre para levantá-lo. Mas levantá-lo junto,
ajoelhando-te e pegando-o. Quando tocas na doença de um homem pobre, estás a tocar nas feridas de Cristo. Isto é um pouco "o sentido dos
pobres na Igreja". Ça va bien?
Thérèse: Bom dia, Santo Padre, o meu nome é Thérèse, tenho 24
anos. Várias vezes, na minha vida pessoal, confidenciei com pessoas
maiores sobre problemas de amor e sexualidade. Cada vez mais, me encontrava
diante de uma falta de atenção e compreensão; tive a sensação de não ser
ouvida. Acho que isso acontece porque somos a primeira geração que fala
e que, especificamente, fala sobre esses temas.
Manon:O meu nome é Manon e tenho 16 anos. Repentinamente, esses
tópicos tornam-se complicados; se se ouve tudo de alguém, se xd vê tantas
coisas, há tantas opiniões diferentes ... Em geral, sentimo-nos perdidos.
Como se posicionarnos, numa sociedade em que o corpo está dessacralizado?
Papa Francisco
A sexualidade, o sexo, é um dom de Deus. Nada de tabus. É um dom
de Deus, um dom que o Senhor nos dá. Tem dois propósitos: amar e gerar
vida. É uma paixão, é o amor apaixonado. O verdadeiro amor é apaixonado.
O amor entre um homem e uma mulher, quando é apaixonado, leva-te a
dar vida para sempre. Sempre. E a dá-la com o corpo e a alma. Quando
Deus criou o homem e a mulher, a Bíblia diz que os dois são a imagem e
semelhança de Deus. Ambos, não somente Adão ou somente Eva, mas ambos. E
Jesus vai mais longe e diz: por isto o homem, e também a mulher,
deixará o seu pai e sua mãe e se unirão e serão ... uma só pessoa? ... uma
só identidade? ... uma só fé do matrimónio? ... Uma só carne: esta é a
grandeza da sexualidade. E se deve falar sobre a sexualidade assim. E se
deve viver a sexualidade assim, nesta dimensão: do amor entre homem e
mulher por toda a vida. É verdade que as nossas fraquezas, as nossas quedas
espirituais levam-nos a usar a sexualidade fora desse caminho tão
bonito, do amor entre o homem e a mulher. Mas caíram, como todos os
pecados. A mentira, a ira, a gula ... São pecados: pecados capitais. Mas
esta não é a sexualidade do amor: é a sexualidade "coisificada",
separada do amor e usada para se divertir. É interessante como a
sexualidade é o ponto mais bonito da criação, no sentido de que o homem e
a mulher são criados à imagem e semelhança de Deus, e a sexualidade é a
mais atacada pela mundanidade, pelo espírito do mal. Diga-me:viste,
por exemplo - eu não sei se há em Grenoble - mas viste uma indústria
da mentira, por exemplo? Não. Mas uma indústria da sexualidade separada
do amor, viste? Sim! Tanto dinheiro é ganho com a indústria da
pornografia, por exemplo. É uma degeneração comparada ao nível em que
Deus a colocou. E com este comércio ganha-se muito dinheiro. Mas a
sexualidade é grande: protejam a vissa dimensão sexual, sa vossa identidade
sexual. Protejam-na bem. E preparem-na para o amor, para inseri-la nesse
amor que irá acompanhá-los por toda a vida. Eu vou contar-vos uma coisa, e depois vou contar uma outra. Na Praça [São Pedro] uma vez -
saúdei as pessoas na Praça - havia duas pessoas grandes, idosas, que
celebravam o sexagésimo aniversário de casamento. Estavam radiantes! E
eu perguntei: "Brigaram muito?" - "Bem, às vezes ..." - "E vale a pena
isto, o matrimónio?" - E estes dois, que me olhavam, olharam um para o
outro e, de seguida, voltaram o olhar novamente para mim, e tinham
os olhos molhados, e disseram-me: "Estamos apaixonados". Depois de 60
anos! E depois eu queria dizer-vos isto a vós: uma vez um idoso - muito
idoso, com a esposa velha - disse-me: "Nós nos amamos tanto, tanto, e às
vezes nos abraçamos. Nós não podemos fazer amor na nossa idade, mas nós
nos abraçamos, nos beijamos ... Esta é a verdadeira sexualidade. Nunca
separá-la do lugar tão lindo do amor. É preciso falar assim da
sexualidade. Ça va?
Emilie: Eu tenho outra pergunta, Santo Padre: nos seus inícios,
a Igreja era omnipresente na sociedade, era um modelo a seguir. Hoje, a
sociedade evoluiu e a França é um país secular em que o número de
cristãos diminuiu fortemente. A igreja ainda tem o seu lugar? E para que
serve? É por isso que lhe pergunto, Santo Padre: por que envolver-se numa instituição que às vezes me parece sem sentido e sem colocação?
Papa Francisco
A sua pergunta é muito realista, muito realista. Isso me faz pensar num fã de futebol que é contratado por uma equipa e a equipa começa a
cair, cair, cair e questiona-se: como fico eu nesta equipa? Talvez ele
diga: não, não, mudo de equipa. Se ele não tem uma grande paixão por
essa equipa, mas tem uma paixão pelo futebol, escolhe outra equipa que
jogue melhor. Muda de equipa, muda de instituição. Mas pertencer à Igreja,
antes de tudo, não é pertença a uma instituição, é pertença à pessoa, a
Jesus. No Domingo de Ramos, Jesus estava em triunfo; quando ele fez a
multiplicação dos pães queriam fazê-lo rei - uma bela instituição
aquela! - mas na Sexta-feira Santa estava crucificado. Trata-se de
seguir Jesus, não seguir as consequências de Jesus. Nem as consequências
sociais: se a Igreja é grande ou pequena ... não, mas Jesus. Segui-lo
nos momentos tranquilos, quando a Igreja floresce; e segui-lo no momento
em que a Igreja está em crise. Tome a história da Igreja: com a Igreja
foi assim. A Igreja não foi levada adiante pelas grandes organizações,
grandes partidos políticos, grandes instituições ... Não. A Igreja foi
levada em frente pelos santos. E no dia de hoje serão os santos a
levá-la em frente, não nós, nem mesmo o Papa. Não, os santos. Eles abrem
caminho diante de nós. E porquê os santos? Porque eles seguem Jesus, a
fé não é uma ideia: é um encontro com Jesus. Eu faço votos para que este
encontro acompanhe-vos por toda a vida.
Pauline: Bom dia, Santo Padre, o meu nome é Pauline e
tenho 27 anos. Ouvindo os testemunhos, como acompanhar a vocação de cada
um neste contexto?
Papa Francisco
A vocação é um dom de Deus e devemos custodiá-la. Referiste-te
às vocações sacerdotais, à vida religiosa ou a todas as vocações?
[Resposta da jovem: às vocações religiosas e sacerdotais]
O Senhor chama. E a pessoa chamada diz: "Eu quero ser freira,
quero ser padre, quero ser religiosa ...". E começa um caminho, para ser
acompanhado com normalidade. Normalidade. Eu tenho medo dos
seminaristas que fazem isso [que assumem uma "pose"], eu tenho medo,
porque eles não são normais. Queres ser padre? Deves ser um homem
verdadeiro que segue em frente. Queres ser freira? Deves ser uma
mulher madura que segue em frente. Nunca renegar a humanidade. Que
sejam normais, porque o mal que faz um padre neurótico é terrível! E o
mal que pode fazer uma freira neurótica é terrível! Acompanhá-los na
normalidade: primeiro. Segundo: acompanhá-los na fé. Que cresçam na fé, no compreender a beleza de Deus, no compreender o caminho de Jesus, e
que tua vida mude na relação com a oração. Terceiro: acompanhá-los na
pertença comunitária. Um padre isolado da comunidade não está certo: ele
é um "solteirão". Solteirão é quem não se casa e fica velho. O que não
se casa e toda a vida permanece sozinho. Célibataire, mas eu disse uma
palavra mais forte. Não, o sacerdote não deve ser um "solteirão"
isolado, ele deve ser um padre. A paternidade: educá-los na paternidade.
E também na fraternidade. O mesmo acontece com a freira: a freira deve
aprender a ser mãe de tantas pessoas e a comunidade também. Mas a freira
tem uma vantagem em relação ao sacerdote, uma grande vantagem - é por
isso que acredito que as freiras são mais importantes do que os sacerdotes -
neste sentido: elas são o ícone de Maria e da Igreja. É belo! O ícone
de Maria. Uma freira é o ícone de Nossa Senhora e da Igreja. Educá-la
assim e numa comunidade. Ajudá-los a crescer e acompanhá-los”.
VATICAN NEWS
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