01 maio, 2020

O Papa: a ninguém falte o trabalho, a dignidade do trabalho e a justa retribuição




Na Missa na Casa de Santa Marta, no Vaticano, nesta sexta-feira, 1º de maio, na memória de São José operário, o Papa rezou por todos os trabalhadores para que sejam justamente retribuídos, possam ter um trabalho digno e gozar da beleza do repouso 

VATICAN NEWS 

Francisco presidiu a Missa na Casa de Santa Marta, no Vaticano, na manhã desta sexta-feira, 1º de maio, em que a Igreja recorda São José operário. Encontrava-se na capela do Espírito Santo uma imagem de São José artesão, levada para esta ocasião pelas Acli, as Associações cristãs dos trabalhadores italianos. Na introdução, o Papa dirigiu o seu pensamento ao mundo do trabalho:

Hoje, que é aesta de São José operário, também Dia dos Trabalhadores, rezemos por todos os trabalhadores. Por todos. Para que não falte trabalho a nenhuma pessoa e todos sejam justamente retribuídos e possam gozar da dignidade do trabalho e da beleza do repouso.

Na homilia, o Papa comentou a passagem da leitura do dia do Livro do Gênesis (Gn 1,26-2,3) em que é descrita a criação do homem à imagem e semelhança de Deus. “No sétimo dia, Deus considerou acabada toda a obra que tinha feito; e no sétimo dia descansou de toda a obra que fizera”.

Deus – afirmou Francisco – entrega a sua atividade, o seu trabalho, ao homem, para que colabore com Ele. O trabalho humano é a vocação recebida por Deus e torna o homem semelhante a Deus porque com o trabalho o homem é capaz de criar. O trabalho dá a dignidade. Dignidade tão espezinhada na história. Também hoje há muitos escravos, escravos do trabalho para sobreviver: trabalhadores forçados, mal pagos, com a dignidade espezinhada. Tira-se a dignidade das pessoas. Também aqui onde estamos acontece – observou o Papa – com os trabalhadores diaristas com uma retribuição mínima por muitas horas trabalhadas, com a doméstica a quem não se paga o justo e sem a segurança social e a aposentasção. Isto acontece aqui: é espezinhar a dignidade humana. Toda a injustiça que se faz ao trabalhador é espezinhar a dignidade humana. Hoje, unim-nos a tantas pessoas crentes e não-crentes que celebram este dia do trabalhador por aqueles que lutam para haver justiça no trabalho. O Papa rezou por aqueles bons empresários que não querem demitir as pessoas, que protegem os trabalhadores como se fossem filhos, e rezou a São José para que nos ajude a lutar pela dignidade do trabalho, a fim de que haja trabalho para todos e que seja um trabalho digno.

A seguir, o texto da homilia transcrita pelo Vatican News:

Deus criou. Um Criador. Criou o mundo, criou o homem e deu uma missão, ao homem: administrar, trabalhar, levar a criação adiante. E a palavra “trabalho” é a que a Bíblia usa para descrever esta atividade de Deus: “Considerou acabada toda a obra que tinha feito; e no sétimo dia descansou de toda a obra feita”, e entregou esta atividade ao homem: “Tu deves fazer isto, custodiar aquilo, aquile outro, deves trabalhar para criar comigo – é como se assim dissesse – este mundo, para que siga adiante”. A tal ponto que o trabalho nada mais é do que a continuação do trabalho de Deus: o trabalho humano é a vocação do homem recebida de Deus para a finalidade da criação do universo.

E o trabalho é aquilo que torna o homem semelhante a Deus, porque com o trabalho o homem é criador, é capaz de criar, de criar muitas coisas, inclusive criar uma família para seguir adiante. O homem é um criador e cria com o trabalho. Esta é a vocação. E a Bíblia diz que “Deus viu tudo quanto tinha feito, e eis que tudo era muito bom”. Isto é, o trabalho tem intrinsecamente uma bondade e cria a harmonia das coisas – beleza, bondade – e envolve o homem em tudo: no seu pensamento, no seu agir, tudo. O homem é envolvido no trabalhar. É a primeira vocação do homem: trabalhar. E isto dá dignidade ao homem. A dignidade que o faz semelhante a Deus. A dignidade do trabalho.

Uma vez, numa Caritas, uma sua funcionária disse a um homem que não tinha trabalho e deslocava-se à Caritas buscar alguma coisa para a família: “O senhor pode ao menos levar o pão para casa” – “Mas isto não me basta, não é suficiente”, foi a resposta: “Eu quero ganhar o pão para levá-lo para casa”. Faltava-lhe a dignidade, a dignidade de ser ele a “fazer” o pão, com o seu trabalho, e levá-lo para casa. A dignidade do trabalho, que é tão espezinhada, infelizmente. Na história lemos as brutalidades que faziam com os escravos: levavam-no da África para a América – penso naquela história que diz respeito à minha terra – e nós dizemos “quanta barbárie”... Mas também hoje há muitos escravos, muitos homens e mulheres que não são livres para trabalhar: são obrigados a trabalhar, para sobreviver, nada mais. São escravos: os trabalhos forçados... são trabalhos forçados, injustos, mal pagos e que levam o homem a viver com a dignidade espezinhada. São muitos, muitos no mundo. Há slguns meses atrás lemos nos jornais, naquele país da Ásia, como um senhor tinha matado à pauladas um seu funcionário que ganhava menos de meio dólar por dia, por uma coisa que tinha saído mal feita por este. A escravidão de hoje é a nossa “indignidade”, porque tolhe a dignidade ao homem, à mulher, a todos nós. “Não, eu trabalho, tenho a minha dignidade”: sim, mas os seus irmãos, não. “Sim, padre, é verdade, mas isto, como está tão distante, tenho dificuldade em entender. Mas aqui onde estamos...”: também aqui, entre nós. Aqui, entre nós. Pense nos trabalhadores, os diaristas, que fazes trabalhar por uma retribuição mínima e não oito, mas doze, quatorze horas por dia: isto acontece hoje, aqui. No mundo inteiro, mas também aqui. Pensa na doméstica que não tem a justa retribuição, que não tem assistência social de segurança, que não tem capacidade para se aposentar: isto não acontece somente na Ásia. É aqui também.

Toda a injustiça feita a uma pessoa que trabalha é espezinhar a dignidade humana, inclusive a dignidade de quem faz a injustiça: abaixa-se o nível e acaba-se naquela tensão de ditador-escravo. Ao contrário, a vocação que Deus nos dá é muito bonita: criar, re-criar. Trabalhar. Mas isto pode ser feito quando as condições são justas e se respeita a dignidade da pessoa.

Hoje unimo-nos a muitos homens e mulheres, crentes e não-crentes, que comemoram hoje o dia do Trabalhador, o Dia do Trabalho, por aqueles que lutam para ter uma justiça no trabalho, por eles – bons empresários – que levam o trabalho em frente com justiça, mesmo com perdas.


Uma passagem da homilia do Papa Francisco
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Há dois meses atrás ouvi por telefone um empresário, aqui, em Itália, que me pedia para rezar por ele porque não queria demitir ninguém e disse assim: “Porque demitir um deles é demitir-me”. Esta consciência de muitos bons empresários, que protegem os trabalhadores como se fossem filhos. Rezemos também por eles. E peçamos a São José – com este ícone tão bonito com os instrumentos de trabalho nat mãos – que nos ajude a lutar pela dignidade do trabalho, a fim de que haja trabalho para todos e que seja trabalho digno. Não trabalho de escravo. Essa seja a oração hoje.

O Santo Padre terminou a celebração com a adoração e a bênção eucarística, convidando a fazer a Comunhão espiritualA seguir, a oração recitada pelo Papa:

Aos vossos pés, ó meu Jesus, me prostro e vos ofereço o arrependimento do meu coração contrito que mergulha no seu nada na Vossa santa presença. Eu vos adoro no Sacramento do vosso amor, a inefável Eucaristia. Desejo receber-vos na pobre morada que o meu coração vos oferece; à espera da felicidade da comunhão sacramental, quero possuir-vos em Espírito. Vinde a mim, ó meu Jesus, que eu venha a vós. Que o vosso amor possa inflamar todo o meu ser, para a vida e para a morte. Creio em vós, espero em vós. Amo-vos. Assim seja.

Antes de deixar a Capela dedicada ao Espírito Santo foi entoada a antífona mariana “Regina caeli”, cantada no tempo pascal:

Rainha dos céus, alegrai-vos. Aleluia!
Porque Aquele que merecestes trazer em vosso seio. Aleluia!
Ressuscitou como disse. Aleluia!
Rogai por nós a Deus. Aleluia!
D./ Alegrai-vos e exultai, ó Virgem Maria. Aleluia!
C./ Porque o Senhor ressuscitou, verdadeiramente. Aleluia! 

Vídeo integral da Missa:



VN

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