Papa no Aerodrómo de Maquehue, em Temuco (Vatican Media) |
A riqueza duma terra nasce precisamente do facto de cada parte saber partilhar a sua sabedoria com as outras.
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Cidade do Vaticano
O Papa Francisco celebrou a missa pelo progresso dos povos, nesta
quarta-feira (17/01), no Aeródromo de Maquehue, em Temuco, no Chile,
primeira etapa de sua 22ª viagem apostólica internacional.
O Pontífice iniciou a homilia dando graças a Deus por visitar "esta
parte linda do nosso continente, a Araucânia: terra abençoada pelo
Criador com a fertilidade de imensos campos verdes, com florestas cheias
de imponentes araucárias – o quinto elogio de Gabriela Mistral a esta
terra chilena –, os seus majestosos vulcões cobertos de neve, os seus lagos e
rios cheios de vida.
"Esta paisagem eleva-nos a Deus, sendo fácil ver a sua mão em cada
criatura. Muitas gerações de homens e mulheres amaram, e amam, este solo
com ciosa gratidão."
“Esta terra, se a virmos com olhos de turista, deixar-nos-á
extasiados, mas depois continuaremos a nossa estrada como antes; se,
pelo contrário, nos aproximarmos do solo, ouvi-lo-emos cantar: «Arauco
tem uma pena que não posso calar, são injustiças de séculos que todos
veem aplicar»”, frisou Francisco.
“É neste contexto de ação de graças por esta terra e pelo seu povo,
mas também de tristeza e dor, que celebramos a Eucaristia. E fazemo-lo
neste aeródromo de Maquehue, onde se verificaram graves violações de
direitos humanos.
"O sacrifício de Jesus na cruz está repleto de todo o pecado e do sofrimento dos nossos povos, um sofrimento a ser resgatado.
“No Evangelho que ouvimos, Jesus pede ao Pai que «todos sejam um só».
Numa hora crucial da sua vida, detém-Se a pedir a unidade. O seu
coração sabe que uma das piores ameaças que atinge, e atingirá, o seu
povo e toda a humanidade será a divisão e o conflito, a subjugação de
uns pelos outros. Quantas lágrimas derramadas!
Hoje queremos agarrar-nos a esta oração de Jesus, queremos entrar
com Ele neste horto de dor, também com as nossas dores, para pedir ao
Pai com Jesus: que também nós sejamos um só. Não permitais que nos vença
o conflito nem a divisão.”
Segundo o Papa, “esta unidade, implorada por Jesus, é um dom que
devemos pedir insistentemente pelo bem da nossa terra e seus filhos. E é
necessário estar atento a eventuais tentações que possam aparecer e
«contaminar pela raiz» este dom com que Deus nos quer presentear e com o
qual nos convida a ser autênticos protagonistas da história.”
Os falsos sinónimos
“Uma das principais tentações a enfrentar é confundir unidade com
uniformidade. Jesus não pede a seu Pai que todos sejam iguais,
idênticos; pois a unidade não nasce, nem nascerá, de neutralizar ou
silenciar as diferenças. A unidade não é uma simulação de integração
forçada nem de marginalização harmonizadora.
Não é, nem será, uma uniformidade asfixiante que normalmente nasce do
predomínio e da força do mais forte, nem uma separação que não
reconheça a bondade dos outros.
A unidade pedida e oferecida por Jesus reconhece o que cada povo, cada cultura são convidados a oferecer a esta terra abençoada.
Precisamos da riqueza que cada povo pode oferecer, pondo de lado a
lógica de pensar que há culturas superiores ou inferiores. Um belo
chamal [manto] requer tecelões que conheçam a arte de harmonizar os
diferentes materiais e cores; que saibam dar tempo a cada coisa e a cada
fase. Poder-se-á imitar de modo industrial, mas todos reconheceremos
que é uma peça de roupa confecionada sinteticamente.
A arte da unidade precisa e requer artesãos autênticos que saibam
harmonizar as diferenças nos «laboratórios» das aldeias, das estradas,
das praças e das paisagens. Não é uma arte de escrivaninha ou feita
apenas de documentos; é uma arte de escuta e reconhecimento. Nisto se
enraíza a sua beleza e também a sua resistência ao desgaste do tempo e
às inclemências que terá de enfrentar.”
“A unidade, de que necessitam os nossos povos, requer que nos
escutemos, mas sobretudo que nos reconheçamos, o que não significa
apenas «receber informações sobre os outros (…), mas recolher o que o
Espírito semeou neles como um dom também para nós».
Isto introduz-nos no caminho da solidariedade como forma de tecer a
unidade, como forma de construir a história; solidariedade, que nos leva
a dizer: temos necessidade uns dos outros com as nossas diferenças,
para que esta terra continue a ser linda."
As armas da unidade
“A unidade, se quer ser construída a partir do reconhecimento e da
solidariedade, não pode aceitar um meio qualquer para esse fim. Há duas
formas de violência que, em vez de fomentar os processos de unidade e
reconciliação, acabam por os ameaçar. Em primeiro lugar, devemos estar atentos à elaboração de acordos «lindos», que nunca se concretizam.
Palavras bonitas, planos terminados sim – e necessários – mas que,
por não se tornarem concretos, acabam por «borratar com o cotovelo o que
se escreveu com a mão». Isto também é violência, porque frustra a
esperança.”
Em segundo lugar, é imprescindível defender que uma cultura do
reconhecimento mútuo não se constrói com base na violência e destruição,
que acaba por ceifar vidas humanas. Não se pode pedir reconhecimento, aniquilando o outro, porque a única coisa que isso gera é maior violência e divisão. ]
A violência acaba por tornar falsa a causa mais justa. Por isso,
digamos «não à violência que destrói», em qualquer uma dessas duas
formas.
Estas atitudes são como lava de vulcão que tudo destrói, tudo queima,
deixando atrás de si apenas esterilidade e desolação. Em vez disso,
procuremos o caminho da não-violência ativa, «como estilo duma política
de paz». Nunca nos cansemos de procurar o diálogo para a unidade. Por
isso, digamos vigorosamente: Senhor, fazei-nos artesãos de unidade.
Todos nós que, de certo modo, somos povo formado da terra (cf. Gn
2, 7), somos chamados ao bom viver (Küme Mongen), como no-lo recorda a
sabedoria ancestral do povo Mapuche.
Quanto caminho a percorrer, quanto caminho para aprender! Küme
Mongen, um anseio profundo que brota não só dos nossos corações, mas
ressoa como um grito, como um canto em toda a criação. Por isso, irmãos,
pelos filhos desta terra, pelos filhos dos seus filhos, digamos com
Jesus ao Pai: que também nós sejamos um só; fazei-nos artesãos de
unidade.
VATICAN NEWS
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