(RV) Na manhã
desta terça-feira 21 de fevereiro, às 10.30, o Papa Francisco recebeu
em audiência, na Sala Clementina, no Vaticano, cerca de 250
participantes no Fórum internacional sobre as migrações que tem lugar
hoje e amanhã em Roma, por iniciativa do Dicastério para o Serviço do
Desenvolvimento Integral, pelos Missionários Escalabrinianos e pela
Fundação Adenauer. Tema: “Integração e Desenvolvimento: da reacção à
acção”.
No seu amplo discurso sobre um assunto que lhe está particularmente a
peito – as migrações - o Papa Francisco disse que não é possível ler
os actuais desafios dos movimentos migratórios contemporâneos sem
incluir o binómio “desenvolvimento e integração” e disse que foi para
este fim que quis instituir o Dicastério para o Serviço do
Desenvolvimento Integral com uma secção sobre migrantes, refugiados e
vítimas da trata.
Francisco fez notar depois que as migrações, anélito profundo do ser
humano à felicidade, marcaram desde sempre a humanidade. Não são,
portanto, um fenómeno de hoje. Aliás, para nós cristãos, é toda a vida
que é vista como um itinerário em direcção à pátria celeste. Hoje,
infelizmente, prosseguiu, estamos a viver uma época fortemente
caracterizada por migrações, de pessoa, para não dizer de povos.
Trata-se, de facto, “em grande parte dos casos”, “de deslocações
forçadas, causadas por conflitos, desastres naturais, perseguições,
mudanças climáticas, violências, pobreza extrema e condições de vida
indignas”.
Um cenário que interpela políticos, sociedade civil, Igreja, e pede
respostas ainda mais urgentes, coordenadas e eficazes. Preocupado,
Francisco sugere respostas articuladas entorno de quatro verbos:
acolher, proteger, promover, integrar. E desenvolveu cada um deles:
Acolher: na óptica de Francisco urge uma mudança de
atitude para ultrapassar a indiferença em relação a esses irmãos e
antepor ao temor uma generosa atitude de acolhimento em relação a quem
bate à nossa porta. Há também que abrir canais humanitários acessíveis e
seguros para os que fogem de guerras. Um acolhimento responsável e
digno começa – frisa o Papa – por uma colocação desses irmãos e irmãs em
espaços adequados e decorosos, não grandes aglomerados, cujo resultado
tem sido o surgir de outras vulnerabilidades e mal-estares, mas sim
programas de acolhimento mais capilares que parecem ter facilitado o
encontro pessoal, uma melhor qualidade dos serviços, e maiores garantias
de sucesso.
O verbo proteger levou o Papa a recordar os milhões de migrantes -
como requerentes asilo, as vítimas da trata, aos indocumentados… mais
expostos a abusos e violências. Protegê-los – disse – é um imperativo
moral que deve ser traduzido em instrumentos jurídicos políticos
internacionais e nacionais, claros e pertinentes, justos e
clarividentes. Nessa luta coordenada contra, de modo particular, “os
traficantes de carne humana” que lucram com as desventuras dos outros,
“podeis estar certos de que estará sempre a Igreja.”
No capítulo “Promover”, o Papa sublinha que não
basta promover o desenvolvimento integral de migrantes, prófugos e
refugiados. A Doutrina Social da Igreja ensina que o desenvolvimento é
um direito inalienável de cada ser humano. E como tal a sua
concretização deve ser assegurada tanto a nível individual como social,
dando a todos um acesso équo às possibilidade de escolha e de
crescimento. Aqui também é necessário – recordou Francisco – uma acção
coordenada de todas as forças vivas, incluindo as instituições
religiosas. E mandou um recado aos países de origem dos emigrados:
“A promoção humana dos migrantes e das suas famílias começa
nas comunidades de origem, lá onde deve ser garantido, juntamente com o
direito de poder emigrar, também o direito de não ter que emigrar, ou
seja o direito de encontrar na própria pátria condições que permitam uma
realização digna da existência”.
E neste contexto, Francisco encorajou os programas de cooperação
internacional e de desenvolvimento transnacional em que os migrantes
sejam incluídos como protagonistas.
O Papa passou depois ao terceiro verbo – integrar que,
disse, não é assimilação nem incorporação, mas sim um processo
bidireccional fundado no mútuo reconhecimento da riqueza cultural do
outro. Evitar isolamentos ou fechamentos tanto duma parte como de outra;
respeito, isso sim, das leis, da parte de quem chega, sensibilização
das populações autóctones para o encontro com o outro, valorizar a
família no processo de integração também com programas de reunião
familiar do migrante. O Papa recordou ainda que para a comunidade cristã
“a integração pacífica de pessoas de várias culturas é, de certo modo,
um reflexo da sua catolicidade” ou seja de uma Igreja ”aberta e desejosa
de abraçar a todos”.
Conjugar estes quatro verbos na primeira pessoa do singular e do plural – disse Francisco – é hoje um dever, um dever de justiça económica, de équa distribuição dos bens, de co-responsabilidade, entendida como principio de subsidiariedade,
ou seja liberdade de desenvolvimento a todos os níveis, mas também
“responsa-bilidade pelo bem comum da parte de quem detém o poder”.
Ao dever de justiça o Papa acrescenta também o “dever de civilização”,
de valores de acolhimento e fraternidade, codificados na Declaração
Universal dos Direitos do Homem, em numerosas convenção e pactos
internacionais.
“Cada migrante é uma pessoa humana que, enquanto tal, possui
direitos fundamentais inalienáveis que devem ser respeitados por todos e
em todas as situações”.
Hoje mais do que nunca – continuou o Papa – é necessário reafirmar a
centralidade da pessoa humana, sem permitir que nada, nem sequer a
condição de irregularidade legal, ofusque a dignidade essencial do
homem.
Mas há ainda um outro dever que o Papa não deixa atrás: o da solidariedade,
ou seja empatia e compaixão em relação às tragédias que “marcam com o
fogo” a vida de tantos migrantes. As tradições religiosas ensinam que a
solidariedade nasce da capacidade de compreender a necessidade do irmão e
de assumi-la.
“É dever de solidariedade contrastar a cultura do descarte e
dar maior atenção aos mais fracos, pobres e vulneráveis. Por isso é
necessário uma mudança de atitude em relação aos migrantes e refugiados
da parte de todos”
Passar de uma cultura do descarte a uma “cultura do encontro, a única capaz de construir um mundo mais justo e fraterno, um mundo melhor.”
E o Papa concluiu chamando a atenção para uma categoria de migrantes
particularmente vulneráveis e que somos chamados a acolher, proteger
promover e integrar: as crianças e adolescentes.
(DA)
Sem comentários:
Enviar um comentário