(RV) Neste último dia da
sua viagem apostólica à Turquia, o Papa Francisco esteve presente, na
igreja patriarcal de São Jorge, em Istambul, à solene Divina Liturgia da
festa de Santo André, presidida pelo Patriarca de Constantinopla,
Bartolomeu I. Uma celebração quase inteiramente cantada, segundo a rica
tradição comum a todas as Igrejas de tradição bizantina (ortodoxas e
católicas) da Grécia, do Médio Oriente, do Leste europeu e mesmo do sul
da Itália.
Intervindo no final da celebração, o Papa Francisco sublinhou a
importância da experiência do encontro pessoal, tanto na vida da cristã
como no caminho ecuménico e recordou três “vozes” que as Igrejas cristãs
não podem deixar de ouvir: a voz dos pobres, das vítimas dos conflitos e
dos jovens. Não faltou uma referência ao recente atentado numa mesquita
da Nigéria.
… a vida cristã é uma experiência pessoal, um encontro transformador com
Aquele que nos ama e nos quer salvar. Também o anúncio cristão se
difunde graças a pessoas que, apaixonadas por Cristo, não podem deixar
de transmitir a alegria de serem amadas e salvas.
Neste sentido, é esclarecedor o exemplo do Apóstolo André, referido no
evangelho de São João: depois de ter seguido Jesus até onde ele morava
detendo-se ali com Ele, «encontrou primeiro o seu irmão Simão e
disse-lhe: “Encontrámos o Messias!” – que quer dizer Cristo. E levou-o
até Jesus». Fica, assim claro que nem sequer o diálogo entre cristãos
pode subtrair-se a esta lógica do encontro pessoal – sublinhou o Papa,
que evocou, como exemplo, o abraço entre o Patriarca Atenágoras e Papa
Paulo VI, há cinquenta anos, em Jerusalém.
Recordando o Decreto do Concílio Vaticano II sobre a busca da unidade
entre todos os cristãos, Unitatis redintegratio, publicado há
precisamente 50 anos, o Papa sublinhou que neste “documento fundamental”
a Igreja católica reconhece que as Igrejas ortodoxas «têm verdadeiros
sacramentos e principalmente, em virtude da sucessão apostólica, o
sacerdócio e a Eucaristia». Afirma-se, portanto, que, para guardar
fielmente a plenitude da tradição cristã e levar a termo a reconciliação
dos cristãos do Oriente e do Ocidente, é de extrema importância
conservar e sustentar o riquíssimo património das Igrejas do Oriente,
não só no que diz respeito às tradições litúrgicas e espirituais, mas
também as disciplinas canónicas, sancionadas pelos santos padres e pelos
concílios, que regulam a vida dessas Igrejas.
Considero importante reiterar o respeito deste princípio como condição
essencial e recíproca para o restabelecimento da plena comunhão, que não
significa submissão de um ao outro nem absorção, mas sim acolhimento de
todos os dons que Deus deu a cada um para manifestar ao mundo inteiro o
grande mistério da salvação realizado por Cristo Senhor por meio do
Espírito Santo.
Quero assegurar a cada um de vós que, para se chegar à suspirada meta da
plena unidade, a Igreja católica não tem intenção de impor qualquer
exigência, excepto a da profissão da fé comum, e que estamos prontos a
buscar juntos, à luz do ensinamento da Escritura e da experiência do
primeiro milénio, as modalidades pelas quais garantir a necessária
unidade da Igreja nas circunstâncias actuais.
A única coisa que a Igreja católica deseja e que eu procuro como Bispo
de Roma, «a Igreja que preside na caridade» (declarou ainda o Papa), é a
comunhão com as Igrejas ortodoxas. Esta comunhão será sempre fruto do
amor «que foi derramado nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos
foi dado», amor fraterno que dá expressão ao vínculo espiritual e
transcendente que nos une como discípulos do Senhor.
Foi neste contexto que Papa Francisco recordou a necessidade de escutar
aquelas vozes que se erguem com intensidade no mundo actual: os pobres,
as vítimas dos conflitos e os jovens.
Antes de mais os pobres, que sofrem de grave desnutrição, com o desemprego crescente e pelo aumento da exclusão social.
Não podemos ficar indiferentes perante as vozes destes irmãos e irmãs.
Estão-nos pedindo não só que lhes demos uma ajuda material, necessária
em muitas circunstâncias, mas sobretudo que os ajudemos a defender a sua
dignidade de pessoas humanas.
Além disso – observou o Papa – eles pedem-nos para lutar, à luz do
Evangelho, contra as causas estruturais da pobreza, a desigualdade, a
falta de um trabalho digno, da terra e da casa, a negação dos direitos
sociais e laborais. Como cristãos, somos chamados a vencer, juntos, a
globalização da indiferença.
Uma segunda voz que brada forte em muitas partes do mundo é a das
vítimas dos conflitos – prosseguiu o Papa, evocando “algumas nações
vizinhas” da Turquia, “marcadas por uma guerra atroz e desumana”.
Turvar a paz de um povo, cometer ou consentir qualquer género de
violência, especialmente contra pessoas frágeis e indefesas, é um pecado
gravíssimo contra Deus, porque significa não respeitar a imagem de Deus
que está no homem. A voz das vítimas dos conflitos impele-nos a avançar
apressadamente no caminho de reconciliação e comunhão entre católicos e
ortodoxos.
Neste contexto, o Papa fez uma referência expressa às vítimas do recente
atentado numa mesquita da Nigéria, exprimindo todo o sofrimento e
solidariedade perante este atroz ato de violência contra fiéis reunidos
num local de oração.
Finalmente, uma terceira voz que nos interpela é a dos jovens. Muitos
deles vivem sem esperança, dominados pelo desânimo e a resignação.
As novas gerações não poderão jamais adquirir a verdadeira sabedoria e
manter viva a esperança, se nós não formos capazes de valorizar e
transmitir o autêntico humanismo, que brota do Evangelho e da
experiência milenar da Igreja. São precisamente os jovens… que hoje nos
pedem para avançar rumo à plena comunhão.
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