"Vós sois
motivados a cuidar dos últimos e da criação, e querem fazê-lo seguindo o
exemplo de São Francisco de Assis, com mansidão e laboriosidade", disse
o Papa aos membros da comunidade Laudato Si, propondo-lhes duas
palavras-chave da ecologia integral: contemplação e compaixão.
Mariangela Jaguraba - Vatican News
No final da manhã deste sábado (12/09), o Papa Francisco recebeu na
Sala Paulo VI, no Vaticano, cerca de 250 participantes das Comunidades Laudato si’ que difundem, em Itália e no mundo, os temas da ecologia integral através de atividades concretas, conferências e publicações.
Vós colocais a ecologia integral proposta pela Encíclica
Laudato si’ como a força propulsora de todas as vossas iniciativas.
Integral, porque somos todos criaturas e tudo na criação está em
relação, tudo está relacionado. Na verdade, ouso dizer: tudo é
harmónico. Até mesmo a pandemia demonstrou isso: a saúde do ser humano
não pode ser separada da saúde do ambiente em que ele vive. Também é
evidente que as mudanças climáticas não só perturbam o equilíbrio da
natureza, mas também causam pobreza e fome, afetam os mais vulneráveis e
às vezes obriga-os a deixar as suas terras. A falta de cuidado com a
criação e as injustiças sociais, influenciam reciprocamente: pode-se
dizer que não há ecologia sem equidade e que não há equidade sem
ecologia.
Seguindo o exemplo de São Francisco de Assis, as Comunidades Laudato si’ são
motivadas “a cuidar dos últimos e da criação” e comprometem-se “a
salvaguardar a nossa Casa comum”, disse o Papa, acrescentando:
Esta é uma tarefa que diz respeito a todos, especialmente aos
responsáveis pelas nações e atividades produtivas. É necessária uma
vontade real para enfrentar na raiz as causas das atuais mudanças
climáticas. Não são suficientes compromissos genéricos, palavras e
palavras, e não se pode olhar apenas para o consentimento imediato dos
próprios eleitores ou financiadores. É preciso olhar distante, caso
contrário, a história não perdoará. É preciso trabalhar hoje para o
amanhã de todos. Os jovens e os pobres vão nos pedir conta.
A seguir, o Papa citou duas palavras-chave da ecologia integral: contemplação e compaixão.
Contemplação
“Hoje, a natureza que nos circunda não é mais admirada, contemplada, mas “devorada”.
Tornamo-nos vorazes, dependentes do lucro e dos resultados imediatos a
qualquer custo. O olhar sobre a realidade é cada vez mais rápido,
distraído, superficial, enquanto, em pouco tempo, as notícias e as
florestas queimam.se”, disse ainda o Papa.
Doentes de consumo, esta é a nossa doença, doentes de consumo, nos
preocupamo-nos em ter o último “aplicativo”, mas não sabemos mais os nomes
de nossos vizinhos, muito menos sabemos distinguir uma árvore da outra.
E o que é mais grave, com este estilo de vida perdem-se as raízes, perde-se a gratidão por aquilo que se tem e por quem nos deu.
“Para não esquecer, é preciso voltar à contemplação; para não nos
distrair-mos com mil coisas inúteis, é preciso reencontrar o silêncio; para
que o coração não fique doente, é preciso parar. Não é fácil. É
necessário, por exemplo, libertar-mo-nos da prisão do telemóvel, para
olhar nos olhos de quem está ao nosso lado e a criação que nos foi doada.”
“Contemplar é dar-mos tempo para ficar em silêncio, para rezar, para
que na alma retorne a harmonia, o equilíbrio saudável entre cabeça,
coração e mãos, entre pensamento, sentimento e ação. A contemplação é o
antídoto para as escolhas precipitadas, superficiais e inconclusivas.
Quem sabe contemplar não fica com as mãos paradas, mas faz algo
concreto. A contemplação leva à ação”, sublinhou ainda Francisco.
Compaixão
Segundo o Papa, a compaixão “é o fruto da contemplação. Como
se entende que alguém é contemplativo, que assimilou o olhar de Deus? Se
tem compaixão pelos outros, se vai além das desculpas e teorias, para
ver nos outros irmãos e irmãs para amar. Esta é a prova, e o mesmo
acontece com o olhar de Deus que, apesar de todo o mal que pensamos e
fazemos, vê-nos sempre como filhos amados. Ele não vê indivíduos, mas
filhos, vê-nos como irmãos e irmãs de uma única família, que mora na mesma
casa. Nunca somos estranhos aos seus olhos. A sua compaixão é o oposto
de nossa indiferença. A compaixão é o contrário da indiferença”.
Vale também para nós: a nossa compaixão é a melhor vacina contra a
epidemia da indiferença. “Não me diz respeito”, “não me importa”, “não
me interessa”: estes são os sintomas da indiferença. Quem tem compaixão
passa do “não me importo contigo” ao, “tu és importante para mim”. A
compaixão não é um sentimento bonito, não é pietismo, é criar um novo
vínculo com o outro. É assumir, como fez o bom Samaritano que, movido
pela compaixão, cuida daquela vítima que nem mesmo conhece.
Francisco ressaltou que “o mundo precisa desta caridade criativa e
ativa, de pessoas que não estão diante de uma tela para comentar, mas
que sujam as mãos para remover a degradação e restabelecer a dignidade. Ter compaixão é uma escolha: é escolher não ter nenhum inimigo para ver o meu próximo
em cada um. Isto não significa amolecer e parar de lutar. Pelo
contrário, quem tem compaixão entra numa dura luta quotidiana contra o descarte e o desperdício, o descarte dos outros e o desperdício das coisas”.
O Pontífice disse que dói pensar nas pessoas que são descartadas sem
compaixão: idosos, crianças, trabalhadores, pessoas com deficiência, e
que “o desperdício das coisas é escandaloso”.
A FAO documentou que, nos países industrializados, mais de um
bilião de toneladas de alimentos comestíveis são jogados fora num ano!
Vamo-nos ajudar-nos e lutar juntos contra o descarte e o desperdício. Esta
é a realidade. Vamos exigir escolhas políticas que combinem progresso e
equidade, desenvolvimento e sustentabilidade para todos, para que
ninguém seja privado da terra em que vive, do bom ar que respira, da
água que tem o direito de beber e do alimento que tem o direito de
comer.
Francisco concluiu o seu discurso, convidando a “trabalhar como
irmãos e construir a fraternidade universal. Este é o momento. Este o
desafio de hoje”.
VN
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