Papa Francisco na Audiência Geral na Sala Paulo VI
(Vatican Media)
"Reconhecer as
próprias idolatrias é um início da graça e coloca no caminho do amor. De
facto, o amor é incompatível com a idolatria: se algo se torna absoluto e
intocável, então é mais importante do que um cônjuge, um filho, ou uma amizade. O apego a um objeto ou a uma ideia deixa-nos cegos para
o amor. Levem isto no coração, os ídolos roubam-nos o amor. Os ídolos tornam-nos cegos ao amor. E para amar verdadeiramente, é preciso ser-se
livre de todos os ídolos.
Jackson Erpen – Cidade do Vaticano
Um ídolo é uma “visão” que tende a tornar-se uma obsessão, exige
culto e rituais, e por fim, escraviza. Ao retomar a tradicional
Audiência Geral das quartas-feiras, o Papa Francisco dedicou a sua
catequese à idolatria, explicando toda a sua dinâmica, e convidando-nos a
tirar os ídolos da nossa vida e a jogá-los pela janela.
Entre os 7 mil participantes do tradicional encontro, realizado na
Sala Paulo VI, devido ao forte calor.
Idolatria, um tema atual
"Não terás outros deuses diante de mim". A passagem do Livro do Êxodo
foi o ponto de partida para a catequese de Francisco, sobre a idolatria,
um tema sobre o qual “se deve insistir”, pois “é de grande importância e
atualidade”.
A ordem – explicou o Papa - proíbe crIar ídolos ou imagens de
qualquer tipo de realidade. “Tudo, de facto, pode ser usado como um
ídolo”, ressaltou. “Estamos a falar de uma tendência humana que não
poupa crentes, nem ateus”.
Neste sentido, nós cristãos poderíamos interogar-njos: “Quem é
realmente o meu Deus? É o Amor Uno e Trino ou é minha imagem, meu
sucesso pessoal, talvez dentro da Igreja?”, questiona Francisco, fazendo
menção ao Catecismo, onde diz que “a idolatria não diz respeito somente
aos falsos cultos do paganismo. Ela é uma tentação constante da fé.
Consiste em divinizar o que não é Deus" (n. 2113).
Audiência geral de 1 de agosto de 2018
Um "deus" no plano existencial, “é o que está no centro da própria vida e do qual depende o que se faz e se pensa”:
“Pode-se crescer numa família nominalmente cristã, mas centrada,
na realidade, em pontos de referência estranhos ao Evangelho. O ser
humano não vive sem centrar-se em alguma coisa. Então eis que o mundo
oferece o "supermercado" dos ídolos, que podem ser objetos, imagens,
ideias, papeis”.
“Ddevemos rezar a Deus, nosso Pai”, disse então Francisco, ao
chamar a atenção para a “oração que se faz aos ídolos”. Para tal,
recordou que quando atravessava um parque deslocando-se de uma paróquia para
outra, viu mais de 50 mesas com duas pessoas sentadas uma diante da
outra, jogando o tarot: “Iam ali rezar ao ídolo. Ao invés de rezar a
Deus que é providência do futuro, iam ali deitar as cartas para ver o
futuro. Esta é uma idolatria dos nossos tempos”:
“Pergunto-vos. Quantos de vós foram ler as cartas para
ver o futuro? Quantos de vós, por exemplo, foram ler as mãos para ver o
futuro, ao invés de rezar ao Senhor. Esta é a diferença. O Senhor é
vivo, os outros são ídolos, idolatrias que não servem”.
A dinâmica da idolatria
O Papa então passa a explicar como se desenvolve uma idolatria.
O ídolo – observa o Pontífice - é uma projeção de si mesmo em objetos ou projetos:
“Desta dinâmica serve-se, por exemplo, a publicidade: eu não vejo o
objeto em si, mas percebo o carro, o smartphone, aquele papel - ou
outras coisas - como um meio para realizar-me e responder às minhas
necessidades essenciais. E eu procuro por ele, falo dele, penso nele; a
ideia de possuir esse objeto ou de realizar aquele projeto, alcançando
aquela posição, parece um caminho maravilhoso para a felicidade, uma
torre para alcançar o céu, e tudo se torna funcional para esse
objetivo”.
Não te prostrarás diante deles
Os ídolos exigem um culto, rituais, disse o Papa, ao explicar a
segunda fase da idolatria. “Para eles prostramo-nos e sacrificamos
tudo. Nos tempos antigos, sacrifícios humanos eram feitos para os
ídolos, mas também hoje”:
“Pela carreira – fale com um carreirista - sacrificam os seus
filhos, negligenciando-os ou simplesmente não os gerando; a beleza exige
sacrifícios humanos. Quantas horas diante do espelho, alguém, alguma
mulher gasta para maquilhar-se. Esta também é uma idolatria. Mas não é mal
maquilhar-se. Mas normalmente, não para tornar-se uma deusa. A beleza
pede sacrifícios humanos. A fama exige a imolação de si mesmo, da
própria inocência e da autenticidade. Os ídolos pedem sangue. O dinheiro
rouba a vida e o prazer leva à solidão. As estruturas económicas
sacrificam vidas humanas por lucros maiores”.
E o Papa pensa nas tantas pessoas sem trabalho, muitas vezes porque o
empreendedor de uma empresa decidiu despedi-las para ganhar
mais dinheiro, “o ídolo do dinheiro”:
“Vive-se na hipocrisia, fazendo e dizendo o que os outros esperam,
porque o deus da própria afirmação impõe isso. E vidas são arruinadas,
famílias são destruídas e jovens são abandonados nas mãos de modelos
destrutivos, apenas para aumentar o lucro. Também a droga é um ídolo.
Quantos jovens arruínam a sua saúde, até mesmo a vida, adorando este
ídolo da droga”.
Terceiro estágio: não os servirá
O terceiro estágio é o “mais trágico” – afirma o Santo Padre - pois
“os ídolos escravizam. Eles prometem felicidade, mas não a dão; e encontramo-nos a viver para aquela coisa ou para aquela visão, presos num
vórtice autodestrutivo, esperando por um resultado que não nunca chega”:
“Os ídolos prometem vida, mas na realidade eles tiram-na. O Deus
verdadeiro não tira a vida, mas a dá. O Deus verdadeiro não oferece uma
projeção do nosso sucesso, mas ensina a amar. O Deus verdadeiro não
pede filhos, mas dá o seu Filho por nós. Os ídolos projetam hipóteses
futuras e fazem desprezar o presente; o Deus verdadeiro ensina a viver
na realidade de cada dia, concreto, não com ilusões sobre o futuro. A
concretude do Deus verdadeiro contra a liquidez dos ídolos”.
E o Santo Padre pergunta: “Eu convidovos a pensar hoje: quantos
ídolos eu tenho ou qual é o meu ídolo preferido? Pois reconhecer as
próprias idolatrias é reconhecer a graça. De facto, o amor é incompatível
com a idolatria: se algo se torna absoluto e intocável, então é mais
importante do que um cônjuge, um filho, ou uma amizade. O apego a
um objeto ou a uma ideia deixa-nos cegos para o amor”.
“Levem isso no coração – foi a sua exortação final - os ídolos
roubam-nos o amor. Os ídolos tornam-nos cegos ao amor. E para amar
verdadeiramente, é preciso ser livre de todos os ídolos. Qual é o meu ídolo? Tire-o e jogue-o pela janela”.
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