Entrou na igreja e ficou
contente. Não estava ninguém, exactamente como ele desejava.
Em frente ao sacrário,
ajoelhou-se, rezou algumas orações e depois sentou-se, olhando fixamente para a
porta do sacrário, talvez esperando que ela se abrisse e de dentro saísse Jesus
para falar com ele.
Riu-se interiormente da sua
imaginação, mas rapidamente a sua cara tomou um ar grave e preocupado.
O assunto que ali o levava era
uma situação séria, muito séria, que ele já não sabia como resolver e por isso
ali se tinha dirigido para ter uma conversa mais séria e intima com Aquele que
ele acreditava lhe poderia mostrar caminho e solução para o seu grave problema.
Numa voz inaudível para
outros, ia repetindo: «Senhor, ajuda-me! Mostra-me o que fazer! Eu creio em Ti,
mas ajuda-me! Fala, Senhor, que o teu servo escuta!»
Apesar de absorto na oração e
na escuta, não pode deixar de perceber que alguém tinha entrado na igreja e se
dirigia para o lugar onde ele estava.
Interiormente pediu: «Oh
Senhor, eu queria tanto estar um pouco sozinho aqui contigo!»
Pelo “canto do olho”, olhou e
percebeu que era aquela senhora, sempre muito problemática, com muitas
histórias para contar, para a qual era precisa uma paciência sem limites. Deu
um suspiro profundo e pensou se não seria melhor sair e voltar noutra altura em
que pudesse ficar só.
Já não teve tempo, porque a
dita senhora, rezadas umas apressadas orações de joelhos, sentava-se ao seu
lado e já lhe dirigia a palavra, cumprimentando-o. Tentou ser o mais delicado
possível, retribuindo o cumprimento numa vaga esperança de que ela se calasse e
se fosse embora. Mas não, infelizmente não foi isso que aconteceu, pois ela
percebendo na sua cara a preocupação, logo lhe perguntou se estava bem, se
precisava de alguma coisa, se ela podia fazer alguma coisa por ele.
Balbuciou qualquer coisa entre
dentes, para responder às insistentes perguntas, mas não houve nada a fazer,
porque ela continuou numa lengalenga, sem se calar. Ele foi ouvindo as palavras
que saíam da boca dela e que iam dizendo coisas do tipo: “pois todos temos problemas”,
“a vida não é nada fácil”, “temos que aguentar e pedir a Deus que nos ajude”,
etc., etc.
A certa altura começou a
contar-lhe uma história complicada que se tinha passado com ela, (curiosamente
parecida com o problema que estava a viver), mas com tantos pormenores, que era
difícil e fastidioso prestar alguma atenção.
Entretanto a história lá
chegou ao fim, com uma solução pelos vistos muito satisfatória, e quando ele se
preparava para se levantar e sair, foi ela que o fez, agradecendo-lhe aquele
bocadinho em que a tinha estado a ouvir.
Sorriu aliviado, despediu-se,
e voltou à sua litania, da qual sobressaía, com um forte sentimento no coração,
a oração: “Fala, Senhor, que o teu servo escuta!”
E insistia na oração, sem
prestar atenção a mais nada, até que num momento de silêncio lhe pareceu ouvir
uma voz que dizia ao seu coração: «Mas Eu já falei contigo! Já te disse o que
precisavas saber!»
Admirado, olhou para o
sacrário e então ouviu distintamente, (parecia-lhe a ele), a voz que
repetidamente lhe dizia que tudo o que tinha de saber já lhe tinha sido dito.
Com algum receio que alguém o
estivesse a ouvir, disse: «Mas quando, Senhor?»
Ouviu novamente a voz que lhe
dizia: «Lembras-te da história que a senhora, (que consideraste maçadora e
incómoda), te contou e tu nem querias ouvir?»
Respondeu: «Sim, Senhor, acho
que me lembro!»
E novamente a voz: «E
lembras-te como foi resolvida essa situação?»
Respondeu mais uma vez: «Ah,
sim, Senhor, lembro-me perfeitamente!»
Uma só palavra interrogativa
lhe respondeu: «Então?»
De joelhos, disse em oração:
«Oh Senhor, estava tão concentrado em mim, no meu problema, sem dar atenção a
quem dela precisava, que nem me apercebi que afinal a história era semelhante à
minha situação e que a solução possível é aquela que me foi dita!»
Agradeceu profundamente ao
Senhor tudo aquilo que lhe tinha sido dado, e não se esqueceu de rezar um Pai
Nosso por aquela senhora que ele tão mal tinha julgado.
Antes de sair da igreja, olhou
novamente para o sacrário e disse interiormente: «E dizemos nós tantas vezes
que Tu não falas connosco, nem nos dás sinais! Distraídos na fé, é o que nós
tantas vezes somos. Perdoa, Senhor!»
Monte Real, 26 de Agosto de
2014
Joaquim Mexia Alves
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