14 setembro, 2019

Papa: "se a esperança é fechada numa cela, não há futuro para a sociedade"

 

 
Ao receber na Praça de São Pedro membros da Polícia Penitenciária e pessoal que trabalha nas prisões, o Santo Padre defendeu que ninguém deve ser privado do direito de recomeçar: "a prisão perpétua não é a solução para os problemas, mas um problema a ser resolvido".
 
Jackson Erpen – Cidade do Vaticano
 
Foram três as palavras que o Papa dirigiu na manhã deste sábado, 14, aos cerca de 11 mil membros da Polícia Penitenciária, ao pessoal ligado à Administração Penitenciária e ao Juizado de menores e de comunidades, reunidos na Praça de  São Pedro:  “obrigado”, “em frente” e “coragem”. 

"Obrigado"

Francisco começou por agradecer pelo trabalho da Polícia Penitenciária e pelo pessoal administrativo: “um trabalho escondido, muitas vezes difícil e mal pago, mas essencial”. “Obrigado por todas as vezes que vivem o vosso serviço, não apenas como uma vigilância necessária, mas como um apoio àqueles que são fracos”:

Sei que não é fácil, mas quando, além de serem guardiões da segurança, sois uma presença próxima daqueles que caíram nas redes do mal, vocês tornam-se construtores do futuro, lançam as bases para uma convivência mais respeitosa e, portanto, para uma sociedade mais segura. Obrigado porque, ao fazerem isto, tornam-se, dia após dia, artesões de justiça e esperança.” 

Reconhecer a dignidade diante da humanidade ferida

Citando a passagem da Epístola aos Hebreus:  "Lembrai-vos dos presos, como se voces estivessem juntos com eles na prisão”, o Santo Padre recordou que estes agentes encontram-se na mesma situação, “ao atravessarem os limiares de tantos locais de dor todos os dias, enquanto passam muito tempo entre os diversos setores, enquanto se comprometem a garantir a segurança sem nunca perder o respeito pelos seres humanos”:

Por favor, não esqueçam o bem que podeis fazer todos os dias. O vosso comportamento, as vossas atitudes, os vossos olhares são preciosos. Sejam pessoas que, diante de uma humanidade ferida e muitas vezes devastada, reconheçam nela, em nome do Estado e da sociedade, a dignidade irreprimível.” 

Ser ponte entre a prisão e a sociedade

Francisco agradeceu aos agentes por não serem apenas vigias, mas sobretudo protetores das pessoas que lhes são confiadas, porque, ao tomar consciência do mal praticado, acolhem as perspectivas de renascimento para o bem de todos. "Vós sois assim chamados a serem uma ponte entre a prisão e a sociedade civil: com o vosso serviço, exercitando uma reta compaixão, podem contornar os medos recíprocos e o drama da indiferença”.

O Papa também os exortou a não perderem a motivação, mesmo diante das tensões que possam surgir nos centros de detenção, recordando ao mesmo tempo a importância do apoio das famílias, o incentivo recíproco e a partilha entre os colegas, o que permite enfrentar as dificuldades e ajudar a enfrentar as deficiências, como o “problema da superlotação nas instituições penitenciárias, que faz aumentar em todos a sensação de fraqueza e mesmo de exaustão.

“Quando as forças diminuem, a desconfiança aumenta”,  ressaltou o Papa. Neste sentido, “é essencial garantir condições de vida decentes, caso contrário, as prisões tornam-se depósitos de raiva em vez de locais de recuperação. 

"Em frente"

Já aos capelães, religiosas, religiosos e voluntários que trabalham nas prisões, a palavra do Santo Padre foi: “em frente”.

Em frente, quando entram nas situações mais difíceis com a única força de um sorriso e de um coração que escuta, em frente quando carregam os fardos dos outros e os levam na oração. Em frente quando, em contacto com a pobreza que encontram, vocês veem a vossa própria pobreza. É um bem, porque é essencial antes de tudo reconhecer-mo-nos necessitados de perdão. Então as próprias misérias tornam-se receptáculos da misericórdia de Deus; então, perdoados, tornam-se testemunhas credíveis do perdão de Deus, caso contrário corre-se o risco de levar avós mesmos e as próprias presumidas autossuficiências. Em frente, porque com a vossa missão oferecem consolo. E é tão importante não deixar sós aqueles que se sentem sozinhos.”

Pacientes semeadores da Palavra

Em frente então – foi a exortação final do Papa aos religiosos – com Jesus e no sinal de Jesus, que vos chama a serem pacientes semeadores de sua palavra, buscadores incansáveis daquilo que está perdido, anunciadores da certeza que cada um é precioso para Deus, pastores que carregam as ovelhas mais fracas nos próprios ombros. Em frente com generosidade e alegria: com o vosso ministério consolam o coração de Deus”.

Por fim, a terceira palavra – “coragem” – foi dirigida aos prisioneiros.

Coragem vem de coração, explicou Francisco. É o próprio Jesus que que3 vos diz isto. "Coragem", porque “vocês estão no coração de Deus, vocês são preciosos aos seus olhos, e mesmo que se sintam perdidos em vós”:

“Nunca se deixem aprisionar na cela escura de um coração sem esperança, não cedam à resignação. Deus é maior do que qualquer problema e espera por vós para amar-vos. Colocai-vos diante do Crucifixo, sob o olhar de Jesus: diante dele, com simplicidade, com sinceridade. Dali, da coragem humilde daqueles que não mentem para si mesmos, renasce a paz, floresce novamente a confiança de serem amados e a força para seguir em frente. Eu imagino olhar para vós e ver a decepção e a frustração nos vossos olhos, enquanto no coração bate ainda a esperança, muitas vezes ligada à recordação dos vossos entes queridos. Coragem, nunca sufoques a pequena chama da esperança”.

“Reavivar esta pequena chama é dever de todos”, enfatizou Francisco. “Cabe a toda a sociedade alimentá-lo, fazer de forma que a penalidade não comprometa o direito à esperança, que sejam garantidas perspectivas de reconciliação e de reintegração. Enquanto os erros do passado são remediados, nãos e pode cancelar a esperança no futuro.”

“A prisão perpétua não é a solução para os problemas, mas um problema a ser resolvido. Porque se a esperança é fechada numa cela, não há futuro para a sociedade. Nunca privar do direito de recomeçar!”

“Queridos irmãos e irmãs – disse o Santo Padre ao concluir -  são testemunhas deste direito com o vosso trabalho e serviço: o direito à esperança, o direito de recomeçar. Renovo o meu “obrigado” a vós. Em frente, coragem, com as bênçãos de Deus, guardando os que foram confiados a vós. Rezo por vós e também peço que rezem por mim.”

VN

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