Cappella Redemptoris Mater
Cidade do Vaticano
"Não vos conformeis com a mentalidade deste mundo” (Rm 12, 2), foi o
tema da I reflexão da Quaresma do Frei Raniero Cantalamessa na Capela
Redemptoris Mater a membros da Cúria. O Papa Francisco não participou
por estar concluindo os Exercícios Espirituais em Ariccia.
(Tradução de Thácio Siqueira, com adaptação ao português de Portugal, efetuada por este blogue):
"Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela
renovação do vosso espírito, para que possais discernir qual é a vontade
de Deus, o que é bom, o que lhe agrada e o que é perfeito." (Rom 12,
2).
Numa sociedade em que todos se sentem investidos da tarefa de
transformar o mundo e a Igreja, cai esta palavra de Deus que nos convida
a transformar-nos a nós mesmos. . "Não vos conformeis com este mundo”:
depois destas palavras, esperávamos ouvir: "mas transformai-o!"; Em vez
disso, diz-se: “mas transformai-vos!”. Transformar, sim, o mundo, mas o
mundo que está dentro de vós, antes de pensar em transformar o mundo que
está fora de vós.
Será esta palavra de Deus, tirada da Carta aos Romanos, que nos
introduzirá este ano no espírito da Quaresma. Como fazemos há alguns
anos, dedicamos a primeira meditação a uma introdução geral à Quaresma,
sem entrar no tema específico do programa, até mesmo por causa da
ausência de parte do auditório envolvido nos Exercícios Espirituais.
1. Os cristãos e o mundo
Em primeiro lugar, vejamos como esse ideal de desapego do mundo foi
compreendido e vivido desde o Evangelho até aos nossos dias. É sempre útil
ter em conta experiências passadas se quisermos entender as necessidades
do presente.
Nos evangelhos sinóticos, a palavra "mundo" (kosmos) é quase sempre compreendida num sentido moralmente neutro. Tomando no sentido espacial, mundo indica a terra e o universo ("ide por todo o mundo"), tomando em um sentido temporal, indica o tempo ou o “século” (aion) presente. É com Paulo e ainda mais com João que a palavra "mundo", é preenchida com um valor moral
e significa, na maioria das vezes, o mundo depois do pecado e sob o
domínio de Satanás, “o deus deste mundo” (2 Cor 4, 4). Daí a exortação
de Paulo da qual nós partimos e, aquela, quase idêntica, de João na sua
Primeira Carta:
"Não ameis o mundo nem as coisas do mundo. Se alguém ama o mundo, não
está nele o amor do Pai. Porque tudo o que há no mundo - a
concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida -
não procede do Pai, mas do mundo."(1 Jo 2, 15-16).
Estas coisas não nos fazem perder de vista que o mundo em si mesmo,
apesar de tudo, é e permanece, a boa realidade criada por Deus, que Deus
ama e que veio para salvar, não para julgar: "Com efeito, de tal modo
Deus amou o mundo, que lhe deu o seu Filho único, para que todo o que nele
crer não pereça, mas tenha a vida eterna" (Jo 3, 16).
A atitude em relação ao mundo que Jesus propõe aos seus discípulos encerra-se em duas preposições: estar no mundo, mas não ser do mundo: “Já não estou no mundo – diz dirigindo-se ao Pai – ; eles, pelo contrário, ainda estão no mundo [...]. Eles não são do mundo, como também eu não sou do mundo" (Jo 17,11. 16)
.
Nos primeiros três séculos, os discípulos estão bem cientes de sua posição única. A Carta a Diogneto, um escrito anónimo do final do segundo século, descreve dessa forma o sentimento que os cristãos tinham de si mesmos no mundo:
"Os cristãos não diferem do resto dos homens nem pelo território, nem
pela língua, nem pelos hábitos de vida. De facto, não moram em cidades
particulares, não usam uma linguagem estranha, não levam um tipo de
vida especial [...]. Moram tanto na cidade grega como na bárbara, como
acontece, e apesar de iguais nas roupas, na comida e no resto da vida
segundo os costumes do lugar, se predispõem para uma forma de vida maravilhosa
e, segundo todos, paradoxal. Cada um mora na própria pátria, mas como
forasteiros; participam de todas as atividades de bons cidadãos e
aceitam todos os encargos como convidados passageiros. Toda terra
estrangeira é uma pátria para eles, enquanto toda pátria é, para eles,
terra estrangeira. Como todos, se casam e têm filhos, mas não expõem os seus filhos. Eles têm em comum a mesa, mas não a cama. Vivem na carne,
mas não segundo a carne"[1].
Façamos um breve resumo da história. Quando o cristianismo se torna
tolerado e depois, religião protegida e favorecida, a tensão
entre o cristianismo e o mundo tende, inevitavelmente, a diminuir,
porque o mundo tornou-se, ou pelo menos, é considerado "um mundo
cristão". Ocorre, assim, um duplo fenómeno. De uma parte, grupos de
cristãos desejosos de permanecerem como o sal da terra e não perderem o
sabor, fogem, também fisicamente, do mundo e retiram-se para o deserto.
Nasce o monaquismo sob a bandeira do monge Arsênio: “Fuge, tace,
quiesce”, “Fuja, cale, viva retirado[2]”
Ao mesmo tempo, os pastores da Igreja e os espíritos mais iluminados
tentam adaptar o ideal de desapego do mundo a todos os crentes, propondo
uma fuga não-material, mas espiritual, do mundo. São Basílio no Oriente
e Santo Agostinho no Ocidente conhecem o pensamento de Platão,
especialmente na versão ascética que ele tinha tomado com o discípulo
Plotino. Neste ambiente cultural, estava vivo o ideal da fuga do mundo.
Mas era uma fuga, por assim dizer, vertical, não horizontal, para cima,
não para o deserto. Consiste em elevar-se por acima da multiplicidade
das coisas materiais e das paixões humanas, para unir-se ao que é
divino, incorruptível e eterno.
Os Padres da Igreja - os Capadócios em primeiro lugar - propõem uma
ascética cristã que responde a essa exigência religiosa e adota a sua
linguagem, sem, contudo, sacrificar os valores próprios do Evangelho.
Para começar, a fuga do mundo inculcada por eles é trabalho da Graça
mais do que esforço humano. O ato fundamental não está no final do
caminho, mas no seu começo, no batismo. Portanto, não é reservada a
poucos cultos, mas aberta a todos. Santo Ambrósio escreverá um breve
tratado “Sobre a fuga do mundo”, dirigindo-o a todos os neófitos[3]. A
separação do mundo que ele propõe é sobretudo afetiva: “A fuga –
diz – não consiste no abandonar a terra, mas, permanecendo na terra, em
observar a justiça e a sobriedade, em renunciar aos vícios e não ao uso
dos alimentos” [4].
Este ideal de desapego e de fuga do mundo acompanhará, em formas
diferentes, toda a história da espiritualidade cristã. Uma oração da
liturgia resume-o no lema: "terrena despicere et amare caelestia", "desprezar as coisas da terra e amar as do céu".
2. A crise do ideal da "fuga mundi"
As coisas mudaram nos tempos próximos a nós. Atravessamos,
referindo-nos ao ideal da separação do mundo, uma fase “crítica”, ou
seja, um período no qual tal ideal foi “criticada” e olhada com
suspeita. Tal crise tem raízes remotas. Começa – pelo menos a nível
teórico – com o humanismo renascentista que traz de volta o interesse e o
entusiasmo, às vezes de um tipo pagão, pelos valores mundanos. Mas o
fator determinante da crise deve ser visto no fenómeno da chamada
"secularização", iniciada com o Iluminismo e que atingiu o seu pico no
século XX.
A mudança mais evidente refere-se precisamente ao conceito de mundo
ou de século. Ao longo da história da espiritualidade cristã, a palavra
saeculum teve uma conotação tendencialmente negativa, ou, pelo
menos, ambígua. Indicava o tempo presente sujeito ao pecado, em oposição
ao século futuro ou à eternidade. Dentro de algumas poucas décadas,
isso mudou até assumir nos anos 60 e 70 um significado netamente
positivo. Alguns títulos de livros publicados naqueles anos, como The
Secular Meaning of the Gospel (O significado secular do Evangelho) de Paul van Buren e The Secular City (A cidade secular)
of Harvey Cox, destacam, por si só, esse novo, otimista significado de
"século" e de "secular". Nasce uma “teologia da secularização”.
Tudo isto contribuiu, no entanto, para alimentar em algumas pessoas
um otimismo exagerado em relação ao mundo, que não leva em conta o seu
outro rosto: o de estar “submetido ao maligno” e se opor ao espírito de
Cristo (cf. Jo 14, 17). A certo momento, percebeu-se que o ideal
tradicional de fuga do "mundo" tinha sido substituído, na mente de
muitos (também entre clérigos e religiosos), pelo ideal de uma fuga
"para" o mundo, isto é uma mundanização.
Neste contexto, escreveram-se algumas das coisas mais absurdas e
delirantes que jamais tinham sido escritas sob o nome de "teologia". A
primeira delas é a ideia de que o próprio Deus se seculariza e se
mundaniza, quando se anula como Deus para fazer-se homem. Estamos na,
assim chamada, “Teologia da morte de Deus”. Existe também uma saudável
teologia da secularização que não é vista como algo oposto ao Evangelho,
mas sim como um produto dele. Não é, no entanto, essa, a teologia de
que estamos a falar.
Alguém apontou que as "teologias da secularização" mencionadas eram
somente uma tentativa apologética que pretendia “fornecer uma
justificação ideológica da indiferença religiosa do homem moderno”; era
também “a ideologia da qual a Igreja tinha necessidade para justificar a
sua crescente marginalização[5]". Logo ficou claro que tinhamos entrado num beco sem saída; em poucos anos, quase não se falou mais sobre a
teologia da secularização e alguns dos seus promotores distanciaram-se
dela.
Como sempre, tocar no fundo de uma crise é uma oportunidade para
voltar a questionar a palavra de Deus "viva e eterna". Então, vamos
ouvir novamente a exortação de Paulo: "Não vos conformeis com este
mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso espírito, para que
possais discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, o que lhe
agrada e o que é perfeito."
Nós já sabemos qual é, para o Novo Testamento, o mundo ao qual não
devemos conformar-nos: não o mundo criado e amado por Deus, não os
homens do mundo aos quais devemos sempre ir ao encontro, especialmente
os pobres, os últimos, os sofredores. O “misturar-se” com este mundo do
sofrimento e da marginalização é, paradoxalmente, o melhor modo de
“separar-se” do mundo, porque é ir lá onde o mundo foge com todas as
suas forças. É separar-se do próprio princípio que governa o mundo, que é
o egoísmo.
Reflitamos um pouco, em vez disso, no significado do seguinte:
transformar-se renovando a intimidade da nossa mente. Tudo em nós começa
da mente, do pensamento. Existe um sábio ditado que diz:
Vigie os pensamentos porque se tornam palavras.
Vigie as palavras porque se tornam ações.
Vigie as ações porque se tornam hábitos.
Vigie os hábitos porque se tornam o seu caráter.
Vigie o seu caráter porque se torna o seu destino.
Antes que nas obras, a mudança deve acontecer, portanto, no modo de
pensar, ou seja, na fé. Na origem da mundanização existem muitas causas,
mas a principal é a crise de fé. Neste sentido, a exortação do Apóstolo
somente retoma aquela de Cristo no começo do seu Evangelho:
“Convertei-vos e crede”, convertei-vos, ou seja, crede! Mude o modo de
pensar; pare de pensar ‘segundo os homens” e passe a pensar “segundo
Deus” (Mt 16, 23). Tinha razão santo Tomás de Aquino ao dizer que “a
primeira conversão acontece acreditando”: prima conversio fit per fidem[6].
A fé é o principal campo de batalha entre o cristão e o mundo. É pela
fé que o cristão não é mais “do” mundo. Quando leio as conclusões que
tiram os cientistas ateus da observação do universo, a visão do mundo
que nos dão escritores e cineastas, onde, na melhor das hipóteses, Deus é
reduzido a um vago e subjetivo senso do mistério e Jesus Cristo não é
nem sequer levado em consideração, sinto que pertenço, graças à fé, a um
outro mundo. Experimento a verdade daquelas palavras de Jesus:
"Bem-aventurados os olhos que vêem o que vocês vêem" e fico surpreso ao
constatar como Jesus previu essa situação e deu uma explicação
antecipada: “Escondeste estas coisas aos sábios e inteligentes e as
revelaste aos pequeninos” (Lc 10, 21-23).
Compreendido num sentido moral, o “mundo” é por definição o que se
recusa a acreditar. O pecado, do qual Jesus disse que o Paráclito
“convencerá o mundo”, é de não ter acreditado nele (cf. Jo 16, 8-9).
João escreve: "Esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé" (1 Jo 5,
4). Na Carta aos Efésios, lemos: "E vós outros estáveis mortos por
vossas faltas, pelos pecados que cometestes outrora seguindo o modo de
viver deste mundo, do príncipe das potestades do ar, do espírito que
agora atua nos rebeldes." ( Ef 2, 1-2). O exegeta Heinrich Schlier fez
uma análise penetrante deste "espírito do mundo" considerado por Paulo
como o antagonista direto do "Espírito de Deus" (1 Cor 2, 12). Um papel
decisivo desempenha nisso a opinião pública, hoje também literalmente
espírito "que está no ar" porque se espalha através do éter.
"Determina-se – escreve – um espírito de grande intensidade
histórica, ao qual o indivíduo dificilmente pode escapar. Segue-se o
espírito geral, tratando-o como óbvio. Agir, pensar ou dizer algo
contra ele é considerado insensato ou até mesmo uma injustiça ou um
delito. Então não se ousa mais pôr-se diante das coisas e das situações e
especialmente da vida de modo diverso de como ele as apresenta... A sua
característica é de interpretar o mundo e a existência humana à sua
maneira” [7].
É o que chamamos de "adaptação ao espírito dos tempos". Ele funciona
como o vampiro da lenda. O vampiro rende-se às pessoas que dormem e,
enquanto suga o sangue, injeta simultaneamente um líquido soporífero
nelas que as faz dormir de forma ainda mais doce, de modo que se afundam
cada vez mais no sono e ele pode sugar todo o sangue que deseja. O
mundo, no entanto, é pior do que o vampiro, porque o vampiro não pode
adormecer a presa, mas aproxima-se dos que já dormem. O mundo em vez
disso, primeiro, adormece as pessoas e, de seguida, suga-lhes todas as
energias espirituais, injetando também uma espécie de líquido soporífero
que faz o sono ainda mais doce.
O remédio nesta situação é que alguém nos grite ao ouvido: "Acorde!".
É o que a palavra de Deus faz nas muitas ocasiões e que a liturgia da
Igreja nos faz ouvir novamente e pontualmente no começo da Quaresma:
"Desperta, tu que dormes” (Ef 5,14); "É hora de acordar do sono!" (Rom
13, 11).
3. A figura deste mundo passa
Mas perguntemos, por que o cristão não se deve conformar com o
mundo. Isso não é de natureza ontológica, mas escatológica. Não se deve
distanciar do mundo porque a matéria é intrinsecamente má e hostil ao
espírito, como pensavam os platónicos e alguns Padres influenciados por
eles, mas porque, como diz a Escritura, “a figura deste mundo passa” (1
Cor 7, 31); "O mundo passa com as suas concupiscências, mas quem cumpre a
vontade de Deus permanece eternamente." (1 Jo 2, 17).
Basta parar por um momento e olhar em volta para ver a verdade dessas
palavras. Isso acontece na vida como na tela da televisão: os
programas, as chamadas grades de programação, sucedem-se rapidamente e
cada uma cancela a anterior. A tela permanece a mesma, mas os programas e
as imagens mudam. Assim acontece connosco: o mundo permanece, mas nós
partimos um após outro. De todos os nomes, os rostos, as notícias
que enchem os jornais e telejornais de hoje – de todos nós – o que
permanecerá daqui a alguns anos ou década? Nada de nada.
Pensemos sobre no que resta dos mitos de 40 anos atrás e o que
permanecerá daqui a 40 anos dos mitos e celebridades de hoje. "Isto
acontecerá – lê-se em Isaías - tal como acontece com o esfomeado que
sonha estar a comer e desperta com o estomago vazio, tal como o sequioso
que sonha estar a beber e acorda fatigado pela sede" (Is 29,8). O que
são riquezas, saúde, glória, se não um sonho que desaparece ao despontar
da aurora? Eis que um pobre, dizia Santo Agostinho, uma noite teve um
lindo sonho. Sonha que recebeu uma enorme herança. No sonho vê-se
coberto de lindas roupas, cercado de ouro e prata, possuidor de campos e
vinhas; no seu orgulho despreza o próprio pai e finge não
reconhecê-lo... Mas, acorda pela manhã e vê-se do mesmo jeito em que tinha adormecido[8].
"Nu, saí do ventre da minha mãe, e nu vou voltar", diz Jó (Jó 1, 21).
O mesmo acontecerá com os bilionários de hoje com o seu dinheiro e com os
poderosos de hoje que fazem o mundo tremer com o seu poder. O homem,
visto fora da fé, é apenas “um desenho criado pela onda na praia do mar
cuja onda sucessiva o apaga”.
Hoje existe um novo campo em que é particularmente necessário não se
conformar com este mundo: as imagens. Os antigos tinham inventado o
lema: "Jejuar do mundo” (nesteuein tou kosmou) [9]; hoje isso
deve ser entendido no sentido de jejuar das imagens do mundo. Era considerado mais eficaz o jejum dos alimentos e das bebidas. Não é
mais assim. Hoje jejua-se por muitas outras razões: especialmente para
manter a linha. Nenhum alimento, diz a Escritura, é impuro, enquanto
muitas imagens são. Elas tornaram-se um dos veículos privilegiados com o
qual o mundo difunde o seu antievangelho. Um hino da Quaresma exorta:
Utamur ergo parcius
Usemos parcamente
Verbis, cibis et potibus,
de palavras, comida e bebida,
Somno, iocis et arctius
de sono e de entretenimentos.
Perstemus in custodia.
.
.
Estejamos mais vigilantes em proteger os sentidos.
.
.
Para a lista de coisas a serem utilizadas com moderação - palavras,
alimentos, bebidas e sono – dever-se-ia adicionar as imagens. Entre as
coisas que vêm do mundo e não do Pai, ao lado da concupiscência da carne
e da soberba da vida, São João coloca significativamente “a
concupiscência dos olhos" (1 Jo 2, 16). Lembremos como o rei David caiu
... O que aconteceu com ele olhando para o terraço da casa ao lado,
acontece hoje, muitas vezes, abrindo certos sites na internet.
Se em algum momento nos sentimos perturbados por imagens impuras,
tanto por imprudência própria, quanto por intromissão do mundo que
derrama à força as suas imagens nos olhos das pessoas, imitemos o que
fizeram no deserto os hebreus que tinham sido mordidos pelas serpentes.
Em vez de se perder em arrependimentos estéreis, ou procurar desculpas
na nossa solidão e na incompreensão dos outros, olhemos para um
Crucifixo ou vamos diante do Santíssimo. “Como Moisés levantou a
serpente no deserto, assim é necessário que seja levantado o Filho do
homem, para que todo aquele que nele crê tenha a vida eterna” (Jo 3,
14-15). Que o remédio passe por onde passou o veneno, ou seja, pelos
olhos.
Com estes propósitos sugeridos pela palavra de São Paulo aos Romanos,
e especialmente com a graça de Deus, iniciemos, Veneráveis padres,
irmãos e irmãs, a nossa preparação para a Santa Páscoa. Fazer a Páscoa,
dizia Santo Agostinho, significa “passar deste mundo ao Pai” (Jo 13, 1),
ou seja, passar ao que não passa! É necessário passar do mundo para não passar com o mundo. Boa e santa Quaresma".
___________________
1 Carta a Diogneto, V, 1-8 (Die Apostolischen Vaeter, ed. Kunk –Bihlmeyer, Tubingen 1856, pp. 143-144, tradução Thácio Siqueira)
2 Cf. Vita e Detti dei Padri del deserto, a cura di L. Mortari, I, Roma 1986, p. 97.
3 Cf. De fuga saeculi, 1 (CSEL, 32, 2, p. 251).
4 S. Ambrogio, Espos. del Vang. sec. Luca, IX, 36; De Isaac et anima, 3, 6. (Tradução Thácio Siqueira).
5 Cf C. Geffré, art. Sécularisation, in Dictionnaire de Spiritualité, 15, 1989, pp. 502 s. (Traduçã Thácio Siqueira).
6 S. Tommaso d’Aquino, Summa theologiae, I-IIae, q.113,a,4.
7 H. Schlier, Demoni e spiriti maligni nel Nuovo Testamento, in Riflessioni sul Nuovo Testamento Paideia, Brescia 1976, pp. 194 s.
8 Cf. S. Agostinho, Sermo 39,5 (PL 38, 242).
9 O lema vem de um ditado não canônico atribuído ao próprio Jesus:
“Se não jejuardes do mundo, não descobrireis o reino de Deus”. Cf
Clemente Al., Stromati, 111, 15 (GCS, 52, p. 242, 2); A. Resch, Agrapha, 48 (TU, 30, 1906, p. 68).
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