Se há coisas que a minha vida
sacerdotal me tem feito entender é que poucos são aqueles que percebem
as nossas palavras e os nossos gestos de acordo com aquilo que eles
querem dizer; habitualmente, damos às palavras e às atitudes dos outros o
significado que queremos que elas tenham ou que pensamos que elas têm.
O Santo Padre deu, em finais de agosto, uma entrevista
em que dizia a dado momento: “Não podemos continuar a insistir apenas em
questões referentes ao aborto, ao matrimónio homossexual ou ao uso de
anticoncetivos”. A grande maioria dos meios de comunicação achou que
esta afirmação era “uma grande abertura da Igreja” - leia-se: o abandono
da defesa da cultura da vida.
Não consigo perceber essa interpretação, mesmo pela
frase referida: o Papa diz apenas que a pregação da Igreja não se deve
apenas centrar nisso, mas não diz que deve abandonar esses temas! Claro
que muitos foram ainda aqueles que se “esqueceram” de ler aquilo que o
Papa disse logo a seguir: “Eu falei muito sobre estas questões e fui
criticado por isso. Mas se se fala destas coisas, há que o fazer num
contexto. E já conhecemos a opinião da Igreja e eu sou filho da Igreja;
mas não é necessário estar a falar destas coisas sem cessar”. E, assim, a
grande maioria “não leu” também aquilo que o Santo Padre tinha dito
antes: “O confessor corre sempre o perigo de ser demasiado rigorista ou
demasiado laxista. Nenhum dos dois é misericordioso, porque de verdade
nenhum deles toma a cargo a pessoa. O rigorista lava as mãos e remete-a
para o que está mandado. O laxista lava as mãos dizendo simplesmente
‘isso não é pecado’, ou coisa semelhante. É necessário acompanhar as
pessoas; as feridas necessitam de cura”.
Do mesmo modo, quase “ninguém leu” o discurso que o
Papa Francisco pronunciou há dias, ao receber uma associação de médicos
católicos: “Uma difusa mentalidade do útil, a ‘cultura do deitar fora’
que hoje escraviza os corações e as inteligências de muitos, tem um
custo altíssimo: quer eliminar seres humanos, sobretudo se física ou
socialmente mais fracos. A nossa resposta a esta mentalidade é um ‘sim’
decidido e sem hesitações à vida. As coisas têm preço e podem ser
vendidas, mas as pessoas têm uma dignidade, valem mais que as coisas, e
não têm preço”.
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