25 março, 2014

A salvação é um dom que se recebe com coração humilde, como fez Maria – o Papa na missa desta terça-feira


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(RV) A salvação é um dom que se recebe com coração humilde – esta a principal mensagem do Papa Francisco na Missa em Santa Marta nesta manhã de terça-feira.
Celebrando a Solenidade da Anunciação do Senhor, o Papa Francisco convida-nos a olhar a atitude de Maria que acolhe a mensagem de Deus com um coração dócil e humilde ensinando-nos o caminho. Um caminho que tinha começado com Adão e Eva que, no entanto, cederam a Satanás. O que tinha começado com uma desobediência termina com uma atitude obediente, dócil e humilde. Porque a salvação não se compra nem se vende, oferece-se – afirmou o Papa Francisco:
“A salvação não se compra, não se vende, oferece-se. É gratuita. Nós não podemos salvar-nos a nós próprios: a salvação é um presente, totalmente gratuito. Não se compra com sangue nem de touros, nem de cabras: não se pode comprar. Para entrar nesta salvação, apenas nos é pedido um coração humilde, um coração dócil, um coração obediente. Como aquele de Maria.”
Na sua homilia o Papa Francisco colocou um acento muito forte no caminho da humildade que devemos percorrer, com um coração que se deixe amolecer que se faça dócil e obediente para poder abraçar o Pai:
“Hoje podemos abraçar o Pai que, graças ao sangue do seu Filho, fez-se como um de nós, salva-nos. Este Pai que nos espera todos os dias... Olhemos o ícone de Eva e de Adão, olhemos o ícone de Maria e Jesus, olhemos o caminho da História com Deus que caminhava com o seu Povo. E digamos: ‘Obrigado Senhor, porque hoje Tu dizes-nos que nos deste a salvação’. Hoje é um dia para dar graças ao Senhor.” (RS)

24 março, 2014

Paixão de Jesus: escola para quem se dedica aos irmãos doentes e sofredores: Papa ao Conselho Pontifício da pastoral da saúde


(RV) No encontro tido nesta segunda-feira de manhã com os participantes na Assembleia Plenária do Conselho Pontifício para a Pastoral no campo da Saúde, o Papa Francisco recordou a figura do Beato João Paulo II, que escrevia há 30 anos, na Carta Apostólica que criava este organismo da Cúria Romana: “Fazer bem com o sofrimento e fazer bem a quem sofre”. Palavras que ele própria viveu e testemunhou de modo exemplar.

“Até no sofrimento – recordou o Santo Padre – ninguém está nunca só, porque Deus no seu misericordioso pelo homem e pelo mundo abraça mesmo as situações mais desumanas, em que a imagem do Criador presente em cada pessoa aparece ofuscada ou desfigurada”. “Como aconteceu a Jesus na sua Paixão”.

É precisamente na Paixão de Jesus que se encontra a grande escola para quem quer que deseje dedicar-se ao serviço dos irmãos doentes e sofredores” - recordou o Papa, que exortou a nunca esquecer “no exercício da atividade de cada dia, a carne de Cristo, presente nos pobres, nos que sofrem, nas crianças (mesmo não desejadas), nas pessoas com deficiências físicas ou psíquicas, e nos idosos”.

III Catequese Quaresmal 2014 - Patriarca de Lisboa D. Manuel Clemente

 


«Ninguém pode exigir-nos que releguemos a religião para a intimidade secreta das pessoas, sem qualquer influência na vida social e nacional» (Evangelii Gaudium, 183).

Esta afirmação do Papa Francisco tem de ser levada particularmente a sério, pois não falta ainda quem reduza a fé a um sentimento individual e mais ou menos vago, que não deveria repercutir-se em convicções firmes e declaradas. Também subsiste alguma reação a pronunciamentos de pastores ou instâncias eclesiais sobre pontos concretos da vida social, económica ou política.

Uns e outros repercutem, pelo menos, sentimentos e ideias de tempos idos e enquadráveis na altura. A redução da fé a um vago sentimento dito religioso, que só ganharia em ficar assim, é herança de um certo romantismo que aí mesmo se aconchegava, reagindo também aos constrangimentos público-eclesiásticos de antanho. Ou, mais reconditamente, de algum desprezo gnóstico pelo que acontecesse no mundo exterior, uma vez que só importava o que ao espírito respeitasse, entendido este como faúlha divina infelizmente encerrada na matéria do mundo e das coisas, de que se havia de alhear e quanto mais depressa melhor.

Por outro lado, os últimos séculos também assistiram à sucessão de propostas de vida ou evolução social inteiramente seculares, próprias do que se entendia como o estádio racional ou “positivo” da história, que superasse quaisquer compreensão e determinação religiosa das coisas. Dos vários lados do campo político teórico e prático, visou-se anular ou reduzir a repercussão pública da confissão religiosa e remeter a fé para o recôndito da consciência de cada um ou, mais prosaicamente, limitar a religião à sacristia.

Vivendo onde os outros vivem e ouvindo o que os outros ouvem, não admira que alguns cristãos acabassem por assimilar considerações deste género, não sendo invulgar ouvirmos pessoas crentes a dizerem algo como «eu cá tenho a minha fé», ou «isso é com a consciência de cada um», mesmo a propósito de pontos fundamentais e irredutíveis do credo que aparentemente professam. Credo que, sendo pronunciado na primeira pessoa do singular, é dito por todos como se fossemos um só: é realmente e há de ser consequentemente a fé da Igreja.

Consideremos, no entanto, que, se tais conceitos e preconceitos mantêm aceitação, como de facto se verifica, é porque veiculam alguma verdade à mistura. Assim o creio também, não sendo difícil aceitar que a retração romântica da religião ao sentimento reagia ao constrangimento cultural das sociedades antigas, que pouco espaço de escolha deixavam ou podiam deixar às opções individuais que dissonassem do conjunto. Eram mundos de necessidade, que queriam acima de tudo segurança e nenhum distúrbio duma ordem imóvel e sacralizada. Neste sentido, a reivindicação individual da crença ou da descrença podia surgir como expressão de liberdade e libertação.

Igualmente, o conhecimento progressivo do mundo geográfico e físico, o avanço da ciência moderna e dos seus métodos, da natureza exterior para a humana, tudo alargou o campo da reflexão e da ação não imediatamente religiosas no campo vasto da sociedade e da política. Ganhou outra consistência a dimensão espaciotemporal da realidade, essa mesma que tem o nome de secularidade, não dando às coisas novas e correntes a imediata resolução que tudo terá nos novíssimos, ou últimos fins do homem.

Há tempo para a terra, antes de chegar ao céu, não em oposição mas em cadência. Os que se mantiveram crentes podiam entender que nisto mesmo se respeitava o ritmo religioso da criação, em que dia após dia Deus vai criando um mundo cuja custódia confia à humanidade, sendo preciso cumprir do primeiro ao sexto, antes de descansar ao sétimo e com o próprio Deus. E mesmo os que perderam a fé em Deus, não deixaram de ouvir “cantar” outros amanhãs, conseguidos ou apressados pelo cumprimento exato de tarefas terrenas, positivamente consideradas.

Como sabemos, o Concílio Vaticano II, em cuja receção continuamos, pronunciou-se em vários passos sobre estes tópicos, tão importantes para nos orientarmos no mundo e na cidade dos homens.

Sobre a reivindicação individual das convicções face a pressões externas, o Concílio chegou a uma formulação de grande equilíbrio entre essa reivindicação justificável e a aceitação da verdade objetiva, que não pode esperar pelo acatamento de cada um para de facto existir. Assim o diz, na Declaração sobre a liberdade religiosa: «De acordo com a sua dignidade, todos os homens, por serem pessoas, isto é, seres dotados de razão e de vontade livre e por isso mesmo de responsabilidade pessoal, são impelidos pela sua própria natureza e por obrigação moral a procurarem a verdade, antes de mais no que se refere à religião. E têm a obrigação de aderir à verdade conhecida e de ordenar toda a sua vida segundo as exigências da verdade. Todavia os homens não podem satisfazer esta obrigação de modo adequado à sua natureza, se não gozarem de liberdade psicológica e ao mesmo tempo de imunidade de coação externa. Portanto o direito à liberdade religiosa não se funda numa disposição subjetiva da pessoa, mas na sua própria natureza. Por isso, o direito a uma tal imunidade permanece também naqueles que não satisfazem a obrigação de procurar a verdade e de aderir a ela; e o seu exercício não pode ser impedido, desde que seja respeitada a justa ordem pública» (Dignitatis Humanae, 2).

Com esta declaração e no preciso ponto que citei, o Concílio atingiu o cume reflexivo duma questão que atravessou e dramatizou a vida católica durante dois séculos, a saber, como se podia conjugar a subjetividade humana com a objetividade criacional das coisas. Cume reflexivo e prático que ainda está longe da total assimilação, quer quanto a nós, no que toca ao respeito ativo pela liberdade de consciência dos outros, quer no que concerne a outros pelo respeito das convicções que legitimamente mantemos, numa consciência que não pode deixar de ter repercussões da sociedade à economia e da pedagogia à cultura.

No respeitante à consistência do mundo e dos fenómenos que devem ser respeitados na sua natureza própria e assim mesmo tidos e tratados pela humanidade em geral, ainda “antes” do sentido transcendente e religioso que lhes dermos, mas nunca contra ele, também o Concílio atingiu um alto cume de formulação e doutrina, na Constituição pastoral sobre a Igreja no mundo contemporâneo: «Muitos dos nossos contemporâneos parecem recear que uma ligação muito mais íntima entre a atividade humana e a religião constitua um perigo para a autonomia dos homens, das sociedades e das ciências. Se por autonomia das realidades terrestres se entende que as coisas e as próprias sociedades têm as suas leis e os seus valores próprios, que o homem gradualmente deve descobrir, utilizar e organizar, é plenamente legítimo exigir tal autonomia, pois ela não só é reivindicada pelos homens do nosso tempo, mas corresponde também à vontade do Criador. Com efeito, é pela virtude da própria criação que todas as coisas estão dotadas de consistência, verdade e bondade, de leis próprias e de uma ordem que o homem deve respeitar, reconhecendo os métodos próprios de cada uma das ciências e técnicas. […] Se, porém, pela expressão “autonomia das realidades temporais”, se entende que as coisas criadas não dependem de Deus e que o homem pode usá-las sem as referir ao Criador, não há ninguém, que acredite em Deus, que não perceba quão falsas são tais afirmações. Na verdade, a criatura sem o Criador esvai-se. Além disso, todos os crentes qualquer que for a sua religião, sempre souberam ouvir a voz e a manifestação de Deus na linguagem da criação. Mais ainda, pelo esquecimento de Deus, a própria criatura fica obscurecida» (Gaudium et Spes, 36).

Estes dois números – Dignitatis Humanae 2 e Gaudium et Spes 36 – oferecem-nos, como disse, dois cumes da reflexão conciliar que importa absolutamente receber, para fundamentarmos devidamente o direito e o dever que temos, como Igreja de Cristo, de participar ativamente na vida da cidade e da sociedade em geral, nos vários aspetos do respetivo acontecer. Trata-se também duma contribuição que a mesma cidade e sociedade não deveriam dispensar – e de facto não dispensam, e mais do que para satisfazer necessidades imediatas através da caridade de Igreja, como inevitável e justificadamente acontece.

O Papa Francisco é também herdeiro e seguidor da reflexão conciliar, compreendendo-se assim a veemência da sua frase, que hoje comentamos: «Ninguém pode exigir-nos que releguemos a religião para a intimidade secreta das pessoas, sem qualquer influência na vida social e nacional» (Evangelii Gaudium, 183).

A afirmação vem na sequência do que escrevera no número anterior, retomando a aludida doutrina e reforçando o significado humano e humanizador que tudo tem e deve ter na ordem social, a partir da intenção do próprio Criador e do Evangelho de Cristo: «Os Pastores, acolhendo as contribuições das diversas ciências, têm o direito de exprimir opiniões sobre tudo aquilo que diz respeito à vida das pessoas, dado que a tarefa da evangelização implica e exige uma promoção integral de cada ser humano. Já não se pode afirmar que a religião se deve limitar ao âmbito privado e serve apenas para preparar as almas para o Céu. Sabemos que Deus deseja a felicidade dos seus filhos também nesta Terra, embora estejam chamados à plenitude eterna, porque Ele criou todas as coisas “para nosso usufruto” (1 Tm 6, 17), para que todos possam usufruir delas. Por isso, a conversão cristã exige rever, “especialmente, tudo o que diz respeito à ordem social e consecução do bem comum” (João Paulo II, Ecclesia in America, 27)» (Evangelii Gaudium, 182).

 É este sentido humano e humanizador, conferido pela tradição bíblica à realidade social, que o Papa Francisco retoma para legitimar a intervenção da Igreja e dos seus pastores na vida pública.

Do que a Bíblia nos diz dos desígnios do Criador e do que os Evangelhos em particular relatam das palavras e gestos de Cristo – Ele, que «por nós homens e para nossa salvação desceu do Céu» - o Papa sublinha o dever que tem e que nós temos com ele de insistir oportuna e inoportunamente sobre alguns princípios que, sintetizados na Doutrina Social da Igreja, reforçam e explicitam aspirações que são da humanidade inteira. Humanidade que também nós compartilhamos e aspirações que vemos inteiramente correspondidas na mensagem evangélica.

O Papa Francisco referiu-se à promoção das pessoas e ao bem comum. São os dois primeiros dos quatro “princípios permanentes da doutrina social da Igreja”, que o respetivo Compêndio apresenta assim: «Os princípios permanentes da doutrina social da Igreja constituem os verdadeiros gonzos do ensinamento social católico: trata-se do princípio da dignidade da pessoa humana […], no qual todos os demais princípios ou conteúdos da doutrina social da Igreja têm fundamento, do bem comum, da subsidiariedade e da solidariedade. Estes princípios, expressões da verdade inteira sobre o homem conhecida através da razão e da fé, promanam do encontro da mensagem evangélica e das suas exigências, resumidas no mandamento supremo do amor, com os problemas que emanam da vida da sociedade» (Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 160).

O Papa Francisco está convicto da importância destes princípios para a fermentação evangélica do mundo, no sentido maior da dignificação real de cada ser humano. É à sua luz que nos dá na exortação apostólica Evangelii Gaudium um impulso programático para os próximos tempos, como o seguiremos em Lisboa, em caminho sinodal. Aproveitemos bem esta Quaresma para nos imbuirmos do mesmo Espírito, para tudo analisarmos com idêntico critério e reativarmos por palavras e obras a presença cristã na sociedade.

+ Manuel Clemente
Sé de Lisboa, 23 de março de 2014

Série constante na faixa lateral deste blog, em:
"Pesquisa rápida" - "CATEQUESE QUARESMAL 2014"

Discórdias são obstáculo à evangelização: Papa aos Bispos da Guiné-Conakri, pedindo Comunidades fraternas e reconciliadas


(RV) Nesta segunda-feira de manhã o Papa Francisco recebeu: - o card. Fernando Filoni, Prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos; - os três bispos da Conferência Episcopal da Guiné-Conakri, liderados pelo arcebispo D. Vincent Coulibaly; - os participantes na plenária do Conselho Pontifício para a pastoral no campo da Saúde.

Nas palavras dirigidas aos Bispos da Guiné-Conakri, vindos a Roma para a visita “ad limina Apostolorum”, o Papa sublinhou a necessidade de pôr de lado discórdias e contraposições, que prejudicam o testemunho cristão. “Para que o Evangelho toque e converta os corações em profundidade, precisamos de nos recordar que é somente unidos no amor que podemos testemunhar a verdade do Evangelho”. “As discórdias entre cristãos são o maior obstáculo à evangelização”.

“Num mundo ferido por tantos conflitos étnicos, políticos e religiosos, as nossas comunidades devem ser autenticamente fraternas e reconciliadas”. “Não nos deixemos roubar o ideal do amor fraterno” – insistiu o Papa, citando a sua Exortação Apostólica “Evangelii gaudium”.

O Santo Padre recordou também a necessidade de viver uma existência coerente com o Evangelho que anunciamos, para que o anúncio da Boa Nova possa dar fruto. Neste contexto, referiu expressamente os leigos empenhados na pastoral, em especial os catequistas, que (disse) desempenham um trabalho insubstituível de evangelização e de animação das comunidades.

Relativamente ao empenho na sociedade, também como expresso do justo apego ao seu país, o Papa sugeriu aos bispos da Guiné-Conakri que encorajem os leigos, sobretudo os mais jovens, a serem “sempre e por toda a parte artífices de paz e de reconciliação, para lutar contra a extrema pobreza com que se confronta a Guiné”.
Nesta perspectiva, e embora reconhecendo as dificuldades concretas existentes no terreno, o Santo Padre encorajou as “relações com os compatriotas muçulmanos, aprendendo uns dos outros a aceitar diferentes maneiras de ser, de pensar e de se exprimir”.

Não faltou uma palavra final de apreço e agradecimento “aos religiosos e religiosas que… fornecem ao povo guineense a oferta insubstituível da sua oração”, “vivendo muitas vezes em situação de grande pobreza”. O Papa recomendou aos Bispos da Guiné-Conakri que os apoiem e acompanhem, assim como aos padres, sobrecarregados pelas tarefas pastorais em razão do seu número reduzido.

Deus salva-nos nos nossos erros, não nas nossas seguranças –o Papa na Missa em Santa Marta

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(RV) Não nos salva a nossa segurança de cumprirmos os mandamentos, mas a humildade de ter sempre necessidade de sermos curados por Deus: esta a principal ideia da homilia do Papa Francisco na Missa em Santa Marta na manhã desta segunda-feira.
‘Nenhum profeta é bem aceite na sua pátria’: a homilia do Papa parte destas palavras de Jesus dirigidas aos seus conterrâneos, os habitantes de Nazaré, junto dos quais não pode fazer milagres porque não tinham fé. Jesus recorda dois episódios bíblicos: o milagre da cura de Náaman, o sírio, no tempo do profeta Eliseu e o encontro do profeta Elias com a viúva de Sarepta de Sídon, que foi salva da carestia. Estes marginalizados, acolhendo os profetas foram salvos, ao contrário os nazarenos não aceitam Jesus, porque eram muito seguros da sua fé, tão seguros da sua observância dos mandamentos que não precisavam de ser salvos:
“É o drama da observância dos mandamentos sem fé: ‘Eu salvo-me sozinho, porque vou à sinagoga todos os sábados, tento obedecer aos mandamentos, mas que não venha este dizer-me que eram melhores do que eu o leproso e a viúva!’ Aqueles eram marginalizados! E Jesus diz: ‘ mas olha que se tu não te marginalizas, não te sentes nas margens, não terás salvação’. Esta é a humildade, o caminho da humildade: sentir-se tão marginalizado que temos necessidade da salvação do Senhor. Apenas Ele salva, não a nossa observância dos preceitos.”
Segundo o Santo Padre esta é a mensagem desta 3ª Semana da Quaresma: se nós queremos ser salvos devemos escolher o caminho da humildade:
“Maria no seu Canto não diz que está contente porque Deus olhou para a sua virgindade, a sua bondade e a sua doçura, tantas virtudes que tinha ela, não: mas porque o Senhor olhou a humildade da sua serva, a sua pequenez, a humildade. É aquilo que olha o Senhor.”
“A humildade cristã não é a virtude de dizer: ‘Mas eu não sirvo para nada! E esconder a soberba aí, não! A humildade cristã é dizer a verdade: ‘Sou pecador, sou pecadora’. Dizer a verdade: é esta a nossa verdade. Mas há a outra: Deus salva-nos: Mas salva-nos lá, quando nós somos marginalizados; não nos salva nas nossas seguranças. Peçamos esta graça de ter esta sabedoria de marginalizarmo-nos, a graça da humildade para receber a salvação do Senhor.” (RS)

Paixao de Jesus: escola para quem se dedica aos irmãos doentes e sofredores: Papa ao Conselho Pontifício da pastoral da saúde

 
(RV) No encontro tido nesta segunda-feira de manhã com os participantes na Assembleia Plenária do Conselho Pontifício para a Pastoral no campo da Saúde, o Papa Francisco recordou a figura do Beato João Paulo II, que escrevia há 30 anos, na Carta Apostólica que criava este organismo da Cúria Romana: “Fazer bem com o sofrimento e fazer bem a quem sofre”. Palavras que ele própria viveu e testemunhou de modo exemplar.

“Até no sofrimento – recordou o Santo Padre – ninguém está nunca só, porque Deus no seu misericordioso pelo homem e pelo mundo abraça mesmo as situações mais desumanas, em que a imagem do Criador presente em cada pessoa aparece ofuscada ou desfigurada”. “Como aconteceu a Jesus na sua Paixão”.

É precisamente na Paixão de Jesus que se encontra a grande escola para quem quer que deseje dedicar-se ao serviço dos irmãos doentes e sofredores” - recordou o Papa, que exortou a nunca esquecer “no exercício da atividade de cada dia, a carne de Cristo, presente nos pobres, nos que sofrem, nas crianças (mesmo não desejadas), nas pessoas com deficiências físicas ou psíquicas, e nos idosos”.
 

23 março, 2014

Abandonemos as bilhas interiores que nos afastam de Deus - Papa no Angelus. Recordados também o Dia Mundial contra a Tuberculose e a iniciativa "24h para o Senhor"


(RV) Antes da oração mariana deste Domingo, terceiro do tempo quaresmal, o Papa Francisco comentou o evangelho do dia que nos apresenta o encontro de Jesus com a mulher samaritana, que teve lugar perto de um antigo poço onde ela ia todos os dias para buscar água. Naquele dia, disse o Papa, ela encontrou Jesus sentado, "cansado pela viagem" , que lhe disse imediatamente: "Dá-me de beber". Ao fazer assim, acrescentou o Papa:

Jesus supera as barreiras de hostilidade que existiam entre judeus e samaritanos e quebra os esquemas de preconceitos contra as mulheres . Aliás, o simples pedido de Jesus é o início de um diálogo franco, através do qual Ele, com grande delicadeza, entra no mundo interior de uma pessoa que, segundo os esquemas sociais da época, não deveria mesmo falar com ela.
Portanto, Jesus coloca a mulher samaritana diante da sua situação, não julgando-a, mas fazendo-a sentir-se considerada, reconhecida e, assim, despertando nela o desejo de ir para além da routine quotidiana – sublinhou o Santo Padre. E continuou:

O que Jesus tinha não era tanto a sede de água, mas de encontrar uma alma sedenta. Jesus precisava de encontrar a mulher samaritana para abrir o seu coração: pede-lhe de beber para destacar a sede que existia em si mesma. A mulher fica tocada por este encontro: dirige a Jesus aquelas perguntas profundas que todos nós temos dentro, mas que muitas vezes ignoramos. Também nós temos muitas perguntas para fazer, mas não temos a coragem de dirigi-las a Jesus!
A Quaresma é o tempo oportuno para olharmos para dentro de nós, tirarmos fora as nossas necessidades espirituais mais verdadeiras, e pedirmos a ajuda do Senhor na oração. O exemplo da samaritana nos convida a nos exprimirmos assim: ". Dá-me dessa água que me saciará a sede para sempre"
O evangelho diz que os discípulos ficaram admirados por Ele estar a falar com aquela mulher. Mas o Senhor é maior que os preconceitos, por isso não teve medo de se deter com a samaritana: a misericórdia é maior que o preconceito. Devemos aprender bem isto: a misericórdia é maior que o preconceito, e Jesus é muito misericordioso, muito.

O resultado daquele encontro perto do poço foi que a mulher ficou transformada:

"deixou a sua bilha" e correu à cidade para contar a sua experiência extraordinária. Ela havia ido buscar água do poço, e encontrou outra água, a água viva da misericórdia que jorra para a vida eterna. Ela encontrou a água que sempre procurava! Ela corre para a aldeia, aquela mesma aldeia que a julgava e rejeitava, e anuncia que encontrou o Messias, alguém que mudou a sua vida. PORQUE TODO O ENCONTRO COM JESUS NOS TRANSFORMA A VIDA. Neste Evangelho, concluiu o Papa Francisco a sua reflexão, encontramos também nós o estímulo para "deixarmos a nossa bilha", símbolo de tudo aquilo que aparentemente é importante, mas que perde valor diante do "amor de Deus":

Todos nós temos uma bilha, ou mais que uma eh … eu vos pergunto, e também a mim, qual é a tua bilha interior, aquela que te pesa, que te afasta de Deus? Deixemo-la um pouco de lado e com o coração sintamos a voz de Jesus que nos oferece outra água, que nos aproxima do Senhor.
Somos chamados a redescobrir a importância e o significado da nossa vida cristã, iniciada no Baptismo e, como a Samaritana, a testemunhar aos nossos irmãos a alegria do encontro com Jesus e as maravilhas que o seu amor realiza na nossa existência.
DEPOIS DO ANGELUS
A seguir a oração das “Ave-Marias” o Papa convidou aos presentes de repetir atrás dele:
Todo o encontro com Jesus transforma a nossa vida, todo o encontro com Jesus nos enche de alegria.
E falou do Dia Mundial da Tuberculose que se assinala amanhã e da iniciativa “24h para o Senhor”:

Amanhã assinala-se o Dia Mundial da Tuberculose: rezemos por todas as pessoas afectadas por esta doença, e por aqueles que de um modo ou do outro os apoiam.
Na sexta-feira e sábado próximos viveremos um momento penitencial particular, chamado "24 horas para o Senhor". Iniciará com a celebração na Basílica de São Pedro, na sexta-feira à tarde, e depois durante a noite algumas igrejas do centro de Roma ficarão abertas para a oração e confissões. Será uma festa do perdão, que também terá lugar em muitas dioceses e paróquias do mundo.
Em seguida o Santo Padre dirigiu a sua saudação aos fiéis de Roma e os peregrinos de vários países, presentes na Praça de S. Pedro, particularmente os de Zadara e Zagreb, na Croácia, e Bocholt na Alemanha, a escola "Capitanio" Seto-Shi, Japão, os estudantes do 'Illinois (EUA) e os de Ferrol (Espanha) e o Centro de Serviço para o Voluntariado da Sardenha, entre outros.

E, como habitualmente, a terminar a todos desejou bom Domingo e bom almoço


O Papa Francisco instituiu a Pontifícia Comissão para a tutela dos menores


(RV) O Santo Padre instituiu neste sábado 22 de Março a Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores, anunciada em 5 de Dezembro de 2013. A tarefa principal do grupo constituído será a de preparar os Estatutos da Comissão, que definirão as competências e as funções do organismo.

Por ocasião da publicação do comunicado sobre a Comissão para a Tutela dos Menores, o Director da Sala de Imprensa da Santa Sé, P. Federico Lombardi, explicou que “continuando o empenho dos seus Predecessores e tendo ouvido o parecer de diversos Cardeais, de outros membros do episcopado e de especialistas na matéria, o Papa Francisco decidiu constituir uma Comissão para a tutela dos menores”.

“O Santo Padre deixa claro que a Igreja deve ter a protecção dos menores entre as suas mais altas prioridades – disse o P. Lombardi - e para promover a iniciativa neste campo hoje, o Papa indicou os nomes de diversas personalidades altamente qualificadas e conhecidas pelo seu empenho sobre este tema”.

“Este grupo inicial – continuou o Director da Sala de Imprensa da Santa Sé - é agora chamado a trabalhar expeditamente e colaborar em diferentes tarefas, entre as quais: elaborar a estrutura final da Comissão - definindo qual o seu objectivo e responsabilidades - e propor os nomes de ulteriores candidatos, em particular de outros continentes e países, que possam ser chamados para trabalhar nesta comissão”.

P. Federico Lombardi reiterou que “na certeza de que a Igreja deve desenvolver um papel crucial neste campo, e olhando o futuro sem esquecer o passado, a Comissão adoptará uma abordagem múltipla para promover a protecção dos menores, o que compreenderá a educação para prevenir o abuso de menores, os procedimentos penais contra as agressões aos menores, os deveres e responsabilidades civis e canónicas e o desenvolvimento das “melhores práticas” que foram individuadas e desenvolvidas na sociedade no seu conjunto”.

“Neste modo e com a ajuda de Deus – concluiu o jesuíta – esta Comissão contribuirá à missão do Santo Padre em responder à sagrada responsabilidade de assegurar a segurança da juventude”.

Fazem parte da comissão constituída pelo Santo Padre a Dra. Catherine Bonnet, da França, a Sra. Marie Collins, da Irlanda, Prof. Sheila Hollins, do Reino Unido, o Cardeal Sean Patrick O’Malley, dos Estados Unidos, o Prof. Claudio Papale, da Itália, Hanna Suchocka, da Polónia, o Rev.do Humberto Miguel Yáñez, SJ, da Argentina e o Rev.do Hans Zollner, SJ, da Alemanha.

“Parábola do Bom Samaritano poderia ser a parábola do comunicador”: Papa Francisco à rede radiofónica e televisiva Corallo”

Pintura de George F. Watts

(RV) O Papa Francisco recebeu, ao fim da manhã deste sábado, na Sala Clementina, no Vaticano, cerca de 400 membros da Associação “Corallo”, uma rede de comunicação na Itália, que exprime o compromisso da Igreja de estar próxima a todas as pessoas, onde quer que estejam, vivam, trabalhem, amem e sofram.
No seu discurso, entregue aos numerosos presentes, ao término da audiência, o Papa partiu da expressão “rede” de comunicação. Esta imagem nos leva a pensar nos primeiros discípulos de Jesus, que trabalhavam como pescadores, que utilizavam redes para pescar. Jesus os convidou para segui-lo, tornando-os “pescadores de homens”. E o Pontífice exortou:
“Vós também podeis ser ‘pescadores de homens’ com esta vossa rede de rádios e televisões locais, que envolve toda a Itália: uma rede simples, popular, e é bom que permaneça como tal. Atingindo todas as cidades e todos os cantos do país, que as vossas emissoras possam ser instrumentos, para que a voz do Senhor possa ser ouvida por todos”.
As vossas rádios e televisões podem transmitir, através das ondas magnéticas, a voz do Senhor, que fala aos homens e às mulheres que buscam uma palavra de esperança e de confiança para as suas vidas.
Neste sentido, afirmou o Papa Francisco, vós podeis ser a voz de uma Igreja que “não tem medo de entrar nos desertos do homem, de ir ao seu encontro, buscá-lo nas suas inquietudes, nas suas perturbações, dialogando com todos, também com aqueles que, por tantos motivos, se afastaram da comunidade cristã e se sentem distante de Deus.
E o Papa se perguntou: “Em que modo, com esta vossa “rede”, poderíeis colaborar com Jesus Cristo na sua missão, ao anunciar, hoje, o Evangelho do Reino de Deus? E respondeu:
Antes de tudo, diria, dando ‘atenção às temáticas importantes da vida das pessoas, das famílias, da sociedade’, tratando esses assuntos, não de modo sensacionalista, mas responsável, com sincera paixão pelo bem comum e pela verdade... Muitas vezes, tais temáticas são abordadas de modo espectacular, sem o devido respeito pelas pessoas e seus valores, pois os factos humanos jamais devem ser instrumentalizados”.
A seguir, o Pontífice apresentou o segundo aspecto de como colaborar com o anúncio evangélico nas transmissões radiofónicas e televisivas: a “qualidade humana e ética”, ou seja, ajudar a formar aquele “ecossistema mediático”, que saiba equilibrar o silêncio, as imagens e os sons. E acrescentou:
Hoje, há muita poluição e o clima mediático também tem as suas formas de poluição, os seus ‘venenos”. As pessoas sabem, percebem, mas, depois, infelizmente, se acostumam a respirar transmissões poluídas, que não fazem bem. É preciso fazer circular ar puro entre as pessoas, para que possam respirar, livremente, o verdadeiro oxigénio para as suas mentes e as suas almas”.
Tudo isso, porém, frisou o Papa Francisco, exige um adequado profissionalismo, uma comunicação em termos de proximidade, que exorta os membros da rede “Corallo” a se tornar rosto de uma Igreja, que seja “bom samaritano”, mediante as suas rádios e televisões.
A parábola do “Bom Samaritano”, concluiu o Santo Padre, poderia ser a “parábola do comunicador”. Por isso, faz votos de que a rede “Corallo” possa se tornar sempre mais uma experiência de proximidade com as pessoas, capaz de dar voz ao Senhor, que aquece o coração e difunde esperança e alegria

22 março, 2014

“Convertei-vos, parai de fazer o mal”: o apelo do Papa aos mafiosos na vigília de oração pelas vítimas da máfia

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(RV) No final da tarde desta sexta-feira dia 21 de março o Papa Francisco encontrou-se com os familiares das vítimas da máfia. Este encontro organizado pela Associação italiana ‘Livre’ animada pelo Padre Ciotti antecipa o Dia da Memória e do Compromisso solenemente celebrado neste sábado na cidade de Latina. Esta vigília teve lugar na Paróquia São Gregório VII, em Roma.
Neste momento de oração profundamente tocante estiveram presentes familiares de tantas vítimas da violência da criminalidade organizada em Itália. Na presença do Santo Padre foram citadas 842 vítimas das quais 80 eram crianças. O Papa Francisco manifestou a sua solidariedade para com todas estas pessoas ali presentes:
“Obrigado pelo vosso testemunho, porque não se fecharam, mas abriram-se para contar a vossa história de dor e de esperança. Isto é muito importante, especialmente para os jovens!”
O Santo Padre confessou – durante a sua intervenção – o desejo e a sua esperança de que o sentido de responsabilidade lentamente vença a corrupção em todas as partes do mundo. E isso deve começar a partir de dentro, da consciência, e dali deve restaurar os comportamentos, as relações, as escolhas, o tecido social, para que a justiça ganhe espaço, cresça, forme raízes e tome o lugar da iniquidade. “Eu sei” – disse o Santo Padre – “que vocês sentem fortemente esta esperança e quero partilhá-la convosco. Estarei convosco neste caminho que requer tenacidade e perseverança” – afirmou o Papa Francisco.
O Santo Padre rezou ainda pelos protagonistas ausentes desta vigília de oração – os homens e mulheres mafiosos. A estes o Papa Francisco disse-lhes:
"Por favor, mudem de vida. Convertam-se. Parem de fazer o mal! Rezaremos por vós: convertam-se. Peço-vos de joelhos. É para o vosso bem.”
“O poder, o dinheiro que vocês têm agora de tantas negociações sujas, de tantos crimes mafiosos, é dinheiro ensanguentado, é poder ensanguentado, e não podereis leva-los para a outra vida. Convertam-se. Ainda estão a tempo para não terminarem no inferno.” Das tantas vozes que se ouviram na proclamação de uma infindável lista de vítimas da violência da máfia, recordamos aqui uma dessas vozes. Trata-se de Rosaria, viúva do agente Vito Schifani, assassinado no atentado de Capaci no qual perderam a vida o juiz Giovanni Falcone e a sua escolta. Rosaria tinha apenas 22 anos e um filho pequeno, foi ela que, no decorrer do funeral, comoveu toda a Itália ao perdoar, no tormento da sua dor, os mafiosos que se arrependessem. No dia de ontem após ler vários nomes de vítimas agradeceu comovida a Jesus o conforto que o Senhor lhe deu, dizendo: “Obrigado Jesus, porque nestes anos nunca perdi o ânimo. Obrigado, Jesus!” (RS)

21 março, 2014

Para não sermos patrões da Palavra de Deus, é preciso humildade e oração – o Papa em Santa Marta

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(RV) Para não sermos patrões da palavra de Deus é preciso humildade e oração – esta mensagem resume o essencial da homilia do Papa na Missa desta sexta-feira em Santa Marta. Estas duas atitudes, oração e humildade permitem ao cristão ser capaz de estar desperto para a Palavra e para a vontade de Deus. O Evangelho de S. Mateus conta-nos neste dia a parábola dos vinhateiros que matam primeiro os servos e depois o filho do patrão da vinha com intenções de se apoderarem da herança. A escutar esta parábola estavam com Jesus fariseus, anciãos e sacerdotes. A estes – explica o Santo Padre – Jesus fala-lhes para os fazer compreender no que tinham caído por não terem o coração aberto à Palavra de Deus:
“Este é o drama desta gente, e também o nosso drama! Apoderaram-se da Palavra de Deus. E a Palavra de Deus torna-se palavra deles, uma palavra segundo os seus próprios interesses, as suas ideologias, as suas teologias... mas ao seu serviço. E cada um interpreta-a segundo a própria vontade, segundo os seus próprios interesses. Este é o drama deste povo. E para conservarem isto matam. Isto sucedeu a Jesus.”
Os chefes dos sacerdotes e dos fariseus – continuou o Papa Francisco – tinham percebido que Jesus falava deles e procuravam capturá-lo e matá-lo. Estavam presos nos desejos de cada um deles. Isto pode acontecer a cada um de nós – explicou o Santo Padre – quando não estamos abertos à novidade da Palavra de Deus. Fazemos como os fariseus e os sacerdotes. Para não cairmos nesta tentação devemos cultivar duas atitudes fundamentais: a humildade e a oração:
“Esta é a atitude daquele que quer escutar a Palavra de Deus: em primeiro humildade; em segundo oração. Esta gente não rezava. Não tinha necessidade de rezar. Sentiam-se seguros, sentiam-se fortes, sentiam-se ‘deuses’. Humildade e oração: com a humildade e a oração vamos em frente para escutar a Palavra de Deus e obedecer-lhe. Na Igreja. Humildade e oração na Igreja.” (RS)

20 março, 2014

DIÁLOGO COM O DIABO (9)


 

Diz ele: Já não conversamos há muito tempo!

Digo eu: Dispenso bem as conversas contigo.

Diz ele: Pois, mas olha que te deixas muitas vezes levar pelo que te digo.

Digo eu: Lá nisso tens razão e nem fazes ideia como isso me dói quando de tal me apercebo.

Diz ele. Deixa-te disso! Há coisas que até te sabem bem!

Digo eu: Talvez no momento. Mas como não se pode servir a dois senhores ao mesmo tempo, acabo sempre por ficar triste e magoado por não ter servido o meu único Senhor, que não és tu.

Diz ele: Ficas dividido.

Digo eu: Não, não fico dividido! Nunca poderia ficar dividido porque de ti nada quero, mas apenas distância.

Diz ele: Olha que de vez em quando…?

Digo eu: Nem penses! Nunca me dividirás, porque se eu permaneço com Ele e n’Ele, tu nada podes.

Diz ele: Mas por vezes deixas que te afaste d’Ele!

Digo eu: Pobres vitórias as tuas! Passageiras e cada vez menos. As tuas vitórias são efémeras. A vitória d’Ele é para sempre! Agora vai-te e não me incomodes mais.



Monte Real, 20 de Março de 2014
Joaquim Mexia Alves

Série constante na faixa lateral deste blog, em "Pesquisa rápida" - "DIÁLOGO" COM O DIABO

Ter um trabalho é essencial, está ligado à dignidade do homem: Papa aos operários e fiéis da região (outrora) industrial de Terni

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(RV) O problema do desemprego é causado por um sistema económico incapaz de criar trabalho porque coloca no centro um ídolo, o dinheiro. O trabalho é uma realidade essencial. O desempregado é marginalizado, vítima da exclusão social. – Considerações do Papa Francisco, recebendo nesta quinta-feira de manhã, alguns milhares de pessoas provenientes da diocese italiana de Terni, nomeadamente operários e dirigentes das fábricas de aço daquela região umbra, criadas há 130 anos, mas agora numa crise que levou a despedimentos.

Perante a actual evolução da economia e da atividade laboral, o Papa fez questão de “reafirmar que o trabalho é uma realidade essencial para a sociedade, para as famílias e para os indivíduos”.

“O trabalho não tem apenas uma finalidade económica e de lucro, mas sobretudo uma finalidade que diz respeito ao homem e à sua dignidade. Se faltar o trabalho, fere-se esta dignidade”.

Interrogando-se sobre o que se haverá que dizer perante o “gravíssimo problema do desemprego que afecta diversos países europeus”, observou o Papa Francisco:

“(O desemprego) é a consequência de um sistema económico que se tronou incapaz de criar trabalho porque colocou no centro um ídolo, o dinheiro!”

Há que adotar uma posição diferente, baseada na justiça e na solidariedade.

“O trabalho é um bem de todos, que deve estar disponível para todos. A fase de grave dificuldade e desemprego tem que ser enfrentada com os instrumentos da criatividade e da solidariedade... – a solidariedade entre todas as componentes da sociedade, que renunciam a alguma coisa e adotam um estilo de vida mais sóbrio, para ajudar a todos os que se encontram em situação de dificuldade.”

Na parte final do seu discurso a esta numerosa peregrinação de Terni, o Santo Padre dirigiu-se especialmente aos fiéis da diocese, sublinhando “o empenho primário” de reavivar as raízes da fé e da adesão a Jesus Cristo. Uma fé que seja “viva e vivificante”.

“É aqui que está o princípio inspirador das opções de um cristão: a sua fé. A fé move montanhas!
… Uma fé acolhida com alegria, vivida a fundo e com generosidade pode conferir à sociedade uma força humanizante”.

E o Papa concluiu exortando a continuar sempre a “esperar num futuro melhor”, sem cair no “vórtice do pessimismo”. Se cada um fizer a parte que lhe toca, consolidando uma atitude de solidariedade e partilha fraterna, há-de se conseguir “sair do pântano de uma fase económica e laboral árdua e difícil “.


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Para além dos operários das fábricas de Terni, o Santo Padre recebeu também, nesta quinta de manhã, em audiências sucessivas, o presidente da República do Montenegro, Filip Vujanovic, com a esposa e o séquito; e o Presidente do Comité da Cruz Vermelha, Peter Maurer, com o séquito.

Ontem, quarta-feira, à tarde, na Casa de Santa Marta, o Papa teve um encontro com os promotores da “Rede Mundial das Escolas para o Encontro”, acolhida na Pontifícia Academia das Ciências, sob a coordenação do arcebispo D. Marcelo Sorondo, Chanceler da Academia, que – como observou o Papa – aceitou o risco de se envolver nesta iniciativa. O Papa Francisco falou dos três pilares da atividade desta Rede: educação, desporto e solidariedade. Esta “Rede” inclui não só escolas católicas, mas também outras de diversa natureza e inspiração, para já na sua grande maioria argentinas.

Quem confia em si mesmo e não no Senhor perde o nome – o Papa em Santa Marta

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(RV) Quem confia em si próprio, nas suas riquezas e nas suas ideologias está destinado à infelicidade. Quem confia no Senhor dá frutos mesmo no tempo da seca – esta a mensagem principal do Papa Francisco na missa na manhã desta quinta-feira na Capela da Casa de Santa Marta.
Partindo do Evangelho deste dia, o Papa Francisco, refere o que sucede ao homem rico que tinha tudo: roupas de púrpura, comia em grandes banquetes, vivia cheio de contentamento mas não reparava que junto à sua porta estava um pobre coberto de chagas. O Evangelho diz-nos o nome do pobre – chamava-se Lázaro. Do rico não sabemos o nome:
“E esta é a maldição mais forte daquele que confia em si próprio ou nas forças, nas possibilidades dos homens e não nas de Deus: perde o nome. Como te chamas? Conta nº tal no banco tal. Como te chamas? Tantas propriedades, tantas casas... Como te chamas? As coisas que temos, os ídolos. E tu confias naquilo e este homem é maldito.”
“Hoje neste dia da Quaresma, vai-nos fazer bem perguntarmos: onde está a minha confiança? No Senhor ou sou um pagão, que confio nas coisas, nos ídolos que eu fiz? Isto não nos dá salvação.”
Mas no final – afirmou o Papa Francisco – há sempre uma porta de esperança para aqueles que só confiam em si próprios e não em Deus:
“No final há sempre uma possibilidade. E este homem, quando reparou que tinha perdido o nome, tinha perdido tudo, levanta os olhos e diz uma só palavra: ‘Pai’. E a resposta de Deus é uma só palavra: ‘Filho’. Se alguns de nós por tanta confiança que tivemos nos homens e em nós próprios perdemos o nome, perdemos a dignidade, ainda temos a possibilidade de dizer esta palavra que é mais que mágica e é forte: ‘Pai’. Ele sempre nos espera para abrir uma porta que nós não vemos e dirá: ‘Filho’. Peçamos ao Senhor a graça de nos dar a todos nós a sabedoria de ter confiança apenas n’Ele, não nas coisas ou nas forças humanas mas apenas n’Ele.” (RS)

19 março, 2014

S. José Educador: tema da audiência geral do Papa Francisco, no 1º aniversário do seu início de pontificado. Recordado o Dia do Pai


(RV) Precisamente há um ano, nesta solenidade de S. José, o Papa Francisco dava oficialmente início ao seu ministério de sucessor de Pedro. E foi a S. José Educador que o Papa dedicou a sua catequese na audiência geral desta quarta-feira, com uma Praça de São Pedro repleta com largas dezenas de milhares de peregrinos. E começou logo por afirmar a função de S. José, na Sagrada Família de Nazaré, na qual assumiu a missão de educador, guardando e acompanhando Jesus no seu crescimento em «sabedoria, idade e graça».


“Olhemos para José como o modelo do educador que guarda e acompanha Jesus no seu caminho de crescimento “em sabedoria, idade e graça”, como diz o Evangelho de Lucas. E podemos tentar utilizar precisamente estas três palavras – sabedoria, idade e graça – como pista para a nossa reflexão.”

O crescimento em idade refere-se ao crescimento físico e psicológico, onde José, juntamente com Maria, teve uma actuação mais directa procurando que nada faltasse na criação de Jesus e libertando-O das dificuldades como a ameaça de morte vinda de Herodes que os levou à fuga para o Egipto. Quanto à educação na “sabedoria”, José foi para Jesus exemplo e mestre, deixando-se sempre nutrir pela Palavra de Deus:

“José foi para Jesus exemplo e mestre desta sapiência, que se nutre da Palavra de Deus. Podemos pensar em como José educou o pequeno Jesus a escutar a Sagrada Escritura, sobretudo acompanhando-o aos sábados na sinagoga de Nazaré.”

No que se refere à dimensão da “graça”, a influência de José consistia em favorecer a ação do Espírito Santo no coração e na vida de Jesus. Com efeito, José educou Jesus, em primeiro lugar, com o exemplo: o exemplo de um homem justo que sempre se deixava guiar pela fé.

“... a missão de S. José certamente única e irrepetível, porque absolutamente único é Jesus. E todavia, no seu guardar Jesus, educando-o a crescer em idade, sapiência e graça, ele é modelo para cada educador, em particular para cada pai. Confio, portanto, à sua proteção todos os pais, os sacerdotes e aqueles que têm um dever educativo na Igreja e na sociedade.”

O Papa Francisco saudou assim todos os pais:

“Em modo especial quero saudar todos os pais. Estão pais aqui na Praça. Desejo-lhes felicidades e peço para vós a graça de serdes sempre muito próximos aos vossos filhos deixando-os crescer com a vossa presença e o vosso amor e sede para eles como S. José. Sede verdadeiros educadores e obrigado pelo que fazeis pelos vossos filhos. Boa Festa do Pai.”

“Muitos de nós já perderam os seus pais, tantos de nós que estão aqui nesta Praça já não têm pai. Rezemos também pelos pais já falecidos. Pelos pais rezemos um Pai-Nosso…”

No final da audiência o Santo Padre saudou também os peregrinos de língua portuguesa:

“Dou as boas-vindas a todos os peregrinos de língua portuguesa, sobretudo aos brasileiros da Diocese de Botucatu, e confio à protecção de São José todos os educadores, em particular os pais, para que, com o seu exemplo, ajudem os mais jovens a crescerem em sabedoria, idade e graça. Que Deus vos abençoe.” (RS)
  
 

18 março, 2014

A Quaresma é para mudar a vida - o Papa em Santa Marta alertou para não sermos hipócritas maquilhados

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(RV) A Quaresma é um tempo para consertar a vida, para mudar a vida – sublinhou o Papa Francisco na Missa em Santa Marta na manhã desta terça-feira. Comentando a Leitura retirada do Livro de Isaías em que o Senhor chama à conversão duas cidades pecadoras como Sodoma e Gomorra, o Santo Padre considerou que todos temos necessidade de mudar a vida e não de a maquilharmos como fazem os hipócritas:
“O que fazem os hipócritas? Maquilham-se de bons: fazem cara de santos, rezam olhando para o céu, mostrando-se, sentem-se mais justos dos que os outros, desprezando os outros. ‘Mas – dizem – eu sou muito católico, porque o meu tio foi um grande benfeitor, a minha família é esta e eu sou... conheci o bispo tal.. o cardeal tal... e o padre tal... eu sou...’ Sentem-se melhor que os outros. Esta é a hipocrisia. O Senhor diz: ‘Não, aquilo não’. Ninguém é justo por si próprio. Todos temos necessidade de sermos justificados. E o único que nos justifica é Jesus Cristo.”
Assim, para não sermos cristãos maquilhados que vivem da aparência, temos que nos aproximar do Senhor – adiantou o Papa Francisco que apontou qual o itinerário a seguir: ajudar o doente o pobre, dar justiça ao orfão, socorrer o oprimido:
“Socorrei o oprimido, dai justiça ao orfão, defendei a viúva. Tratar do próximo: do doente, do pobre, daquele que tem necessidade, do ignorante. Esta é a pedra de comparação. Os hipócritas não sabem fazer isto, não podem, porque estão tão cheios de si próprios que são cegos para olharem os outros. Quando alguém caminha um pouco e se aproxima ao senhor, a luz do Senhor faz-lhe ver estas coisas e vai ajudar os irmãos. Isto é o sinal, este é o sinal da conversão.”
“A Quaresma é para consertar a vida, organizar a vida, mudar a vida, para aproximar-se do Senhor. O sinal que nós estamos longe do Senhor é a hipocrisia. O hipócrita não tem necessidade do Senhor, salva-se a si mesmo, assim pensa, e disfarça-se de santo. O sinal de que nós nos aproximamos do Senhor com a penitência, pedindo perdão, é que nós cuidamos dos nossos irmãos necessitados. O Senhor nos dê a todos luz e coragem: luz para conhecer o que sucede dentro de nós e coragem para converter-nos, para aproximar-nos do Senhor. É belo estar próximo do Senhor.” (RS)
 

17 março, 2014

II Catequese Quaresmal - D. Nuno Brás, Bispo Auxiliar

 


“A mim o fizeste”

Catequese Quaresmal - II Domingo
Sé Patriarcal, 16 de Março de 2014

Se necessário fosse, o clima pascal destas catequeses quaresmais ficou este ano decididamente marcado pela passagem do Senhor Patriarca D. José Policarpo para a eternidade. Como ele próprio disse nas exéquias do seu antecessor, «A Páscoa perene, revive-a a Igreja de Lisboa, com a morte do seu pastor. A vida oferecida do nosso Patriarca, unida à de Cristo, Cordeiro Pascal, será uma fonte de graça para todos».

O Evangelho não pode nunca ser dissociado da caridade. E o anúncio realizado na "alegria do Evangelho" não pode deixar de conduzir à novidade de um novo agir — aquele que encontra na sua raiz o amor de Deus. Aliás, este mesmo agir, que encontra a sua origem em Deus e que espelha a vida divina, é antes ele próprio anúncio, alegre e perene, da Boa Nova do Reino.

Não se trata esta apenas de uma convicção ou da conclusão de um qualquer raciocínio humano, ou cuja afirmação decorra de um qualquer pensamento, mesmo aquele que encontra na sua origem uma afirmação de fé. É o texto das Escrituras quem claramente o afirma, como reconhece o Papa Francisco na Exortação Apostólica, que este ano nos serve de pano de fundo para as catequeses quaresmais. O Santo Padre di-lo expressamente no início do n. 179: "Este laço indissolúvel entre a recepção do anúncio salvífico e um efectivo amor fraterno exprime-se nalguns textos da Escritura, que convém considerar e meditar atentamente para tirar deles todas as consequências".

Em vez de fazermos a exegese pormenorizada dos textos que o Papa refere (Mt 25,40; 7,2; Lc 6,36-38), olhemos antes para algumas das suas afirmações centrais.


1. "Fazer"

"Sempre que fizestes isto
a um dos meus irmãos mais pequeninos
a mim mesmo o fizestes"
(Mt 25,40)

A primeira consideração não pode deixar de ser sobre o convite que Jesus nos faz a agir. Quase poderíamos dizer: o anúncio do Evangelho não se resume, decididamente, a um conjunto de palavras pronunciadas, ainda que belas e cheias de novidade, mas traz sempre consigo um agir.

Em primeiro lugar, notemos que o Santo Padre faz referência a uma afirmação de Jesus que se insere na chamada "narração do juízo final", que ocupa os versículos 31 a 46 do capítulo 25 do evangelho de S. Mateus.

S. João da Cruz, na sua obra Avisos e sentenças, não deixa de nos recordar a propósito desta passagem: "No entardecer da vida, seremos julgados no Amor” (n. 57).

Jesus descreve, quase como o artista relata uma sua obra, o momento definitivo e último. E se o faz em primeiro lugar para aqueles que O escutam, não deixa de sublinhar que o julgamento se dirige a "todos os povos", reunidos diante do Filho do Homem. Porque foi precisamente para todos que Ele veio. Não apenas para aqueles que O acolheram. Não serão pois apenas os discípulos a serem julgados. Estes serão, quando muito, confrontados no Amor de um modo mais severo, pois que muito lhes foi dado. Mas todos, sem excepção, não deixarão de comparecer diante do Amor. O Amor julga com Amor acerca do Amor. Mas, precisamente por ser Amor, não deixa nunca de iluminar, de interrogar e de erguer publicamente a sua voz.

E o critério do seu julgamento, o critério que distinguirá, em definitivo, todos os seres humanos será apenas um: aquilo que fizeste a um dos meus irmãos mais pequeninos.

Isto significa que todo o valor do agir humano sobre a terra, quer dizer: o agir de cada ser humano em concreto (porque mesmo o agir das sociedades tem rostos e nomes), há-de ser medido por este agir pessoal. Tudo o que for progresso económico; tudo o que foram realizações científicas e técnicas; tudo o que for progresso humano, os direitos, a forma humana de convivência; tudo o que for progresso espiritual e no conhecimento de Deus; e tudo o que for a vida de cada homem e mulher — tudo, enfim, terá como critério último aquilo que cada um realizou não em seu favor, nem sequer em favor de uma humanidade tomada em abstracto, mas em favor de "um dos meus irmãos mais pequeninos".

Mas notemos pois que não se tratam aqui das "obras valorosas" dos heróis que, por se elevarem acima do comum dos mortais, se hão-de libertar da lei da morte. Nem sequer daquelas outras que pela sua característica religiosa ou por se reclamarem do louvor divino terão já por si garantida a salvação de quem as realiza. O valor do viver humano tem uma media: a obra realizada em favor do outro mais pequenino.


2. O irmão mais pequenino

Quem é o irmão mais pequenino? Não raras vezes, esta expressão (ou semelhante) é usada pelo primeiro evangelho para falar dos discípulos, senão mesmo dos missionários (cf. Mt 18,3-5). É assim, por exemplo, em 10,42 ("Quem der de beber a um destes pequeninos, ainda que seja somente um copo de água fresca, por ele ser meu discípulo, em verdade vos digo, não perderá a sua recompensa"): o acolhimento prestado àqueles que são enviados é  acolhimento prestado Àquele que os envia.

Não é o caso em Mt 25,40. Aqui, os diferentes comentadores são unânimes em afirmar que a expressão "ao meu irmão mais pequenino" se refere a todos os necessitados, quem quer que eles sejam.

Aliás, se dúvidas existissem, o Senhor elenca um conjunto de situações onde o cuidado pelo "mais pequenino" é claro e necessário: os famintos, os que têm sede, os peregrinos, os que não têm que vestir, os doentes e os presos. Juntamente com a obra de "enterrar os mortos", o agir em favor daqueles deu origem ao elenco das chamadas obras de misericórdia corporais, quer dizer, aquelas que dizem respeito ao cuidado pelos que se encontram em situação de necessidade no que toca à sua condição corporal.

A elas acrescentou a tradição as outras sete obras de misericórdia espirituais: dar bom conselho; ensinar os ignorantes; corrigir os que erram; consolar os aflitos; perdoar as injúrias; sofrer com paciência as fraquezas do próximo; pedir a Deus pelos vivos e defuntos.

Dado o lugar em que nos encontramos, não podemos ignorar que precisamente estas 14 obras de misericórdia (corporais e espirituais) e a bem-aventurança que a elas se encontra associada (cf. Mt 5,7) que estão na origem das Santas Casas da Misericórdia, associações de fiéis, que têm por objectivo primeiro a união de esforços em favor dos "mais pequeninos" do Evangelho. A primeira delas, sob o patrocínio da rainha D. Leonor, surgiu precisamente em 1498, na capela de Nossa Senhora da Piedade, situada nos claustros desta Sé de Lisboa.

De igual modo, não podemos esquecer hoje as palavras do Papa Francisco na sua mensagem para a Quaresma que estamos a viver, e que relê e actualiza aquelas listas evangélicas e da tradição eclesial, introduzindo ao lado da "miséria material", aquilo a que o Santo Padre chama "miséria moral" e a "miséria espiritual". Diz o Papa:

"A miséria não coincide com a pobreza; a miséria é a pobreza sem confiança, sem solidariedade, sem esperança. Podemos distinguir três tipos de miséria: a miséria material, a miséria moral e a miséria espiritual. A miséria material é a que habitualmente designamos por pobreza e atinge todos aqueles que vivem numa condição indigna da pessoa humana: privados dos direitos fundamentais e dos bens de primeira necessidade como o alimento, a água, as condições higiénicas, o trabalho, a possibilidade de progresso e de crescimento cultural".


E o Santo Padre acrescenta acerca da miséria moral: "Não menos preocupante é a miséria moral, que consiste em tornar-se escravo do vício e do pecado. Quantas famílias vivem na angústia, porque algum dos seus membros – frequentemente jovem – se deixou subjugar pelo álcool, pela droga, pelo jogo, pela pornografia! Quantas pessoas perderam o sentido da vida; sem perspectivas de futuro, perderam a esperança!"

Quanto à miséria espiritual, diz ainda o Papa Francisco que ela "nos atinge quando nos afastamos de Deus e recusamos o seu amor. Se julgamos não ter necessidade de Deus, que em Cristo nos dá a mão, porque nos consideramos auto-suficientes, vamos a caminho da falência".

Isto significa que não se trata simplesmente de tomar como um elenco fechado, completo, aquele que Jesus enuncia no Evangelho, mas que ele se deve antes tomar como uma enunciação daquelas situações que, claramente, requeriam o nosso agir imediato. Poderíamos, aliás, encontrar nos textos evangélicos outras tantas referências, seja à miséria moral, seja àquela espiritual.

Notemos ainda que a Mensagem do Papa coloca a miséria espiritual ("quando nos afastamos de Deus e recusamos o seu amor"; quando "julgamos não ter necessidade de Deus [...] porque nos consideramos auto-suficientes") num plano semelhante ao da "miséria material", a requerer o agir cristão, inadiável, sem olhar a mais nada que não à situação daquele que necessita, e empenhando todas as nossas forças. Também ele, ainda que materialmente rico, e julgando-se auto-suficiente, se encontra naquela situação de pequenez a que não podemos voltar as costas.


3. "A mim o fizestes"

À primeira vista, a narração de Mt 25 constitui, apenas, uma descrição do juízo final: Jesus, como Filho do Homem glorioso, que, no fim dos tempos, repleto de majestade,  faz, por meio sempre do Amor e nele, o discernimento das vidas humanas, a partir do Amor com que os sofrimentos dos "mais pequeninos" foram acompanhados, vividos e resolvidos.

Contudo, se lermos bem, em Mt 25 não encontramos simplesmente uma referência ao momento do juízo definitivo, final. É verdade que ele domina toda a narração. Mas é também verdade que ele se encontra radicalmente determinado pelo hoje, pelo momento presente e pelo modo como o vivemos, dando-nos ou não conta dos sofrimentos alheios, e procurando ou não ir ao seu encontro e minorá-los ou resolvê-los.

O juiz daquele dia final, em que o Amor terá a última palavra, outro não é senão aquele que hoje vem ao nosso encontro em todo e qualquer ser humano que sofre material, moral ou espiritualmente. O juízo desse dia definitivo é aquele com que cada um de nós se confronta, diariamente, perante a presença do Senhor no faminto, no pobre, no doente ou no preso, e também naquele que está sujeito ao domínio de um qualquer vício que o aprisiona, ou ainda diante daquele que se julga auto-suficiente, e padece de miséria espiritual.

"A mim o fizeste". De facto, Jesus não se destaca daquele que sofre, utilizando uma comparação. Não diz: "é como se o tivesses feito a mim". Pelo contrário: Ele identifica-se completamente com o "irmão mais pequenino". Este é, tenha ou não disso consciência, o Filho do Homem que nos julga a todos, cristãos ou não.

Tal identificação não tem a ver com qualquer atitude subjectiva do pobre, com qualquer seu merecimento ou com qualquer atitude de maior ou menor religiosidade que possa aparentar ou que possa realmente viver, mas antes com a realidade objectiva que ele sofre neste momento. A sua pequenez real — material, moral ou espiritual: é ela que determina a sua identificação com o Filho do Homem. É este quem se identifica com ele, e não o contrário. Trata-se, afinal, de um prolongamento do dinamismo da encarnação, do Deus que se faz homem, e que o conhecido hino da Carta aos Filipenses (Filp 2,6-11) bem retrata: "Esvaziou-se a Si mesmo, tomando a condição de servo [...] até à morte e morte de cruz".

Mas, se assim é, então o agir presente traz consigo uma dimensão eterna. O agir no momento presente não é uma mera realidade passageira e inconsequente. Pelo contrário: é neste agir, em particular na atenção e no actuar em relação aos "mais pequeninos" que se decide a vida eterna. Em cada decisão, em cada gesto, em cada atitude que todos os seres humanos são chamados a tomar em cada momento da sua existência dá-se o confronto com Aquele que a todos julgará no momento final. Crentes ou não. Porque, crentes ou não, o olhar para o "mais pequenino", a capacidade de sair de si mesmo e dar atenção àquele que mais necessita, bem longe de ser uma realidade que apenas os crentes são capazes de realizar, constitui antes uma atitude a que todos são chamados. E de um modo ou de outro, nela cada um encontra o Filho do Homem, que distingue com justiça e misericórdia.

O momento que vivemos tem pois sempre um peso de eternidade, que ninguém será capaz de lhe retirar. É nele que somos julgados no Amor.


4. A medida usada


Poderemos, então, questionar: vale a pena ser discípulo, se em cada momento e no final todos seremos julgados no Amor, crentes ou não? Acrescentará a fé algo à condição de ser humano? Acrescentarão algo as atitudes religiosas que todos e cada um de nós é chamado por Deus a tomar?

Ao lado de Mt 25,40, que temos vindo a tomar como base para as nossas reflexões, o Santo Padre Francisco refere duas outras passagens evangélicas, também elas relacionadas com o julgamento (o mesmo é dizer: com a destrinça do nosso agir e do nosso ser) e com a medida desse julgamento, mas onde Jesus se dirige claramente aos discípulos: Mt 7,2 ("Com a medida que medirdes, assim sereis medidos") e Lc 6,36-38: "Sede misericordiosos como o vosso Pai é misericordioso. Não julgueis, e não sereis julgados; não condeneis e não sereis condenados; perdoai e sereis perdoados. Dai, e ser-vos-á dado. [...] A medida que usardes com os outros será usada convosco".

Se em Mt 25 a identificação era realizada entre Jesus e os "irmãos mais pequeninos", agora o discípulo do Senhor é convidado a ser, como Jesus, espelho, Palavra do Pai: o discípulo é convidado a encher-se de misericórdia e a ser acolhedor para com todos — e não pode deixar de nos vir à mente a parábola do Filho Pródigo, não sem razão por muitos chamada a Parábola do "Pai misericordioso" — e a suspender o julgamento, pois que ele não lhe pertence, mesmo aos discípulos (ao contrário, seremos igualmente julgados no Amor, como vimos antes), mas apenas Àquele que se sentará como juiz no final dos tempos. E uma vez mais o nosso agir em cada momento se mostra cheio de consequências eternas. Agora somos convidados a não julgar, a não condenar, a ser misericordiosos e a perdoar, sabendo que essa é a medida que será usada connosco.

Não se trata, simplesmente, de um "negócio" como poderia parecer à primeira vista. Trata-se antes de, como o Pai, suspendermos o juízo. Isso mesmo convida o dono da seara aos seus trabalhadores que, apressadamente, queriam distinguir o trigo do joio (Mt 13,25-30), e isso mesmo é expresso pelo autor da Carta aos Hebreus (4,7): "[Deus] fixa de novo um dia, hoje, dizendo por David, depois de tanto tempo, como acima se disse: Hoje se escutardes a sua voz, não endureçais os vossos corações".

"Hoje" o discípulo é convidado à conversão. E isso é possível pela paciência de Deus, que não cessa de esperar pelo filho que se afastou, nem desiste do seu regresso. É assim que o Pai trata o discípulo: pacientemente; é assim que o Pai trata o mundo: pacientemente. É assim que o discípulo não pode deixar de estar, também ele presente no seio do mundo, mesmo que a ele não pertença. Se, por um lado, vive inquieto e na esperança da última vinda do Senhor, por outro não pode deixar de semear com todo o entusiasmo a semente da Palavra, na consciência de que a própria semente, porque é de Deus, é capaz de transformar a terra onde cai, e de a converter em terreno frutuoso.

Essa é a medida grande, usada pelo Pai para com os discípulos — aquela boa medida,  "cheia, recalcada, trasbordante", lançada no regaço de cada um de nós. É a medida da graça divina — aquela medida de que nunca seremos merecedores — o mesmo é dizer: a medida do Amor com que Deus nos amou, e que já hoje nos oferece como fonte de vida, para nós e para o mundo inteiro.

É certo que, se os discípulos não anunciarem, gritarão as pedras (Lc 19,40). Mas é igualmente verdade que aos discípulos é confiada a missão de fazer ecoar o Evangelho ao longo dos tempos. E o Evangelho proclamado (aquele que anuncia o amor divino que a todos quer envolver) não é outro diferente daquele que se faz, abundantemente, eco da misericórdia divina, olhando as necessidades de quantos vivem à nossa volta, sem esperar qualquer recompensa que não aquela de poder trabalhar na vinha do Senhor.

Ou, como diz o Santo Padre Francisco: "Assim como a Igreja é missionária por natureza, também brota inevitavelmente dessa natureza a caridade efectiva para com o próximo, a compaixão que compreende, assiste e promove" (EG 179).

+ Nuno, Bispo Auxiliar de LIsboa
 Patriarcado de Lisboa

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