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“Creio na Igreja Apostólica”
Homilia nas Ordenações Sacerdotais
Mosteiro dos Jerónimos, 29 de Junho de 2013
1. Esta solene celebração na Solenidade
dos Apóstolos Pedro e Paulo, em que ordenaremos novos presbíteros, é a
última a que presido no meu ministério apostólico de Bispo de Lisboa.
Esta celebração está mais voltada para o futuro do que para o passado.
Seis novos presbíteros encarnam a esperança de futuro desta Igreja, que
todos amamos e que servi, de diversas formas, durante toda a minha vida.
Não podemos esquecer que estamos no Ano da Fé. Estará, certamente, no
nosso coração o Credo em que acreditamos: “Creio na Igreja, una, santa,
católica e apostólica”.
Alguém me sugeriu que seria melhor que
estes presbíteros fossem ordenados já pelo novo Patriarca de Lisboa, que
tomará posse daqui a uma semana e sob cuja orientação pastoral
exercerão o seu ministério sacerdotal, como membros do presbitério a que
ele presidirá. Decidiu ele e nós aceitámos, que se seguisse a
normalidade da programação pastoral da Diocese. Isso ajudar-vos-á,
queridos ordinandos, a não fazerdes da relação com o vosso Bispo apenas
uma relação humana, à pessoa, mas ao ministério apostólico, que hoje
ainda eu, amanhã ele, exercemos na Igreja de Lisboa. Os Apóstolos, de
modo particular Pedro e Paulo, preocuparam-se que este ministério
apostólico, alicerce da autenticidade da Igreja, não ficasse prisioneiro
das suas pessoas, da sua história, da maneira como foram Apóstolos.
Preocuparam-se em garantir sucessores no ministério, tantas vezes ainda
em sua vida, na consciência de que o ministério apostólico é maior do
que as suas pessoas e a sua história, é fidelidade a Jesus Cristo e
garantia da perenidade da Igreja.
2. Quando há 42 anos o Senhor D. António
Ribeiro sucedeu ao Cardeal Manuel Gonçalves Cerejeira, este, na homilia
da tomada de posse do seu sucessor, dirigindo-se aos seus diocesanos,
afirmou, evocando a afirmação de João Baptista em relação a Jesus, o
Messias, que iniciava a sua missão pública: “É preciso que ele cresça e
eu diminua”. Neste momento exprimo a atitude aí enunciada com outras
palavras: o Senhor D. Manuel, novo Patriarca, e eu próprio, só desejamos
uma coisa: que a Igreja de Lisboa cresça, se consolide como povo
crente, que quer ser no meio da nossa sociedade um testemunho da
esperança, da visão da vida como ela brota da sua união a Cristo. E para
esse fortalecimento da Igreja de Lisboa ambos queremos contribuir, cada
um na verdade do sacerdócio apostólico, cuja plenitude ambos recebemos,
e das circunstâncias concretas da missão recebida. Ambos amamos
bastante esta Igreja para tudo fazermos, na verdade das nossas vidas,
para que ela cresça na verdade e na fidelidade, até ao dia em que nos
seja dada a coroa de justiça que o Senhor tem reservada para todos
aqueles que gastaram a vida ao serviço da sua Igreja. Essa esperança
fortaleceu Paulo quando sentiu que a sua missão humana chegava ao fim,
um fim que é um princípio, porque compete também aos Apóstolos e seus
sucessores exprimirem nas suas vidas esta relação viva da Igreja
peregrina com a Igreja triunfante.
3. Queridos ordinandos, irmãos e irmãs,
na intensidade dos nossos sentimentos presentes demos hoje prioridade à
confissão da fé da Igreja: “Creio na Igreja una, santa, católica e
apostólica”. Como acontece com as virtudes da fé, da esperança e da
caridade, cada uma destas notas constitutivas da Igreja só são possíveis
se incluírem todas as outras. A Igreja só será una se for santa, só
será católica se for apostólica.
Há uma relação intrínseca entre unidade e
apostolicidade da Igreja. E a expressão sacramental da apostolicidade
é, na Igreja particular, o ministério do Bispo, sucessor dos Apóstolos,
ministério em que, aqueles que o exercem, são mais do que as suas
qualidade e características pessoais. Eles exprimem e garantem, desde o
início, a unidade da Igreja. Unidade da mesma fé, recebida dos Apóstolos
de Jesus. Eles garantem, na sua missão, que a nossa fé seja sempre a fé
da Igreja, de toda a Igreja como povo crente e não a expressão da
maneira individual de acreditar. A confissão da fé da Igreja exige tanta
renúncia, tanta humildade da inteligência, tanto sentido de corpo e de
comunhão. Queridos ordinandos, como membros do presbitério, o vosso
ministério exige esta grandeza de horizonte, de que a união ao vosso
Bispo é a garantia, quando celebrais, quando anunciais o Evangelho,
quando orientais as consciências nas dificuldades concretas com que os
cristãos se deparam. Em tudo o vosso ministério é um serviço da fé da
Igreja.
Numa Igreja particular, como a nossa
querida Igreja de Lisboa, esta unidade da fé está ligada à comunhão
apostólica do Colégio Episcopal, a que preside o Bispo de Roma, o Pastor
de toda a Igreja. É ele que marca o ritmo da apostolicidade e da
unidade. Também nele o ministério que recebeu é infinitamente mais do
que a sua pessoa. A nossa união ao Papa é expressão da apostolicidade e
da unidade.
Na minha longa vida de ministério
sacerdotal cultivei sempre esta união ao Sucessor de Pedro. A sua
palavra ensinou-me o caminho da fé e da verdade e, por vezes, levou-me a
corrigir perspectivas pessoais na compreensão da complexa realidade
cristã.
Hoje louvo o Senhor pela grandeza dos
Papas da minha vida, pela sua santidade, pela riqueza do seu Magistério,
pela atenção aos sinais dos tempos não hesitando inovar quando a
verdade da história o exigia, inovar na fidelidade à fé recebida dos
Apóstolos. O Magistério dos Papas foi farol a guiar a Igreja na evolução
do tempo, numa expressão dupla de fidelidade: à fé dos Apóstolos e às
vozes profundas da humanidade, mostrando à Igreja as aberturas do
coração humano à surpresa do amor de Cristo, Bom Pastor, que é de ontem,
de hoje e de sempre; à surpresa, essa muito grande, do Espírito Santo, o
amor personalizado e que garante à Igreja que na sua busca da
actualidade da mensagem, nunca se desviará da fé apostólica.
Neste momento da minha vida, em que deixo
o ministério de Bispo diocesano, mas não deixo o Colégio Apostólico e
de partilhar a responsabilidade de garantir que a Igreja será fiel à
apostolicidade, vai a minha expressão de fé e de caridade fraterna para
com o actual Bispo de Roma, o Papa Francisco. E na comunhão com ele,
exprimo a minha gratidão por todos os Papas da minha vida sacerdotal,
que muito me ajudaram a manter sempre viva esta consciência da fé da
Igreja, apesar das minhas fragilidades. Acolho, com coração humilde,
tudo o que o Papa Francisco decidir a meu respeito, aceito tudo o que me
pedir, e ofereço-lhe a ele, e através dele à Igreja, o silêncio da
minha oração, a busca da contemplação, a procura contínua da verdade.
.
† José Cardeal da Cruz Policarpo.
Administrador Apostólico do Patriarcado
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