15 setembro, 2017

 A “bondade” e a capacidade de “ir, estar e encontrar-se com todos”, “sobretudo com os mais frágeis” são alguns dos traços recordados por quem conheceu o Bispo do Porto, D. António Francisco dos Santos. Aos 69 anos, um ‘ataque cardíaco fulminante’ parou o coração de quem “quis colocar-nos a todos no coração de Deus”.

“Não trago comigo planos prévios ou antecipados programas de ação. Eles surgirão à medida do sonho de Deus e da sua vontade divina para esta Igreja.” Assim se apresentou D. António Francisco dos Santos à sua “amada” diocese do Porto, durante a sua entrada solene, em fevereiro de 2014. A aparente ‘falta de planos’ revelou-se uma enorme disponibilidade para receber os sinais d’Aquele a quem se dispôs durante toda a sua vida. Na mesma homilia vincou o odor das ovelhas – como lhe pediu o Papa Francisco – mas também se fez voz - e persistente - dos que “não podem esperar”: os pobres. “Sejamos ousados, criativos e decididos sempre mas sobretudo quando e onde estiverem em causa os frágeis, os pobres e os que sofrem”, sublinhou o Bispo do Porto que faleceu, no passado dia 11 de setembro, aos 69 anos.

Sem medo
Quem o conhecia, destaca a bondade e o seu empenho na denúncia das desigualdades sociais e económicas. Aliás, no mesmo momento, afirmou que da bondade “não devemos ter medo”. “Só pela bondade aprenderemos a fazer do poder um serviço, da autoridade uma proximidade e do ministério uma paixão pela missão de anunciar a alegria do evangelho. O evangelho é tudo o que temos e somos”, sublinhou. Pelas inúmeras reações, a expressão “era um homem bom” não é mais um ‘lugar-comum’ quando se fala de D. António Francisco dos Santos.
Nasceu em Tendais, no concelho de Cinfães, Diocese de Lamego, no dia 29 de agosto de 1948. Contrariou a vontade da sua família para ser advogado e formou-se em Teologia no Seminário Maior de Lamego, onde viria a ter como professor o atual Bispo de Vila Real, D. Amândio Tomás que o recorda como “um homem de uma inteligência rara, um homem mesmo bom, que tratou da mãe durante tantos anos, até ela falecer”.
Foi ordenado sacerdote a 8 de dezembro de 1972, na Catedral de Lamego. Pouco tempo depois foi estudar Sociologia Religiosa e Filosofia, em Paris, cidade onde trabalhou na paróquia de São João Baptista de Neuilly-Sur-Seine e ficou responsável pela pastoral da comunidade portuguesa emigrante.
Regressou a Portugal em 1979 e assumiu, ao longo dos anos, várias missões na sua diocese de origem. Foi membro da equipa formadora do Seminário Maior de Lamego, com as funções de professor, secretário, ecónomo e vice-reitor, entre 1986 e 1991. Nesse mesmo ano foi nomeado cónego capitular da Sé de Lamego e, após um ano, chefe de redação do jornal diocesano ‘Voz de Lamego’.
D. António Francisco “completamente na mão de Deus, ao dispor de Deus, ao sabor de Deus” – como o recorda o Bispo de Lamego, D. António Couto – deixou-se levar pelos planos de quem já o tinha predestinado para mais uma missão. Desta vez, o Papa João Paulo II, em 2004, nomeou-o Bispo Auxiliar de Braga e a 21 de setembro de 2006 recebeu, de Bento XVI, o mandato de governar a diocese de Aveiro, onde permaneceu durante 8 anos, até 2014 - ano em que o Papa Francisco lhe pediu para suceder a D. Manuel Clemente enquanto Bispo do Porto.
Da cidade de que dizia ser “alma, vida e gente" guardava o gosto por contactar e ouvir as pessoas, mas também uma paixão pelo Futebol Clube do Porto, de quem o atual presidente, Jorge Nuno Pinto da Costa, diz ter perdido “um grande amigo”, mas garante: “o mundo ganhou um Santo”.

“Mais ação e melhor ação”
Na Conferência Episcopal Portuguesa D. António era, atualmente, o presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana. A missão teve certamente o cunho da experiência acumulada da saída, ao encontro dos “mais frágeis”. Para o Bispo Auxiliar de Lisboa, D. José Traquina, a convivência com D. António, durante os últimos três anos, fruto das “diversas reuniões e atividades” da Conferência Episcopal, serviu para “confirmar tudo o que já conhecia” do Bispo do Porto, desde 1984, através dos encontros de formadores dos seminários. “Um Bispo próximo, atento, profundo, cheio de bondade e sabedoria, atento aos colegas e a toda a realidade da Igreja”, lembra o Bispo Auxiliar de Lisboa. Numa entrevista à Rádio Renascença, o Bispo do Porto desafiou os cristãos a “exercitar, na experiência diária” da vida, aquilo em que acreditam. “Mais ação e sobretudo melhor ação”. O apelo encontrou forma na vida de D. António Francisco e dos fracos rezou toda a sua história, como foi demonstrado através do exemplo de convidar um sem-abrigo para passar a ceia de Natal ou, a cada Domingo, a demora para cumprimentar, abraçar, abençoar cada um dos fiéis no final da Missa.No passado sábado, 9 de setembro, no Santuário de Fátima, durante a peregrinação jubilar da diocese do Porto, D. António dos Santos, garantiu, em entrevista à Angelus TV, ter “um coração exultante de alegria pela capacidade de mobilização que a Diocese teve”, ao rumarem àquele santuário mais de 50 mil diocesanos. Por entre a contagem do número de padres, paróquias, vigararias, lá estava a referência aos doentes e a 50 sem-abrigo que integraram a peregrinação. “Isso deve-se muito ao entusiasmo, ao dinamismo e alegria dos sacerdotes que conseguiram mobilizar as suas comunidades (...) desta grande, maravilhosa e amada diocese do Porto”, acrescentou. Segundo D. António Francisco dos Santos, aquele momento, com a consagração a Nossa Senhora de Fátima, pretendeu marcar “uma nova etapa de renovação pastoral” na sua diocese.
Na manhã do dia 11 de setembro de 2017, na Casa Episcopal do Porto, onde residia, o coração de quem “quis colocar-nos a todos no coração de Deus” – como escreveu o padre Américo Aguiar, presidente do Conselho de Gerência da Rádio Renascença – causou-lhe a partida inesperada. O seu lema episcopal In manus Tuas (Nas Tuas mãos) ganhou pleno cumprimento. D. António Francisco dos Santos está agora no coração de quem sempre desejou e com quem sempre viveu.
  • Leia o texto completo na edição do dia 17 de setembro do Jornal VOZ DA VERDADE, disponível nas paróquias ou em sua casa.
Patriarcado de Lisboa

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